Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, setembro 21, 2007

Míriam Leitão - A bem-amada



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
21/9/2007

Ninguém vive sem ela. Quem disse foi o presidente Lula. Ninguém governa sem a CPMF. O que significa que o que era provisório, que veio para ser uma ponte num momento de transição e crise, não mais nos deixará. A CPMF tem batalhas pela frente, mas o governo acha que a oposição está superestimando suas forças no Senado. O governo chegou a admitir uma redução da alíquota.

Os movimentos de resistência têm sempre essa dúvida: fazer oposição intransigente, ou negociar para ter uma melhora gradual? Tudo ou alguma coisa? A oposição, puxada pelo DEM, fechou questão contra a CPMF e perdeu na Câmara. O governo teve 30 votos a mais do que precisava. É bem verdade que o governo tem na Câmara uma oposição mais tranqüila. Reunindo 15 partidos tem teoricamente 379 votos.

Mas o governo estava esperando que houvesse negociação, segundo se conta em Brasília. Tanto que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da prorrogação da DRU e da CPMF diz o seguinte: "a alíquota... será de trinta e oito centésimos por cento, facultado ao Poder Executivo reduzi-la ou restabelecê-la, total ou parcialmente, nos termos definidos em lei".

A idéia é que a palavra "reduzi-la" fosse isca para a negociação, mas os empresários e os partidos de oposição decidiram fechar questão contra, segundo o governo. A oposição acredita que terá melhor sorte no Senado, onde o governo terá de reunir não os 40 que votaram a favor de Renan, não os 46 que o absolveram, mas 49 votos. O governo acha que a força da oposição no Senado não é tanta quanto ela imagina porque já há conflitos entre DEM e PSDB em alguns estados, como Goiás, e senadores querendo mudar de partido, como na Bahia.

O governo terá agora de continuar seu esforço para a aprovação da DRU e da CPMF com a votação dos destaques e emendas aglutinativas, o segundo turno na Câmara e depois o Senado. Na verdade, a grande preocupação do governo tem de ser com a base. Para muitos deputados da base, este é o momento ideal para apresentar suas reivindicações - justas ou não - porque nunca antes este ano o governo precisou tanto dos seus deputados e senadores. Ontem, foi uma grande negociação em torno de cargos ainda não nomeados.

O PR, que tem o controle do Ministério dos Transportes - e não o do Ministério de Longo Prazo, que é do PRB e não do PR, como me confundi ontem num comentário -, quer nomear os Units, que são os órgãos estaduais ligados ao Dnit. O deputado Luciano Castro, líder do PR, explica que não foi ainda cumprido o que o governo prometeu desde o começo:

- Quando o presidente Lula nomeou o ministro Alfredo (Nascimento), disse que ele nomearia os cargos. Queremos nomear funcionários de carreira, mas em vários estados, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, esses cargos estão nas mãos de outros partidos que não querem largar - disse o deputado.

Segundo o líder do PR, é natural que em momentos como o da votação da CPMF essa conversa retorne.

- A conversa se aguça mais numa votação como essa, mas o PR tem 39 deputados e os 39 votaram a favor do governo porque achamos que essa é uma receita fundamental - diz.

O varejo da política poderia ter ficado menos penoso se o governo tivesse feito uma estratégia política para este ano de ouro, que começou com alta popularidade do presidente pela força da reeleição. No começo do ano, já com a experiência de ter governado quatro anos, o presidente poderia ter mandado uma proposta coerente de reforma tributária e, dentro dela, a prorrogação com redução futura de alíquota da CPMF. Teria tido o ano inteiro para tramitar.

Dizem que há uma proposta de reforma que será apresentada em algum momento no futuro, mas tudo o que se tem agora é mais quatro anos de CPMF sem qualquer justificativa. A arrecadação subiu 11%, já descontada a inflação, a contribuição veio para ser provisória num momento de crise e não há mais crise, e o governo toda hora acena que pode fazer outras concessões em outras áreas, como a desoneração da folha. Se o governo pode abrir mão de receita e fazer desonerações que beneficiem toda a economia, por que não propôs isso dentro de uma reforma ampla da amalucada estrutura tributária brasileira, cheia de taxas, alíquotas diferenciadas e impostos redundantes?

Porque o governo não quer reformar de fato a estrutura tributária, prefere fazer a chantagem de sempre ameaçando com o corte de dinheiro para a saúde, educação e programas sociais. Ora, se fosse essa a preocupação, não estaria ao mesmo tempo aprovando a DRU que dá ao governo o direito de usar em outras áreas as receitas hoje vinculadas às áreas de saúde, educação e programas sociais.

A CPMF nasceu para ser amada e odiada, para dividir os partidos em corrente alternada. O PT, que tanto execrou o imposto, hoje o defende como a única forma de governar o Brasil; o PSDB, que o criou, aprovou e prorrogou, hoje o renega como se fosse o único imposto que estivesse pesando sobre o brasileiro.

Assim que ela for aprovada, se for aprovada, vai continuar a balbúrdia tributária de sempre no Brasil. Aqui qualquer imposto criado vira permanente, todas as despesas autorizadas são irredutíveis, toda carga tributária será sempre maior do que a do ano anterior e menor do que a do ano seguinte. Todos os esforços do governo neste final do primeiro ano do segundo mandato serão concentrados em aprovar a bem-amada CPMF, da qual nenhum governo quer abrir mão.

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