Contaminadas por dejetos industriais
e agrícolas, elas poluem a água potável,
causam doenças e matam os animais
Liu Jun/AFP |
Pesca de moluscos num lago coberto de algas na província chinesa de Jiangsu: 2 milhões de pessoas ficaram sem água para beber na região por causa de algas envenenadas |
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O preço que a China tem pago por seu acelerado crescimento econômico é tornar-se um dos países campeões de poluição. Como quase toda a energia que usa é produzida pela queima de combustíveis fósseis, o país abriga hoje dezesseis das vinte cidades mais poluídas do mundo. Como se não bastasse a sujeira no ar, os chineses convivem com outra praga ecológica, a poluição das águas por algas tóxicas. Há vários anos as marés vermelhas, formadas por essas algas, ocupam vastas áreas do litoral chinês, reduzindo drasticamente a pesca e afugentando os turistas. O pior estava por vir. Agora, as algas tóxicas têm alcançado lagos e reservatórios naturais que abastecem a população chinesa de água potável. Há cinco meses, a proliferação desses vegetais no Lago Tai, na província de Jiangsu, a 250 quilômetros de Xangai, causou pânico em 2 milhões de pessoas que ficaram sem água para beber. Em julho, 100 000 habitantes de Changchun, no nordeste do país, também ficaram sem água depois que algas tóxicas foram detectadas no reservatório central da cidade. Moradores da província de Yunnan, próxima à fronteira com o Tibete, são forçados atualmente a buscar água em locais distantes porque aquela que abastece a região está contaminada.
As algas são, em geral, grandes aliadas do ambiente. Produzem oxigênio, absorvem dióxido de carbono (CO2) – o principal gás do efeito estufa – e formam a base da cadeia alimentar marinha. Algumas espécies de alga são naturalmente tóxicas, mas, em condições normais, não chegam a afetar o ambiente em que vivem. Quando as águas em que repousam são envenenadas por dejetos industriais lançados por fábricas e fertilizantes químicos usados em plantações, porém, elas absorvem essas substâncias, podem se multiplicar muito rapidamente e se transformar numa ameaça. É o que acontece hoje na China e em muitos outros países e regiões do planeta, com a ocupação humana cada vez mais intensa dos litorais e de áreas próximas ao leito dos rios. Nos seres humanos, o contato com as algas tóxicas pode causar enjôo, intoxicação e rachaduras na pele. Nos animais, provoca doenças e pode levar à morte. Na Flórida e no Havaí, é comum encontrar tartarugas marinhas com tumores do tamanho de uma maçã em volta dos olhos, na boca e atrás das nadadeiras. Os tumores impedem as tartarugas de enxergar, comer e nadar. Os oceanógrafos atribuem o fenômeno a um tipo de alga tóxica que enfraquece o sistema imunológico dos animais marinhos.
Nos Estados Unidos, 400 000 peixes morreram desde o fim de junho na Baía de Chesapeake, numa área que vai de Nova York até o estado da Virgínia, devido à proliferação de um tipo de alga tóxica chamado karlodinium. Essa alga se reproduz graças à combinação de altas temperaturas, escassez de chuvas e excesso de poluentes na água. "Nos últimos anos, o despejo de fertilizantes e restos industriais na baía tem crescido num ritmo sem precedente, favorecendo o surgimento dessas algas", diz Charles Poukish, chefe do Departamento do Meio Ambiente do estado americano de Maryland. Nem mesmo os mamíferos estão a salvo dos efeitos das algas venenosas. Nos últimos dez anos, mais de 14 000 focas, golfinhos e leões-marinhos apareceram mortos ou doentes nas praias da Califórnia. Exames feitos por veterinários e biólogos marinhos mostraram que muitos deles foram envenenados por toxinas produzidas por algas ingeridas por peixes que lhes servem de alimento. No caso dos leões-marinhos, os efeitos da intoxicação são ainda mais dramáticos. Ela afeta o sistema nervoso dos animais, provocando tremores e convulsões. Descontroladas, as fêmeas chegam a matar seus filhotes após o nascimento.
A solução para o problema das algas tóxicas não é fácil. Como acontece com a poluição causada pela queima de combustíveis fósseis, eliminar as fontes de envenenamento das algas significaria interromper a atividade de fábricas e fazendas. Mesmo que isso fosse possível, acabar com as substâncias poluentes já presentes em lagos como os da China, segundo especialistas, consumiria somas exorbitantes. No caso dos oceanos, esse processo seria tecnicamente inviável. Por enquanto, a solução possível é controlar melhor o despejo de substâncias venenosas nas águas do planeta.
MAIS FITOPLÂNCTON, Herói entre os ambientalistas, criador da Hipótese Gaia, que concebe o planeta Terra como um ser vivo, o cientista inglês James Lovelock deu na semana passada sua contribuição às megassoluções para o aquecimento global. Sua proposta é aumentar a quantidade de microalgas conhecidas como fitoplâncton na superfície dos oceanos. O fitoplâncton tem dois importantes papéis no combate aos danos causados pelo efeito estufa. O primeiro é absorver em grandes quantidades o dióxido de carbono (CO2), enquanto libera oxigênio. Embora corresponda a apenas 2% da flora da Terra, o fitoplâncton produz 48% do oxigênio gerado diariamente no planeta. A segunda contribuição desse vegetal contra o aquecimento vem dos gases que ele libera ao morrer e se decompor. Esses gases contêm moléculas que, ao chegar à atmosfera, funcionam como núcleos ao redor dos quais se formam as nuvens, anteparos naturais que filtram e refletem parte da radiação solar, reduzindo o aquecimento da Terra. Para estimular a multiplicação do fitoplâncton, Lovelock sugere que se instalem nos oceanos tubos gigantes, de 10 metros de diâmetro, munidos de válvulas que funcionariam como bombas de sucção. O equipamento levaria continuamente para a superfície águas que se encontram na faixa entre 100 e 200 metros de profundidade. Essas águas geladas e profundas acumulam grandes quantidades de matéria orgânica em decomposição, o que as torna extremamente ricas em nutrientes. Nos Estados Unidos, um projeto semelhante já foi implantado. A empresa de tecnologia Atmocean usa bombas de forma experimental em regiões do Atlântico Norte para aumentar a riqueza da vida marinha e a produtividade da pesca. A bióloga Sonia Gianesella, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, diz que a sugestão de Lovelock pode ampliar os efeitos positivos do fenômeno natural conhecido como ressurgência. Através dele, as águas profundas dos oceanos entram em contato com as águas rasas, melhorando as condições de desenvolvimento da fauna e da flora marinhas próximo da superfície. Esse fenômeno é comum nas regiões costeiras, onde as características topográficas e os ventos permitem maior movimentação das águas. Nas zonas de mar aberto, sua ocorrência é rara.
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