Estudantes não sabem a diferença entre uma
sentença e um parecer. Os cursos são os culpados
Camila Pereira
Antonio Milena |
Alunos de direito: notas vermelhas |
Há dois bons medidores no Brasil para aferir a qualidade de ensino num curso superior de direito. O primeiro é o Enade, a prova aplicada aos universitários pelo Ministério da Educação (MEC). O outro é o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), também um pré-requisito para o exercício da advocacia. Da junção desses dois indicadores surgiu um ranking novo, divulgado pelo MEC na semana passada. Em suma, ele mostra que o nível geral das escolas de direito é bastante baixo e conclui que há 89 cursos "péssimos". Desse grupo, 37 ficaram ainda mais sob os holofotes (veja quadro): não conseguiram aprovar sequer 10% de seus estudantes no exame da OAB de fevereiro e, no Enade, patinaram na nota 2 – numa escala de zero a 5. Embora esse seja um levantamento mais completo do que os que o antecederam, não é exatamente uma surpresa o fato de o ensino de direito aparecer em situação tão ruim. Outras pesquisas já haviam traçado cenário parecido – não só para o direito, mas também para os demais cursos de ensino superior. A novidade do atual ranking é o uso que o governo vai fazer do material.
Os 89 piores cursos da lista terão de apresentar ao MEC um plano com metas para superar as deficiências flagradas pelo ranking – e são muitas. No exame da OAB, por exemplo, estudantes formados não sabiam distinguir uma sentença de um parecer. Caso essas faculdades se recusem a prestar contas ou não entreguem uma proposta concreta para melhorar o cenário, poderão ter o curso suspenso ou mesmo desativado. Também aquelas que tiverem um bom plano de emergência, mas não deixarem a zona do mau ensino, perigam ser impedidas de funcionar depois. No Brasil, o governo faz uso de avaliações para aferir o nível dos cursos superiores há mais de uma década, mas nunca havia tomado a conclusão delas como base para cobrar resultados. A iniciativa será estendida às outras áreas. Os próximos cursos que passarão pelo mesmo tipo de triagem serão os de medicina.
Os especialistas são unânimes em afirmar que o fato de uma avaliação jogar luz sobre as boas e más faculdades já funciona, por si só, como um incentivo à melhora do ensino. Aquelas que vão mal na prova naturalmente tentam elevar o nível para subir no ranking, sob o risco de ver suas matrículas minguarem. Foi o que aconteceu em 1910, quando o educador americano Abraham Flexner avaliou pela primeira vez as faculdades de medicina dos Estados Unidos e do Canadá e divulgou os resultados. De um total de 155, concluiu que 120 eram sofríveis. A maioria fechou as portas por falta de alunos. No Brasil, uma pesquisa feita com base no antigo Provão comprovou, de novo, a utilidade dos rankings. Nos cursos que foram mal avaliados, a procura no vestibular caiu à metade. Os campeões da lista, por sua vez, receberam 20% mais gente. Conclui o especialista Claudio de Moura Castro: "Avaliar cursos é um serviço fundamental que se presta à sociedade". E ao bom ensino.