Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Diogo Mainardi O Brasil para os brasileiros

"Só desembarcam aqui os turistas mais
desavisados. Ou os que buscam sexo barato.
Não temos monumentos. Não temos ruínas
arqueológicas. Nossas cidades históricas são
um amontoado de casebres ordinários e
igrejas com santos disformes"
Eu tenho uma regra. Uma regra elementar. Qualquer um pode segui-la. Funciona sempre. Quando a imprensa publica repetidas reportagens sobre o aumento do turismo brasileiro para os Estados Unidos, está na hora de juntar suas economias, ir correndo até o cambista da esquina e trocar tudo por dólares. Em seis meses, seu dinheiro terá dobrado de valor. Não há a menor possibilidade de erro. Outro dia, O Globo publicou uma reportagem dessas. Continha cinco sinais inequívocos de descalabro cambial: 1) Depois de dois anos, a loja de departamentos americana Bloomingdale's voltou a exibir a bandeira verde-amarela em sua fachada. 2) Os vôos da Varig para os Estados Unidos estão com a lotação completa para os próximos três meses. 3) As escolas de esqui no Colorado agora oferecem cursos em português. 4) A Disney estima um crescimento de 17,2% de visitantes brasileiros em Orlando. 5) Uma vereadora do Partido Verde do Rio de Janeiro foi passar as férias com a família em Nova York e aproveitou para assistir à montagem do espetáculo A Gaiola das Loucas, na Broadway. Trata-se da mesma vereadora cujo caminhão de som me acordou diariamente durante a última campanha eleitoral. Escute o conselho de seu amigo Diogo. Os números não batem. O real irá despencar. Ponha o carro à venda e compre dólares. Ponha o apartamento à venda e compre dólares. Depois me escreva agradecendo.
Não que haja algo de errado em querer viajar para os Estados Unidos. Pelo contrário. Quem nunca foi até lá deve pegar o primeiro avião e se mandar imediatamente. Entre viajar para os Estados Unidos e rodar pelo Brasil, é muito mais recompensador viajar para os Estados Unidos. O potencial turístico brasileiro costuma ser grandemente superestimado. Jamais seremos uma meta preferencial dos estrangeiros. O país tem pouco a oferecer. Só desembarcam aqui os turistas mais desavisados. Ou então os que buscam sexo barato. O mundo está cheio de lugares mais atraentes que o Brasil. Da Tunísia à Croácia, da Indonésia à Guatemala. Temos muitas praias. Mas nosso mar é feio. Turvo. Desbotado. Com despejos de esgoto. Pouco peixe. Peixe ruim. Chove demais. Chove o ano todo. Não temos monumentos. Não temos ruínas arqueológicas. Nossas cidades históricas são um amontoado de casebres ordinários e igrejas com santos disformes. Não temos o que vender porque não sabemos fazer nada direito. Não temos museus. Sou um pervertido, e teria o maior interesse em conhecer o museu da Base Aérea de Brasília, onde está exposta a taça de champanhe manchada de batom que dona Marisa usou na inauguração do avião presidencial. Mas como convencer um turista dinamarquês de que vale a pena fazer o mesmo? Nossas florestas estão sempre em chamas. Não sabemos comer. Desrespeitamos as normas básicas de higiene, contaminando os estrangeiros e a nós mesmos. Roubamos. Com um pouco de sorte, até matamos. O Brasil só serve para os brasileiros. A Embratur deveria parar de fazer propaganda enganosa sobre o país no exterior. Por falar em exterior, para onde vamos no Carnaval?

quarta-feira, janeiro 19, 2005

Diogo Mainardi Lula é caro demais


Pelas minhas contas, Lula é caro demais. A gente não tem dinheiro para

bancar mais seis anos de petismo.

Exemplo 1:

Guilherme Estrella era sindicalista da CUT e presidente do diretório do

PT de Nova Friburgo. Quando Lula foi eleito, nomeou-o diretor de

Exploração e Produção da Petrobras, um dos cargos estratégicos da

companhia. A imprensa, na época, alertou para os riscos do aparelhamento

petista, que favorecia a filiação partidária em detrimento da

qualificação profissional. Agora, dois anos depois, já dá para avaliar

os resultados de sua gestão. Em 2004, a produção nacional de petróleo

caiu mais de 3%. Foi a primeira queda desde 1991. Nos oito anos de

Fernando Henrique Cardoso, a produção aumentou, em média, 10% ao ano.

Pulou de 692.000 barris diários, em 1994, para 1,5 milhão, em 2002. Se

Estrella tivesse mantido o ritmo de crescimento de seu antecessor, a

Petrobras estaria produzindo 315.000 barris diários a mais. Com o barril

a 45 dólares, perdemos cerca de 5 bilhões de dólares ao ano. Repito: 5

bilhões.

Exemplo 2:

O presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, não se abalou com o mau

desempenho da companhia. Pelo contrário. Comemorou a queda de produção

de 3%. Disse que temia uma diminuição ainda maior. A produção de

petróleo caiu, segundo ele, por causa do atraso na entrega das

plataformas P-43 e P-48. O contrato com a Halliburton, empresa

responsável pela obra, previa uma pesada multa em caso de atraso. A

Halliburton atrasou, mas por algum motivo não teve de pagar a multa. O

rombo foi inteiramente transferido para o contribuinte. Dutra não tem um

passado empresarial. Fez carreira como sindicalista da CUT e senador do

PT pelo estado de Sergipe. Não sei o que é pior. A falta de tarimba

administrativa o levou a partidarizar as nomeações para cargos técnicos

e a abolir o esquema de bonificações instituído por Henri Philippe

Reichstul, que premiava os dirigentes que apresentavam ganhos de

produtividade. O efeito foi imediato. Queda de 3% na produção.

Exemplo 3:

Lula declarou, em campanha eleitoral, que as plataformas P-51 e P-52

deveriam ser construídas no Brasil. A bravata lulista levou a Petrobras

a suspender a licitação das obras no fim do governo passado. Atualmente,

a P-52 está sendo feita num estaleiro de Cingapura. Repito: Cingapura,

não Brasil. Em relação ao projeto original, será entregue com um ano de

atraso e irá custar 300 milhões de dólares a mais. Quanto à P-51, a

licitação foi vencida pela mesma empresa de Cingapura, pelos mesmos 300

milhões de dólares a mais, mas o atraso estimado, se tudo correr bem,

será de dois anos. As plataformas produzem 180.000 barris por dia. Cada

ano de atraso corresponde, portanto, a uma perda de quase 3 bilhões de

dólares.

Somando tudo: 5 bilhões de dólares pela queda de produção em 2004 + 3

bilhões pelo atraso de um ano da P-52 + 6 bilhões pelo atraso de dois

anos da P-51 + 600 milhões pelo aumento do preço das plataformas = 14,6

bilhões de dólares de custo lulista.

Isso só na Petrobras. Não dá para calcular os danos no resto do Brasil.

quinta-feira, janeiro 06, 2005

Versão piorada de Francis Diogo Mainardi

"Oito anos depois de morrer, Paulo Francis
continua sendo o mais influente pensador
brasileiro. Não existem mais intelectuais
como ele no país. Só versões pioradas"

Paulo Francis morreu oito anos atrás. A opinião geral é que sou a versão piorada dele. Como responder? Que não é verdade? Claro que é verdade. Digo apenas que a culpa não é minha. Eu me empenho no meu trabalho. Leio, estudo, escrevo, reescrevo. Não faço melhor porque não consigo. Não tenho capacidade. O único fato que alego em minha defesa é que não sou um principezinho. Não herdei o trono de Paulo Francis na imprensa brasileira. Fui posto em seu lugar por falta de alternativas. Porque não encontraram ninguém à altura. Se sou a versão piorada do Paulo Francis, é porque o Brasil, como um todo, piorou. Ficamos ainda mais conformistas, ainda mais rasteiros, ainda mais venais. Pegue a turma de Paulo Francis dos tempos do Pasquim, por exemplo. Apareceu algum humorista de verdade de lá para cá? Não. Apareceram somente chargistas a serviço do regime, como Chico Caruso. Se eles vivessem na Alemanha nazista, estariam pintando caricaturas de judeus com o nariz adunco nas vitrines do gueto. Então não me cobrem por ser uma pantomima grotesca do Paulo Francis. É bem mais instrutivo me ver como aquilo que realmente sou: um simples reflexo da irremediável deterioração intelectual e artística do país.

Oito anos depois de morrer, Paulo Francis continua sendo o mais influente pensador brasileiro. Não é novidade que o melhor da mentalidade nacional se encontra na imprensa. Isso acontece desde Euclides da Cunha. O problema é que Paulo Francis costuma ser mais recordado por seu temperamento do que por sua obra. Seus admiradores sentem saudade de seu talento para o deboche. Seus detratores reclamam de seu ar afetado. Como seria natural num país de analfabetos, discute-se acaloradamente a respeito de sua personalidade, mas ninguém parece disposto a reler seus livros. A republicação de sua obra nos últimos dois anos, pela editora Francis, passou em branco. Dedicaram-lhe apenas umas notinhas chochas nos jornais. É um erro. Uma estupidez. Um país pobre de idéias como o nosso não pode abrir mão de maneira tão leviana de um escritor como Paulo Francis.

Quer um conselho? Releia seu livro de memórias Trinta Anos Esta Noite, publicado originalmente em 1994, no aniversário do golpe militar de 31 de março. Onze anos depois, ficou ainda melhor. Diz mais a respeito do Brasil e dos brasileiros do que Casa-Grande e Senzala. Paulo Francis, para usar uma de suas expressões, não escreve "à brasileira". Não sentimentaliza, não enobrece, não edulcora seu passado. Ao mesmo tempo que se penitencia por suas velhas idéias esquerdistas, ele ridiculariza, uma a uma, toda aquela "gente nojentinha" que nos governou de 1950 em diante. Trinta Anos Esta Noite escancara o lado mais repulsivo do caráter nacional: adesista, fisiológico, acovardado, desonesto, reacionário, primitivo, roceiro. Paulo Francis refletia sobre as asnices brasileiras até mesmo quando lia Samuel Pepys. Ele morreu denunciando a roubalheira institucionalizada das empresas estatais. A Petrobras deveria pedir-lhe desculpas póstumas. Não existem mais intelectuais como Paulo Francis no país. Só versões pioradas.

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