Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, maio 28, 2012

Lula e Gilmar Mendes: conversa errada, no local errado, com pessoa errada

Lula e Gilmar Mendes: conversa errada, no local errado, com pessoa errada

Ministro diz que esperava encontro social com Lula, mas acabou tendo diálogo pouco republicano com o ex-presidente

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Gilmar Mendes: irritação com comentário de Lula sobre viagem a Berlim
Foto: Ailton de Freitas/ 12-04-2012 / O Globo
Gilmar Mendes: irritação com comentário de Lula sobre viagem a BerlimAILTON DE FREITAS/ 12-04-2012 / O GLOBO
Na bela manhã de quinta-feira, dia 26 de abril, o ministro do STF Gilmar Mendes saiu de casa para, finalmente, encontrar-se com o ex-presidente Lula — com quem, até essa data, mantinha relações mais que cordiais — no escritório do amigo e ex-ministro Nelson Jobim.
O encontro fora marcado por Jobim, a pedido de Lula. Mas, para Gilmar, o contexto era outro. Há muito, desde a cirurgia de garganta de Lula, ele se sentia devedor de uma visita ao ex-presidente.
O ministro chegou a tratar com Clara Ant, assessora de Lula, sobre a melhor data da visita. Quando estava próxima de realizá-la, Gilmar soube que Lula se internara de novo. Numa conversa com o presidente do Senado, José Sarney, este lhe comunicou que iria visitar o ex-presidente em São Paulo.
— Por favor, diga ao presidente Lula que estou tentando visitá-lo. O senhor bem que poderia me ajudar, marcando isso com ele — pediu Gilmar a Sarney.
Se há uma coisa que político gosta de fazer é mediar encontros.
Quando recebeu o convite de Jobim para encontrar-se com Lula, Gilmar ficou eufórico: finalmente, iria rever o amigo.
Na cabeça do ministro, o encontro seria social e afetivo e realizado por desejos de ambos. E, para ser mais justo, mais pela insistência de Gilmar do que de Lula.
Foi neste contexto que o encontro foi realizado. Convém esclarecer, também, que tudo isso e o que se segue foram reconstruídos seguindo os rastros das conversas que o ministro Gilmar Mendes passou a ter com vários interlocutores sobre o ocorrido.
Coincidentemente, Gilmar, naquele mesmo dia, tinha marcado um encontro com o presidente dos Democratas, o senador Agripino Maia. Maia contaria aos correlegionários que Gilmar chegou ao encontro esbaforido, soltando fogo pelas ventas.
A história espalhou-se logo pelos Três Poderes. Formalmente, Gilmar relatou ao presidente do Supremo, Ayres de Britto. Mas contou ao amigo Sigmaringa Seixas e este, supõe-se, a Dilma.
Pelo contexto relatado acima percebe-se, claramente, que a ação de Lula era totalmente dispensável. Primeiro, a de ter usado Jobim como intermediário. Segundo erro, ao tentar sensibilizar Gilmar para assumir uma posição técnica, não política.
Se o ex-secretário da presidência de Lula e hoje funcionário do seu Instituto, o mineiro Luis Dulci, gostasse de trabalhar, teria preparado um resumo para o ex-presidente sobre as decisões mais importantes tomadas por Gilmar a favor do PT: rejeição da denúncia contra Gushiken: voto a favor de Palloci e recusa de denúncia contra Mercadante, entre outros. Em todos esses episódios, os chamados "ministros amigos" foram todos votos contra o PT. Mercadante, inclusive, nem poderia ter sido eleito senador e, muito menos, estar hoje no ministério da Educação, se tivesse dependido do voto de Sepúlveda Pertence.
Apesar de todas essas posições de Gilmar terem sido eminentemente técnicas, pode se dizer que houve também reciprocidade de Lula no trato com o ministro. Gilmar vai morrer agradecendo a Lula a solução de diversos problemas do Supremo que dependiam administrativamente do governo.
Tanto isso é verdade que, no governo Lula, durante encontro social com um dos ministros, Gilmar Mendes, certa vez, tripudiou:
— Não adianta vocês me enrolarem, eu vou ao meu amigo Lula e ele resolve tudo.
Bem, isso sem contar a relação — e esta é a grande revelação — entre os casais Lula da Silva e Gilmar Mendes. Em todos os aniversários, inclusive no último que passou em Brasília, comemorado só entre os íntimos, Gilmar e sua mulher Guiomar estavam lá. No Torto, no Alvorada e até mesmo no restaurante “Feitiço Mineiro”, o casal Mendes era presença constante. Maria Letícia e Guiomar transformaram-se em grandes amigas.
Por que Lula teria agido assim? Prevalece a máxima do “perdoa, mas não esquece”. Lula não se esquece de que, por espionagem a Gilmar Mendes, numa conversa com o próprio Demóstenes, fora obrigado a demitir Paulo Lacerda da Abin. Lula sentiu-se humilhado, já que a decisão foi resultado de uma delicada conversa sua, na época, com Gilmar, mediada pelo mesmo Jobim.
No encontro fatídico de agora, Lula voltou ao tema de raspão:
— Será que aquele grampo não foi feito pelo próprio Cachoeira ou mesmo Demóstenes ou alguém da turma deles?
Como, a essa altura, a conversa já não estava mais sendo republicana, Gilmar tirou a toga:
— Que é isso, Lula! A prova de que seu governo era uma bagunça está no fato de que o homem de confiança da Abin, o homem de Paulo Lacerda na operação “Satiagraha”, era o Dadá! Você sabia disso?
A coisa esquentou mesmo quando Lula, diante da declaração de Gilmar de que nada tinha a temer da CPI, perguntou-lhe com um tapinha nas costas:
— E a história de Berlim?
Quem diz que tapinha não dói? Doeu mais que a pergunta. O revide foi mais forte:
— Lula, você continua, como sempre, desinformado! Vá em frente!
Foi aí que Gilmar teve a prova definitiva de que tinha sido escolhido pelo PT como símbolo da tentativa de desmoralizar o Judiciário.
O que tem deixado Gilmar Mendes mais indignado é que se considera vítima de um bem articulado plano de difamação que corre não apenas pelas mídias sociais, mas no mais antigo e eficaz meio de comunicação: o terrível boca a boca.
A conversa começou republicana, com Gilmar lembrando a Lula da necessidade de se preencher as próximas duas vagas do Supremo com critérios bem técnicos e não políticos. É que se suspeita de uma manobra para o mensalão ser votado só depois da nomeação dos novos ministros. Gilmar defende o julgamento agora para evitar a confusão e suspeição em que se revestiriam essas nomeações, até porque, sendo em agosto, o tribunal não estaria desfalcado de dois ministros que conhecem bem a matéria como os demais.
O assunto CPI começou quando Lula disse que a tinha sob comando e, numa prova de que estava entre amigos, chegou até a confidenciar ter acertado nomeando Odair Cunha ( PT -- MG) como relator:
— O Vaccarezza não seria uma boa solução. O seu poder de articulação é tão grande, que ele acabou se envolvendo com parlamentares comprometidos com esses esquemas.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/pais/lula-gilmar-mendes-conversa-errada-no-local-errado-com-pessoa-errada-5039356#ixzz1w8XlMs5o
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Lula e Gilmar Mendes: conversa errada, no local errado, com pessoa errada:

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Celso de Mello: ação de Lula foi indecorosa - O Globo

Celso de Mello: ação de Lula foi indecorosa

Ministro do STF diz em entrevista a site que diálogo de ex-presidente com Gilmar Mendes resultaria em impeachment

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria passível de impeachment caso estivesse exercendo o cargo. A declaração foi dada em entrevista ao site Consultor Jurídico, reproduzida pelo Blog do Noblat no site do GLOBO. A afirmação de Celso de Mellon veio após a divulgação de uma encontro entre Lula e o ministro Gilmar Mendes que, em entrevista à revista “Veja”, acusou o petista de tentar adiar o julgamento do mensalão. Em troca, o petista teria oferecido a blindagem Gilmar Mendes na CPI do Cachoeira.
Segundo reportagem da “Veja”, Lula conversou com o ministro no dia 26 de abril, no escritório do ex-ministro da Justiça e ex-presidente do STF Nelson Jobim.
— Essa conduta do ex-presidente da República, se confirmada, constituirá lamentável expressão do grave desconhecimento das instituições republicanas e de seu regular funcionamento no âmbito do Estado Democrático de Direito. O episódio revela um comportamento eticamente censurável, politicamente atrevido e juridicamente ilegítimo — disse Celso de Mello ao Consultor Jurídico
Celso de Mello enfatizou o risco de impeachment de Lula, caso estivesse no Planalto:
— Se ainda fosse presidente da República, esse comportamento seria passível de impeachment por configurar infração político-administrativa, em que seria um chefe de poder tentando interferir em outro — afirmou o ministro, que fez duras críticas a Lula caso as afirmações de Gilmar Mendes se confirmarem:
— Tentar interferir dessa maneira em um julgamento do STF é inaceitável e indecoroso. Rompe todos os limites da ética. Seria assim para qualquer cidadão, mas mais grave quando se trata da figura de um presidente da República. (...) Ele mostrou desconhecer a posição de absoluta independência dos ministros do STF no desempenho de suas funções.
Nos bastidores da CPI, circula a história de que Gilmar Mendes teria viajado a Berlim, na Alemanha, com o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) num avião cedido pelo contraventor Carlinhos Cachoeira. O fato teria motivado Lula a propor a blindagem de Gilmar Mendes, caso o julgamento do mensalão fosse adiado para após as eleições.
O ministro ainda avaliou a posição do STF em relação ao julgamento do mensalão.
— A ação penal será julgada por todos de maneira independente e isenta, tendo por base exclusivamente as provas dos autos. A abordagem do ex-presidente é inaceitável — disse Celso de Mello, que elogiou a iniciativa de Gilmar Mendes em divulgar o encontro. — A resposta do ministro Gilmar Mendes foi corretíssima e mostra a firmeza com que os ministros do STF irão examinar a denúncia (...). É grave e inacreditável que um ex-presidente da República tenha incidido nesse comportamento. (...) Surpreendente essa tentativa espúria de interferir em assunto que não permite essa abordagem. Não se pode contemporizar com o desconhecimento do sistema constitucional do País nem com o desconhecimento dos limites éticos e jurídicos.

Celso de Mello: ação de Lula foi indecorosa - O Globo:

domingo, maio 27, 2012

De parar o trânsito Miriam Leitão


“O trem ‘garrou’ tudo”, me disse Geraldo, o motorista mineiro que estava me levando para a Bienal em Belo Horizonte. Tínhamos que atravessar a cidade e eu estava atrasada. Ele queria dizer que o trânsito tinha travado completamente. “Cê tem medo?” Eu dei carta branca, desde que ele respeitasse as leis de trânsito. Ele fugiu do excesso de fluxo de veículos atravessando uma linha de trem, uma favela e um cemitério. Chegamos.
O problema não era só daquele dia, nem só de Belo Horizonte. As cidades brasileiras estão com o trânsito cada vez mais inviável. A impressão intuitiva geral é que estamos marchando inexoravelmente para um dia “o trem agarrar” completamente. As pessoas culpam o contínuo crescimento da venda de carros dos últimos anos. De fato, a venda interna triplicou em sete anos. Era de 100 mil e está em 300 mil veículos por mês. No estado de Minas Gerais, 410 mil carros novos são vendidos a cada ano. Mas, evidentemente, não é o consumo que tem que se adaptar às possibilidades das cidades, é a mobilidade urbana que tem que ser repensada imediatamente.
Perde-se cada vez mais tempo no trânsito entre a casa e o trabalho. Isso é redução de produtividade da economia, aumento das emissões de gases de efeito estufa e, mais importante, perda de qualidade de vida. O trabalhador já chega cansado e estressado para trabalhar. As mercadorias não chegam em tempo, a produção fica mais lenta. O trânsito afeta a economia e a vida privada.
Quando se fala do problema logístico brasileiro, em geral as pessoas pensam na dificuldade de os grãos serem transportados da área de produção até o porto para serem embarcados. Mas o principal nó se forma de maneira cada vez mais desesperadora em cada centro urbano. E nem precisa ser cidade grande. As pequenas começam a repetir o mesmo padrão.
Na maior cidade do Brasil houve um dia de desespero na última quarta-feira com a greve do metrô. Incipiente, cobrindo apenas uma parte da cidade, o metrô é indispensável. Foi apenas um dia, felizmente. Provocou 240 quilômetros de congestionamento na cidade, três vezes mais do que em dias de engarrafamento considerado normal para os padrões da capital paulista. No estado de São Paulo, como um todo, são comprados um milhão de carros novos por ano.
“Embolou”, me avisou o motorista de táxi carioca, na última quinta-feira, e relaxou no volante, aumentando o volume da música que ouvia. Um acidente com uma moto foi criando círculos de paralisia no trânsito da Zona Sul do Rio. Levamos uma eternidade para cruzar a pequena distância entre dois bairros vizinhos. No estado do Rio são 252 mil carros novos por ano.
Os incentivos sucessivos que o governo vem dando à compra de carro se somam à queda dos investimentos em transporte de massa e à falta crônica de um sistema inteligente de gestão do trânsito. Isso está levando o país ao entupimento das artérias. Os trabalhadores têm que sair cada vez mais cedo de casa para tentar chegar ao seu trabalho.
O Censo de 2010 do IBGE mostrou que em São Paulo um terço dos trabalhadores levam mais de uma hora se deslocando até o trabalho diariamente. Isso significa mais de duas horas por dia, na viagem de ida e volta. Ou seja, dez horas por semana de cinco dias. Há casos muito mais espantosos, de trabalhadores que gastam de quatro a seis horas do dia para ir e voltar do trabalho. Que produtividade pode ter uma pessoa que vive esse transtorno?
Qualquer evento que quebre a rotina cria um processo exponencial de contágio que vai paralisando as cidades. Por isso, imagina-se o que será o Rio neste mês de junho, com os que desembarcarem para a Rio+20 e o aumento de pessoas indo para os mesmos lugares: membros das delegações, jornalistas, militantes de ONGs, especialistas, empresários, seguranças, chefes de Estado. O estrangulamento previsto resultou em decisão bizarra: o prefeito decretou ponto facultativo de três dias para os servidores públicos, para que menos gente fique na cidade. As crianças ficarão sem aulas.
O problema da mobilidade urbana deixou de ser apenas um desconforto das pessoas. Hoje ele reduz a expectativa de vida da população, provoca uma queda dramática no índice de produtividade do trabalho, afeta a logística das empresas. Qualquer pessoa sabe disso. Menos o governo. Ou melhor, os governos. Tudo se passa como se as autoridades não soubessem que as cidades brasileiras estão parando em congestionamentos de proporções cada vez maiores. O que esperam? Que tudo agarre ou embole completamente?
Imagine o que se poderia fazer com o tempo excessivo gasto no trânsito. Ficar mais tempo com os filhos, o que elevaria a saúde emocional das crianças. Fazer exercício físico regularmente, o que melhoraria o humor, a saúde e a autoestima de cada pessoa. Ler mais, o que elevaria o conhecimento. Dormir mais um pouco, o que reduziria o stress e tudo que é decorrente da supressão do sono.
O Brasil tem uma malha de metrô totalmente acanhada para as necessidades do nosso cotidiano, tem um sistema de concessões de ônibus que em algumas cidades chega a ser mafioso e tem compulsão pelo carro individual, que tem sido incentivada a cada pacote econômico. Esta semana foi anunciado o sétimo. Mesmo endividados, os brasileiros foram incentivados a comprar mais carros porque o governo quer esvaziar os pátios cheios das montadoras. Como os carros circularão? Isso não parece preocupar o governo.
 Míriam Leitão: O Globo:

Danuza Leão - Olé



Sevilha não se modernizou, não vi nenhuma periguete de coxa de fora, poucas pessoas usam tênis


ESTÁ DIFÍCIL viajar; por isso, quando vou tirar umas férias, penso muito na hora de decidir para onde vou. Tirando Paris, claro, meus critérios são:

1 - não vou a lugares que estão na moda.

2 - só viajo fora de estação, quando as cidades estão mais vazias, para não ter que ver os ônibus de turistas tirando fotos com celulares.

3 - viagens para mim são aquelas em que posso arejar a cabeça e ver coisas bonitas, sem obrigações de "não pode deixar de". O "não pode deixar de" acaba com qualquer viagem, aliás, com qualquer vida.
Por isso gosto de lugares não globalizados, onde não existem as Ralph Lauren, Prada e Vuitton da vida. Não que eu não goste de comprar; até compro (com moderação), mas esse, para mim, não é um item fundamental.

4 - dou uma pesquisada básica sobre a culinária local, pois adoro comer, mas nunca fui ao El Bulli, quando ele existia; reservar um restaurante com seis meses de antecedência, para contar que fui, nem pensar. Por essa razão, nunca tive vontade de conhecer Bolívia, Cuba, Viena, Canadá, nem os países escandinavos, mesmo sabendo que o restaurante cotado em primeiro lugar no mundo é dinamarquês, o Noma. E detesto cidades onde as hamburguerias são ostensivas, ou que os restaurantes sejam conhecidos pelos nomes dos seus chefs.

Seguindo esses critérios, estive em Sevilha no final de abril e fiquei maravilhada. Conheci a cidade há muitos anos, tantos que não quero nem pensar, e está tudo igual: Sevilha não se modernizou, não vi nenhuma periguete de coxa de fora, pouquíssimas pessoas usam tênis, as carruagens, com três, quatro ou cinco cavalos, todos da mesma cor, continuam nas ruas, todos se vestem discretamente, e vejo isso como fruto de uma cultura muito sólida, que não se deixou seduzir pelas modernidades. É uma cidade viva, cheia de cores, alegre; como era primavera, os canteiros de todas as ruas estavam floridos, e as árvores (também nas ruas), cheias de laranjas maduras -aliás, as melhores laranjas do mundo, só comparáveis às do Marrocos.

Havia turistas, sim, mas não em bandos barulhentos; eram tão discretos que nem pareciam turistas. Em Sevilha não existe o frenesi das compras, pois as lojas só vendem o que tem a ver com a cultura local: vestidos de sevilhanas longos, com muitos babados, pentes enormes para segurar as mantilhas, xales com franjas de todas as cores, castanholas, sapatos para dançar o flamenco, e mais ou menos só. Sem a pressão do consumo, dá para apreciar a cidade com calma, tomar um "fino" (xerez) a qualquer hora, em qualquer bar de tapas, e passear pela cidade a pé.
Almoça-se às 2h30 da tarde, depois do almoço se faz a siesta, como todos os sevilhanos, e jantar, só depois das dez, sem correria. Ninguém tem pressa em Sevilha.

Em nenhum lugar, a nenhuma hora, se ouve um som tipo bate-estaca ou música de elevador; a que se escuta é sempre a local, o que ajuda a entrar no clima. Como fui na semana da "feria", festa tradicional da cidade, havia mulheres de todas as idades, dos 3 aos 90, vestidas de Carmen, personagem da ópera de Bizet, que era sevilhana; nas lojas, nos restaurantes, nas igrejas, de manhã, à tarde, à noite.

E como se come bem em Sevilha, mas como se come bem. Cada um tem seu paladar, e o meu, depois dessa viagem, virou totalmente espanhol. No momento, com toda a crise, a Espanha é o lugar onde melhor se come no mundo, e muito mais barato que no Brasil.

Sevilha, com bons amigos, é uma fuga desse mundo caótico em que vivemos, e na volta você até pensa que foi tudo um sonho.

E sabe por que -e principalmente- Sevilha é essa maravilha? Porque não está na moda.

danuza.leao@uol.com.br
Folha de S.Paulo
27/05/2012 

Espalha brasa:: Dora Kramer


Convocado ou não, o governador Marconi Perillo está pronto para ir à CPMI que investiga as conexões público-privadas da organização Cachoeira e nesta terça-feira decide, além da quebra de sigilos da matriz da construtora Delta, se chama ou não para depor os governadores de Goiás, Brasília e Rio de Janeiro.

Caso a comissão resolva não convocar os governadores, Perillo (GO) examina fortemente a hipótese de ainda assim se oferecer para depor. Contraria, nessa posição, a opinião de seu partido (PSDB) que considera sua ida arriscada por expor o governador a um massacre político patrocinado pelo PT.

Marconi Perillo concorda em parte. Acha que é mesmo alvo de "uma CPMI que nasceu direcionada para atingir a imprensa, desmoralizar o procurador da República, enfraquecer a oposição e desviar o foco do julgamento do mensalão".

Por isso, em princípio não veria "razão objetiva" para ser convocado. Mas, segundo ele, as "razões subjetivas" existem e não podem ser ignoradas.

Dos três governadores, reconhece, é o mais atingido. Portanto, melhor ir "e esclarecer tudo de uma vez" do que não ir e sangrar na opinião pública como suspeito.

Uma espécie de contra-ataque no qual incluirá a apresentação de uma proposta para que se faça a CPI das Empreiteiras. "Aí se poderia obter um quadro bastante realista sobre financiamentos de campanhas eleitorais no Brasil."

O roteiro de Perillo na CPMI já está praticamente concluído: da exposição inicial - em que ressaltará a importância de instrumentos de fiscalização como comissões de inquérito - aos documentos que levará mostrando que os negócios da Delta em Goiás começaram no governo do PMDB e prosperaram também em administrações do PT.

Sobre a venda da casa onde foi preso Carlos Augusto de Almeida Ramos no fim de fevereiro, exibirá uma entrevista que deu na ocasião dizendo exatamente o que Wladimir Garcez Henrique - lobista da Delta e braço direito de Cachoeira - disse à CPMI na última quinta-feira.

"Não há choque de versões", atesta. Na edição de 3 de março, o jornal O Popular, de Goiás, registra que o governador contou ter sido procurado por Wladimir, interessado em comprar a casa. "Quando fui passar a escritura, ele me informou que o (empresário) Walter Paulo seria o comprador. Recebi três cheques e fui fazendo os depósitos como combinado."

Sim, mas como o governador explica ter recebido os três cheques assinados por Leonardo de Almeida Ramos, sobrinho de alguém que já havia sido protagonista do escândalo Waldomiro Diniz?

Pois é, não explica. Atribui a "erro imperdoável" o fato de não ter verificado a identidade de quem assinada os cheques. "Daí o desgaste extremo que venho sofrendo."

Segundo ele, injusto, pois "quem primeiro levou Cachoeira a fazer negócios com o governo foi o Maguito (Vilela, do PMDB), em 1995, para exploração da loteria estadual por meio da empresa Gerplan".

A Delta, de acordo com o governador, entrou em Goiás pelas mãos do mesmo partido quando Íris Rezende era prefeito de Goiânia, em 2005.

Perillo apresentará à comissão certidões do tribunal de contas mostrando que entre 2005 e 2011 a empreiteira recebeu cerca de R$ 300 milhões de contratos firmados em Goiânia, Aparecida de Goiás, Anápolis e Catalão, em gestões do PT e do PMDB.

Com isso, pretende demonstrar a "diversificação" geográfica e partidária da atuação da Delta em Goiás.

Voltemos a Carlos Cachoeira, já que Perillo é citado nos grampos da Operação Monte Carlo que registra um telefonema dele para o hoje presidiário e na época prestigiado empresário no Estado - "morava no edifício onde moram os mais ricos de Goiânia".

O governador qualifica suas relações com ele como "absolutamente esporádicas". E o que significa isso?

"Que o recebi uma vez a pedido do senador Demóstenes, que o encontrei em dois ou três jantares e que telefonei para ele uma vez para cumprimentar pelo aniversário."

A propósito de quê, se não eram próximos? "Estava numa festa, bebendo vinho numa roda de amigos que sugeriram e eu telefonei."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

As bienais e as vanguardas:: Ferreira Gullar


A Bienal de Veneza, fundada em 1895, foi talvez o primeiro sinal da tendência à internacionalização das manifestações artísticas que surgiam e se multiplicariam nas décadas seguintes. Nela, pela primeira vez, as tendências estéticas inovadoras de diferentes países europeus podiam ser apreciadas por um público também internacional.

Assim, a Bienal de Veneza se tornaria a vitrine da arte de vanguarda, característica do século 20. É desnecessário dizer que os fundadores da Bienal não podiam prever o futuro que a esperava mas, se a criaram, foi porque os tradicionais salões nacionais de arte tornaram-se incapazes de atender à inevitável internacionalização dos movimentos artísticos que eclodiam nas cidades de Paris, Berlim, Zurique, Milão e Moscou.

Mas o papel desempenhado pela Bienal não se limitou a difundir a produção artística internacional, uma vez que esse encontro das diferentes manifestações nacionais estimulou a troca de influências, ao mesmo tempo que a difusão e intensificação do experimentalismo estético. Desse modo, a Bienal de Veneza passou a desempenhar um papel dinamizador das inovações artísticas e de sua progressiva internacionalização.

É verdade que duas guerras mundiais -a de 1914 a 1918 e a de 1939 a 1945- provocaram interrupções nesse processo, dificultando ou mesmo inviabilizando o intercâmbio entre artistas e países.

A mais grave dessas interrupções foi provocada pela Segunda Guerra Mundial, de que resultou o exílio de artistas e até mesmo a cessação de vida artística em importantes centros culturais da Europa.

É verdade, porém, que a radicação de alguns artistas importantes em países onde a guerra não chegara resultou em outro modo de difusão das tendências artísticas que representavam. Com o fim do conflito, reatou-se o intercâmbio artístico e a Bienal de Veneza retomou suas atividades.

Foi então que Ciccillo Matarazzo Sobrinho fundou, em 1951, a Bienal de São Paulo, destinada a influir decisivamente no processo artístico brasileiro.

Por surgir quando surgiu e onde surgiu, esta Bienal não desempenhou inicialmente o mesmo papel que a de Veneza, mas se aproximou dela em função mesmo do que viria a ocorrer no âmbito internacional.

A primeira e principal consequência de sua criação foi contribuir decisivamente para o surgimento, no Brasil, da arte concreta, cuja figura principal era o suíço Max Bill, ganhador do prêmio da 1ª Bienal com sua escultura "Unidade Tripartida".

O concretismo significou a ruptura com a tradição modernista brasileira, surgida no ano de 1922, e possibilitou o nascimento da arte neoconcreta, considerada hoje uma contribuição original brasileira à arte contemporânea.

Mas os anos se passaram e as vanguardas, seguindo os "ready-mades" de Duchamp, abandonaram as linguagens artísticas, fundadas no domínio técnico, para entregar-se ao improviso das sacações ditas conceituais.

Disso resultaram as instalações e os "happenings" que não buscam permanência, mas apenas o impacto eventual e momentâneo.

Por outro lado, como não se apoia numa linguagem, a arte conceitual se vale de todo e qualquer objeto (ou coisa, ou gente, ou bicho) para se expressar. Isso vai desde expor casais despidos num museu até engaiolar urubus para exibi-los numa bienal.

Resulta que tais sacações só ganham caráter de arte se realizadas numa galeria de arte, num museu ou numa bienal. Ou seja, essa é uma vanguarda que precisa das instituições para se afirmar.

Por essa razão, as bienais, dado o caráter de mostras eventuais, tornaram-se o lugar mais do que qualquer outro propício à arte conceitual, pois a obra dura o tempo que dura o evento e termina com ele.

Com raras exceções, por não se apoiar numa linguagem, mas numa "boa ideia", a arte conceitual -depois de se valer de casais despidos e de urubus engaiolados- vê esgotar-se seu repertório.

Essas bravatas já não escandalizam ninguém. O urinol de Marcel Duchamp completa um século em 2017. Como uma se apoia na outra, é possível supor que não vão durar muito tempo.

FONTE: ILUSTRADA / FOLHA DE S. PAULO

Falsos remédios :: Suely Caldas


Há dias a presidente Dilma Rousseff prometeu fazer a reforma tributária com um novo modelo de ação: em vez de anunciar, vai executar; em vez de uma proposta global, medidas pontuais. Na gestão Lula o governo passou anos negociando com governadores e parlamentares, foi cortando aqui e ali, aceitou desfigurar e minguar a proposta inicial até ser reduzida à unificação do ICMS apenas. Ainda assim, desistiu de enviar a proposta ao Congresso, porque seria rejeitada no ato. Dilma cansou e vai seguir outro caminho. Deu como exemplo a tarifa de energia elétrica, que prometeu desonerar de impostos. Anunciou, mas até agora não executou.

Seu ministro da Fazenda parece ter entendido o recado assim: a reforma tributária precisa ser pontual, pragmática e flexível - desonera o imposto hoje e eleva a alíquota amanhã, ao sabor da conjuntura do momento. E a estrutura tributária segue intacta, inalterada. Se o pátio das montadoras está lotado de automóveis, corta-se o imposto, a indústria vende, desova os estoques e três meses depois volta o que era antes. Se há outros setores industriais estocados e com a produção em queda, que arranjem empresários e trabalhadores com força de pressão política em Brasília. Como tem a indústria automobilística.

A reforma tributária pode e deve ser fatiada, como quer a presidente. Ela não avançou nos governos FHC e Lula porque seguiu um ritual errado, de tentar negociar o conjunto, dando margem a barganhas políticas com um e outro tributo que a tornavam inócua ao final da negociação. Mas é absolutamente indispensável ela ser pensada no conjunto, reduzir não só a carga tributária, como também a quantidade de impostos, buscar a simplificação, facilitar a cobrança e a arrecadação e dificultar a sonegação.

Não dá para fazer reforma mantendo a mesma estrutura tributária, sem corrigir um sistema que se transformou num monstro justamente porque rombos momentâneos superaram a racionalidade fiscal desde os tempos da ditadura militar. Para falar mais claro, nos últimos 40 anos um imposto era criado sempre que o Orçamento federal abria um novo rombo, gerado por sucessivos governos que gastavam mais do que podiam. Assim nasceram o PIS-Cofins federal, as nove taxas embutidas nas contas de luz, a taxa de incêndio municipal e por aí vai. E o contribuinte segue pagando para sustentar governos cada vez mais caros. E a indústria segue perdendo, cada vez mais, poder de competição.

O estilo pragmático do governo Dilma é bem-vindo no momento certo e em situações adequadas. O problema é que a equipe econômica mistura alhos com bugalhos e confunde reforma tributária com desonerações temporárias. Em vez de aperfeiçoar a regulação para incentivar o investimento privado em infraestrutura, enche o caixa do BNDES com dinheiro subsidiado para financiar a produção dirigida ao consumo. O imediatismo esconde o problema real.

Dilma precisa ser assessorada por gente que pense mais longe, que enxergue os dilemas estruturais do País, os gargalos que freiam o crescimento, sufocam a produtividade e enfraquecem a competitividade da indústria. Isso não será resolvido com desoneração episódica e dirigida a só um setor industrial. Esse fôlego momentâneo não resolve e ainda deixa todo o resto da indústria padecendo dos males de sempre.

Com o novo pacote, instalou-se a discussão sobre se o modelo de crescimento via consumo está ou não esgotado, se dá ou não para recuperar um crescimento entre 3% e 4% este ano. O debate está fora de foco, até porque o real objetivo do pacote foi esvaziar os pátios das montadoras e evitar demissões de trabalhadores. Está longe de ser capaz de reverter o desaquecimento econômico. Mas é essa a agenda que o governo oferece.

Em conta-gotas de falsos remédios para retomar o crescimento, o governo Dilma abandona o eficaz e verdadeiro caminho: tocar as reformas, investir em infraestrutura e educação para o trabalhador, reduzir o custo de produzir no Brasil, elevar as taxas de poupança e investimento. E, sobretudo, o governo economizar dinheiro, racionalizar seus gastos e ampliar seus investimentos.

Suely Caldas, jornalista; é professora da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

"A Decadência do Ocidente":: Vinicius Torres Freire


No curto século 21, China e ruína causada pela finança mudam relações de poder velhas de mais de 200 anos

A gente hoje dá de barato o poder e a força econômica da China, como se a importância chinesa fosse tão evidente e antiga quanto uma pirâmide egípcia. Mas o elefante chinês entrou na sala faz pouco tempo.

Foi mais ou menos na época em que parecia triunfante o que a esquerda chama de "neoliberalismo".

Foi na mesma época em que os Estados Unidos espalhavam exércitos pela Ásia. Quando americanos e europeus espezinhavam os "emergentes" a dizer que, sem abertura comercial e "reformas" (as deles), iríamos à breca. Isso ainda após o fracasso das reuniões da OMC de Seattle (1999) e Gênova (2001) e da derrota midiática que a rua impôs à ideia de liberalização comercial.

Era então a época em que a maioria dos economistas-padrão se congratulava pela sua ciência, que fora capaz de produzir o que seria chamado de "grande moderação" (flutuação econômica menos violenta, menos inflação, mais crescimento).

A moderação era uma bolha e em parte uma fraude; a inflação baixa e os fundos para a bolha da "estabilidade" vinham da China.

No ano 2000, a economia da China equivalia à da Itália; era algo menor que a da França (com o PIB medido em dólares correntes, na taxa de câmbio nossa de cada dia).

Se considerado o poder de compra relativo de cada moeda, a China já era então o dobro da França ou da Itália. Mas então a gente não se dava conta do tamanho chinês.

Muitos sábios diziam que o milagre chinês era bolha, "insustentável", que o país nem teria tempo de posar de novo Japão, que continua rico, mas estagnou e abdicou de suas aspirações de predominância mundial lá no início dos anos 1990.

Índia e China equivaliam a 10,8% da economia mundial em 2000. Os europeus do G7 (Alemanha, França, Reino Unido e Itália), a 15,5% (à medida que leva em conta o poder de compra relativo das moedas, em dólares "PPP").

Índia e China deverão terminar este ano com 20,8% do PIB mundial, ante 11,6% dos europeus. O trio Brasil, China e Índia supera o duo anglo-saxão, EUA e Reino Unido.

De 2000 a 2012, a economia chinesa terá crescido uns 247%. A indiana, 147%. A brasileira, meros 57%, mas à frente dos 26% dos EUA, dos 18% de França e Alemanha. Dos 11% do Japão, dos 6% da Itália.

Os EUA estancaram o terrorismo, mas não puseram ordem no Iraque. Os exércitos ocidentais dão o fora do Afeganistão por estafa, inépcia, fracasso e falta de dinheiro. Mesmo para derrubar ditaduras no norte da África quase faltou poder de fogo às forças aéreas da Europa.

A finança ainda manda no mundo, mas o mercadismo desmoralizou-se como ideologia.

Morreu a Alca, a área de livre comércio das Américas. Note-se que, ainda em 2002, os americanos diziam ao Brasil que, sem Alca, teríamos vinit@uol.com.br comerciar com a Antártida.

Desde 2000, porém, o comércio entre Brasil e China cresceu 33 vezes (para US$ 77 bilhões) e superou os negócios entre Brasil e EUA (US$ 59,7 bilhões, dados de 2011).

Sim, nós aqui queremos consumir tanto quanto e como os americanos. Sim, é melhor ser infeliz em Paris. Sim, a ditadura chinesa é repulsiva.

Não se trata disso aqui. Mas de dizer que a China virou o mundo do avesso em uma década -a China era o bug do milênio, do ano 2000. Ou enfim eles vão quebrar?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O euro, ou vai ou racha:: Celso Ming


As urgências da área do euro estão crescendo de maneira assustadora. Não se trata apenas de providenciar socorro para economias incapacitadas de honrar seus compromissos externos ou bancários - casos da Grécia, de Portugal e da Irlanda.

Trata-se, agora, também de impedir séria deterioração das finanças de países bem maiores - como Espanha e, eventualmente, Itália. E, assim, de evitar quebradeira sistêmica dos bancos na Europa, caso algum país seja obrigado a deixar o bloco, como parece provável acontecer com a Grécia.

A saída do euro exigiria troca de moedas. Fiquemos com o caso da Grécia. Como nenhum cliente de banco grego quer dormir com aplicações em euros e acordar com aplicações em dracmas, a corrida aos saques já começou e se intensificará quando a troca de moedas for iminente - se, antes disso, o governo já não tiver decretado feriado bancário.

Esse movimento não se limitará à Grécia. O avanço aos ativos dos bancos já começou em outros países, sobretudo na Espanha. O Bankia, tido há alguns meses como saudável, já precisou de injeção de 10 bilhões de euros. Outras instituições financeiras espanholas precisam de pelo menos 60 bilhões de euros para enfrentar o desassossego dos clientes.

É claro que um ajuste a ser feito com mais crescimento econômico fica mais fácil. Isso é como o trânsito. É bem melhor passar de uma faixa da pista para outra se o trânsito está andando normalmente. Mas tente fazer a mesma coisa quando tudo está emperrado.

Mais crescimento econômico apenas ajudaria a arrumação, quando ela começar. Para que o euro ganhe consistência, é preciso mudar muita coisa.

Não basta existir um banco central forte e independente mais um conjunto de tratados feitos com promessas, até agora não cumpridas, de equilíbrios orçamentários. É necessário arrumar um fundo de socorro (hoje pequeno demais para as necessidades) para ser usado em caso de incapacidade de um país pagar seus compromissos. E é preciso o que até agora não foi possível: montar um sistema federativo na área do euro com um Tesouro comum, bancos em escala regional (e não mais nacional) e uma autoridade central com poder para arrecadar e distribuir recursos. Até agora, todas as tentativas nessa direção foram sumariamente barradas por alguns Parlamentos.

A única proposta que prevê algum grau de federalização é a da criação do eurobônus, que, de algum modo, criaria um sistema de compartilhamento financeiro. Mas, como se sabe, os vetos sumários de Alemanha, Suécia, Áustria e Finlândia o tornam impossível - ao menos por enquanto.

A novidade é que a zona do euro se aproxima de uma situação de ou vai ou racha. Quando de sua criação, os pais do euro, principalmente o então chanceler da Alemanha, Helmut Kohl, e o presidente da França à época, François Mitterrand, foram avisados de que, sem consistência no núcleo da moeda, mais cedo ou mais tarde viria a crise. Mas eles optaram por ir em frente assim mesmo, no pressuposto de que um dia se criariam as condições políticas para a montagem da unidade fiscal e política dentro do bloco. Esse momento chegou. É pegar ou largar.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Crescimento modesto em 2012:: José Roberto Mendonça de Barros


Não existe mais dúvida: o crescimento de 2012 será muito modesto. A MB Associados reduziu sua projeção para uma expansão do PIB de apenas 2,5%. Essa redução não parece ser passageira, nem decorre apenas da expectativa da piora recente no quadro internacional, mas sim da letargia da demanda doméstica e de dificuldades de certos setores produtivos, apesar de todos os incentivos introduzidos pela política econômica. Um aprofundamento da crise europeia exigiria uma revisão dos dados ainda mais forte. Todos os componentes da demanda agregada (exportações, investimento e consumo) estão andando mais devagar, sem perspectivas de grande melhora nos próximos meses.

As exportações vêm sendo negativamente afetadas pela redução do crescimento global. Em abril deste ano, frente ao mesmo período de 2011, a quantidade exportada de bens intermediários caiu 5,7%, enquanto a de bens de consumo duráveis 22,2% e a de bens de consumo não duráveis 10,2%. Além do crescimento mais modesto no mundo todo, a menor competitividade do produto nacional vem implicando em recorrente perda de participação nos mercados, especialmente frente à competição asiática em outros países emergentes.

Finalmente, o protecionismo mais elevado também tem um papel, visível mais que tudo no caso argentino (entre janeiro e abril deste ano as exportações de manufaturados caíram 9%). Após uma ameaça de uma posição mais altiva, a política externa brasileira volta a já tradicional submissão dos últimos anos. Lamentável.

Todos os indicadores de investimento continuam mostrando um forte enfraquecimento. Isto é verdade para a importação de bens de capital, que mostrou um crescimento de apenas 4,3% no primeiro trimestre do ano (contra 28% há um ano), para a produção local de equipamentos, que caiu 11,4% no mesmo período e nos insumos típicos da construção civil, que mostrou crescimento de apenas 3,3%.

O investimento público está enfrentando neste ano dificuldades maiores que as usuais e seus valores vêm apresentando apreciável redução. Segundo estimativa de Mansueto Almeida, o investimento público no primeiro quadrimestre deste ano apresentou uma queda nominal de 10,2% em relação ao mesmo período do ano passado, quando se excluem as transferências do Tesouro ao Fundo de Arrendamento Residencial, (FAR), que é uma despesa de custeio e não de investimento. Um crescente número de greves tem afetado a construção de inúmeros projetos, como as usinas de Santo Antonio, Jirau e Belo Monte, as refinarias Abreu de Lima e Comperj e estádios como o Maracanã. Ao mesmo tempo, o rapa que afetou o DNIT reduziu a quase zero a velocidade dos projetos. Finalmente, os episódios em torno da Delta Engenharia contribuem para as dificuldades.

A construção civil residencial também anda muito devagar. Neste caso, o problema básico não é a falta de demanda ou de financiamento, mas sim, um problema na oferta. De fato, as construtoras depois de venderem muito bem em 2009 e 2010 passaram a encontrar grandes dificuldades para construir as edificações. Essas dificuldades são essencialmente ligadas à grande escassez de mão de obra com qualificação, que resultam num crescimento persistente de elevação de custos e de atrasos na entrega dos apartamentos. Ainda vai levar alguns trimestres antes da normalização do fluxo de produção.

Ainda na área de investimento, é cada vez mais reconhecida a dificuldade da Petrobrás em manter o cronograma dos novos projetos, pela enorme dificuldade de conciliar preço, grau de nacionalização e prazos de entrega de grande parte dos equipamentos encomendados. Com isto, praticamente todos os projetos estão atrasados.

Em outros setores, vários projetos de expansão estão sendo revisados e postergados. É o caso da indústria siderúrgica, afetada pela gigantesca capacidade ociosa no mundo, da ordem de 500 milhões de toneladas. No setor de açúcar e álcool ocorre a mesma coisa, uma vez que a manutenção do preço da gasolina fixo por vários anos destruiu a rentabilidade na produção de etanol; além das empresas já em dificuldades financeiras, há notícias no mercado de vários "players", colocando à venda suas empresas. Os balanços ruins que temos visto, resultado direto das grandes elevações de custos dos últimos tempos, também têm levado à postergação de novas inversões.

Os estrangeiros estão perdendo o entusiasmo para investir no Brasil, inclusive pela excessiva interferência na economia e frequente mudança de regras. Os animais dos espíritos estão voltando para as jaulas e vai demorar algum tempo para retirá-los de lá, mesmo com a queda de juros e a desvalorização do real.

Finalmente, devemos considerar a questão do consumo. Os dados mostram certo arrefecimento nas compras, concentradas no setor automotivo. Este desempenho tem muito a ver com o excesso de endividamento de parcela expressiva dos consumidores.

De fato, pesquisa da MB mostra que nas classes C e D/E 20% das famílias assumiram compromissos mensais acima de 30% de sua renda, dificultando o pagamento em dia de suas prestações. É frequente o caso em famílias com prestações acima de 40% da renda mensal. Devemos lembrar que nestas faixas de renda a manutenção básica (alimentos, transporte, etc.) compromete entre 65% e 75% da renda familiar. Quando se atinge essa situação, é inevitável que o consumo se retraia.

No caso dos automóveis, a situação é ainda pior, pois a partir de 2008 os carros usados se desvalorizaram pesadamente, implicando uma perda de capital para os proprietários e tornando mais difícil a tradicional troca de um carro velho por um mais novo. Vai, portanto, levar algum tempo antes de uma volta à normalidade e é por isso, que os pacotes de auxílio ao consumo tem tido cada vez menor eficácia.

Passado esse ajuste, que deve levar ainda alguns trimestres, o crescimento da demanda voltará a ocorrer, com taxas mais modestas que as do passado recente. Em primeiro lugar, porque uma boa parte do efeito inclusão dos mercados de consumo já ocorreu (não existem mais 12,5 milhões de domicílios para serem incluídos no Bolsa Família, por exemplo), pela dificuldade de se manter taxas tão elevadas de aumento do salário mínimo como no passado recente, e pela dificuldade de se manter o crescimento dos salários muito acima da produtividade como nestes últimos anos.

Da mesma forma, a expansão do crédito ao consumidor não dará mais saltos como no passado, pois uma boa parte dos consumidores já está no circuito de crédito. Fabio Ramos da Quest calculou que a relação crédito ao consumidor (exceto imobiliário) sobre o PIB já está muito próxima daquela observada nos EUA, da ordem de 16%. O consumo continuará a crescer, mas de forma mais moderada, e mais dependente da elevação da produtividade do trabalho do que de transferências e inclusão.

A lentidão do crescimento deste ano tem, portanto, tudo a ver com dificuldades reais, e de difícil superação, nas exportações, nos investimentos e no consumo. A crise na Europa soma-se aos fatores acima apontados, resultando num crescimento modesto para 2012, que estimamos ser da ordem de 2,5%, como já contamos no início deste artigo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O "B" e o "C":: Merval Pereira


Como não podia deixar de ser, o papel dos Brics no cenário mundial foi tema recorrente em várias palestras no encontro da Academia da Latinidade que terminou na sexta-feira aqui em Pequim. Entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, na visão do secretário-geral da academia, o cientista político Candido Mendes, os poderes emergentes se diferenciam, a começar pelo fato de que existem quatro nações em desenvolvimento e a Rússia "em franca regressão".

Dentre eles, há o protagonismo de Brasil e China, a situação brasileira reforçada pela política externa "de afirmação de independência" no Oriente Médio, de avanço nas ações africanas, mas, sobretudo, segundo ele, de "descontextualização da antiga moldura latino-americana".

Para Candido Mendes, o Brasil entra nessa globalização não hegemônica que se desenha com parceiros que seriam impensáveis há 20 anos e, nesse quadro, o protagonismo de Brasil e China pode ser constatado na expansão das atividades dos dois e na consequente competição, na África.

A China está em vários países africanos - Angola, Moçambique, Cabo Verde - e, na visão de Candido Mendes, não na velha posição demagógica de Fidel Castro, mas na perspectiva de criar uma política de desenvolvimento social e de mobilização. "Até diria que a China está avançando sobre o Brasil, mesmo na antiga África portuguesa."

Ele vê "uma parentela natural" entre as duas imensas nações voltadas para seus mercados internos. O lado discordante dessas políticas faz parte do jogo democrático, com cada país defendendo seu interesse imediato, mas há um enorme espaço, segundo Mendes, para uma parceria.

Dentre essas nações, na sua opinião, o Brasil é aquela que tem o melhor regime democrático, pois a Rússia está deixando de ser uma democracia, a Índia tem o regime dos párias, e a África do Sul tem problemas regionais dos mais graves.

Mas tem que ser levado em conta, ressalta Candido Mendes, que a China não é um país inerte do ponto de vista político e social. "Basta ver a presença universitária chinesa, a mobilização interna da China do ponto de vista cultural, 250 milhões de pessoas visitando os museus todos os anos."

Esses dois países tem posições de liderança, mas são distantes entre si, e as condições objetivas para uma provável convergência histórica ainda precisam ser montadas através do conhecimento recíproco.

Candido Mendes fala de intercâmbios universitários e culturais, a começar por um festival de cinema nos dois países. Ele acha que o aprofundamento do conhecimento das realidades será viabilizado pela nova postura da China, que sempre foi um país voltado para seu interior e agora está num processo de globalização acentuado.

O professor Enrique Larreta, diretor de Pluralismo Cultural do Instituto Candido Mendes e que tem se dedicado a estudar a China, onde passa temporadas pesquisando na Academia de Ciências Sociais de Xangai, ressalta que esse processo de globalização tem sido bem recebido pela população chinesa e começou nos anos 40 do século passado, depois da Guerra do Ópio, quando ocorreu um grande debate no país sobre como entrar na modernidade.

Um forte movimento pedia "a senhora ciência" e "a senhora democracia", estudantes queriam acabar com toda a tradição, inclusive os ideogramas.

Mao era um modernista, e desse processo nasceu a revolução marxista de 1949, que teve sua base na questão agrária, num país com quase 70% de camponeses.

O processo de modernização começou com Deng Xiaoping e prossegue nos últimos 30 anos. Um marco foi a entrada na Organização Mundial do Comércio, que foi considerada aqui uma grande vitória.

Hoje, segundo Larreta, há processos de regularização jurídica, tratados de direitos humanos assinados, com monitoramento de resultados. Há um processo de liberalização em curso, com retrocessos, muitas dimensões, mas inegável, ressalta Larreta.

A população está de acordo. E, como não é democrático, o regime chinês precisa se legitimar de alguma maneira sem ser pela força. "Aí entra a questão do bem-estar, o regime tem que ser eficaz, tem que manter o sucesso econômico e fazer o país se desenvolver", adverte, lembrando que há problemas sérios de etnias, como o Tibete, e a liberalização afeta bastante os conflitos étnicos, que são uma expressão da democracia, com espaços, mesmo que limitados, para a reivindicação de direitos.

Um bom exemplo de espaços de reivindicação numa ditadura é a reação da opinião pública, liderada pelas denúncias de jornais - todos estatais -, de crítica aos responsáveis pelo desastre do trem-bala há cerca de um ano, quando toda a burocracia responsável foi demitida e culpada pelas mortes.

O aspecto político da união dos Brics, ressaltado por Candido Mendes, foi dissecado pelo professor Walter Mignolo, da Duke University, que atribuiu o sucesso econômico do grupo à desobediência aos organismos internacionais como FMI ou Banco Mundial, assumindo uma tarefa de descentralizar a governança econômica mundial.

Ele chama a atenção para a necessidade de o grupo encontrar uma coerência política interna, o que, aliás, é um objetivo explicitado na última reunião em Délhi, na Índia.

Além disso, Mignolo vê nos Brics uma questão ética subjacente, a de ser um grupo formado por lideranças "não ocidentais", no sentido de serem países que de uma maneira ou de outra foram colonizados pelas potências ocidentais - Mignolo acha que a China com a globalização sofre com a lógica da colonização, embora nunca tenha sido colonizada diretamente - e hoje se mantêm independentes, ganhando força nos organismos internacionais anteriormente dominados por europeus e americanos.

Essa tese do professor de Duke foi rebatida tanto por scholars chineses durante os debates, pois não houve nenhum que se mostrasse insatisfeito com os progressos alcançados nos últimos 30 anos, e também por Enrique Larreta, que ressaltou que os laços culturais da China são tão fortes que o nome em chinês dos Estados Unidos (Meiguo) quer dizer "país bonito".

FONTE: O GLOBO

sábado, maio 26, 2012

Fernando Gabeira Coisa Nossa

O Estado de S. Paulo - 25/05/2012
 
Desaparece, progressivamente, o espaço de uma filosofia solar que nos encarava como pessoas dotadas de uma confiança natural diante do desconhecido. E o tempo em que acreditávamos na sua palavra, exceto se tivéssemos alguma razão especial para duvidar ela.
Vivemos outra era, tão bem expressa pelas novelas da Globo e pelos reality shows. O que ensinam eles? Segundo Zygmunt Bauman, a mensagem é clara: a vida é um jogo duro para pessoas duras. Cada jogador joga por si próprio, mas a fim de obter certos resultados é preciso cooperar. O fundamental é tirar os adversários do jogo: primeiro, os que competem diretamente; em segundo lugar, os aliados ocasionais, depois de extraída sua última gota de utilidade.
Os outros são antes de tudo competidores. Estão sempre tramando, lançando cascas de banana, cavando buracos, montando armadilhas para nos fazerem tropeçar e cair. Nesse sentido, nada mais próximo de um reality show que a CPI do Cachoeira. Nela, como no reality show, a câmera e seus movimentos desempenham papel essencial.
No Big Brother, ela desvenda movimentos rítmicos sob o edredom; na CPI, escrutina outras superfícies digitais, a tela de um telefone celular, por exemplo. A frase que a câmera do SBT captou no telefone do deputado Cândido Vaccarezza é de uma clareza invejável: "Não se preocupe, você é nosso e nós somos teu". A CPI do Cachoeira não é apenas regida pela câmera, mas sua filosofia, na frase de Vaccarezza, é a de um reality show, um jogo de "nós contra eles". Quando surgiu, com tantas promessas de vingança, eu a chamei de CPI do "ai se eu te pego".
Num reality show, Vaccarezza iria para o paredão. No entanto, ele prestou um serviço. A blindagem que armou para o governador do Rio, Sérgio Cabral, não é de aço temperado, mas de um latão que mais expõe do que protege. Uma frase no monitor de cristal líquido desnudou o companheiro que queria encobrir.
Sou suspeito em tudo o que falo sobre Cabral. Fomos adversários nas duas últimas eleições. A essência dessa disputa, na visão dos estrategistas da esquerda, é o choque do proletariado em ascensão contra a burguesia decadente. Cabral faz o papel do glorioso proletariado e eu, o da burguesia decadente. Sua primeira vitória, em 2008, foi comemorada "no melhor Alain Ducasse do mundo", ao lado de um grande doador de campanha, o dono da Delta, Fernando Cavendish. A segunda foi mais fácil porque envolvia o interior e deve ter comemorado perto de casa, no Antiquarius.
Ao longo da campanha de 2010 ofereci aos jornalistas evidências de que se travava uma guerra suja na internet. Seu lado mais visível eram sites caros com o objetivo único de ridicularizar o adversário. Mas o lado subterrâneo era a contratação de empresas especializadas que inundavam a rede com comentários a seu favor. A divulgação dessas manobras não teria nenhuma importância no favoritismo de Cabral. Mas era um alento para pessoas que se veem bombardeadas por mensagens negativas na internet e acham que o mundo está contra elas.
Às vezes, essas campanhas são feitas por empresas que acionam seus robôs. Contestá-las é tão inútil quanto discutir com uma gravação ao telefone. O mérito da frase de Vaccarezza foi o de revelar como Cabral teme responder a perguntas elementares que talvez não estejam diretamente ligadas a Cachoeira. Mas certamente estão ligadas à Delta e a seus métodos de corrupção de políticos.
Em torno das placas de cobre e zinco com que Vaccarezza envolveu Cabral há uma blindagem muito mais poderosa, de um aço mais fino. Só ela poderia ter tornado possível que, ao cabo de seis anos de governo, Cabral nunca explicasse suas viagens. No princípio tende-se a supersimplificar a blindagem com o fato de o governador gastar milhões em publicidade. Mas a liga é muito mais complexa no aço que o blinda. Nela há componentes subjetivos, como o medo da Globo da vitória da oposição, a vontade de fortalecer uma política de segurança com êxitos pontuais.
Depois do escândalo das fotos de Paris, repórteres descreveram o paraíso do condomínio de Cabral em Mangaratiba e concluíram o texto com uma cena lírica: o governador e a primeira-dama oferecendo carona aos vizinhos, numa tarde de chuva. Não perguntaram quanto custou sua mansão. E ele não teria outra resposta: R$ 200 mil. Foi o que declarou ao TRE como candidato. Ao questionar esse valor, tive como resposta uma tentativa de processo penal. Acusação: má-fé.
Cabral invalidou nosso programa com imagens em que cantava num palanque ao lado de líderes da milícia. Retirou do ar um texto que dizia ser ele amigo de Cavendish e precisávamos estar atentos ao que fariam no Maracanã. Felizmente, não prosperou no TRE a acusação de má-fé: expressei uma dúvida e ela é a antítese da fé, boa ou má. Certas coisas nem juízes amigos podem determinar.
Foi tanta a proteção a Cabral que ele passou dos limites. Uma tragédia na Bahia e as imagens de Paris começam a corromper o aço que o protege. Acontece que a CPI do "ai se eu te pego" se tornou a CPI do "vamos recuar os zagueiros". Entraram na retranca. Não convocaram governadores, fogem da Delta como o diabo da cruz.
Cabral está marcado por perguntas não respondidas e vai conviver com elas por muito tempo. E a CPI, de tanto evitar o tema Delta, acaba se enrolando nele. No início era apenas Cachoeira. Depois a Delta, mas só a do Centro-Oeste. Com as evidências de que o dinheiro clandestino tinha origem e autorização na matriz da empresa no Rio, só gente muito sem-vergonha tem coragem de restringir as investigações. E essa gente sem-vergonha é maioria esmagadora.
O único consolo que destinam a si próprios e a Cabral é o fato de que tudo repercutiu na classe média, não chegou aos mais pobres. A desinformação é a esperança do PT de Cabral e de Cabral do PT. No passado, a esquerda ao menos se dizia aliada das luzes. Hoje, no Brasil, sonha com as trevas, bons advogados, marqueteiros que fazem do limão uma limonada e legiões de robôs para insultar os adversários. Coisa Nossa.

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