Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 08, 2007

Lula no País das Maravilhas



artigo - Sandra Cavalcanti
O Estado de S. Paulo
8/8/2007

No quadro mundial, o Brasil destaca-se por seus péssimos serviços públicos essenciais. A saúde, o ensino, as Casas legislativas, os tribunais, a segurança nas ruas, em casa e no campo, tudo anda mal. Acima de tudo, o que mais afeta o cidadão, no seu cotidiano, são os problemas permanentes do sistema de transportes de pessoas e de cargas. Vivemos engarrafados, atolados, atrasados, medrosos, enervados ou travados. De quebra, lideramos índices de matança de inocentes nas ruas e nas estradas. São imensos e irreparáveis prejuízos da economia. Não temos política de transportes. Não temos autoridades nem planejamento. Na verdade, imitando a audácia do meu guru em língua portuguesa, o João Ubaldo Ribeiro, nosso sistema é uma tremenda esculhambação! Como se explica isso?

Desde o Império sempre dispusemos de portos bem aparelhados, para receber navios de cargas e de passageiros, tanto no litoral como em nossos principais rios. Já tivemos excelentes ferrovias, ligando áreas produtoras aos portos, garantindo mercados. Funcionaram, por bom tempo, bem organizadas malhas ferroviárias. Várias delas atendiam os primeiros grandes centros metropolitanos, com conforto e pontualidade. Durante o longo período de atuação da Marinha Mercante e do transporte ferroviário, o País viveu e cresceu de forma ordenada e natural. Os bondes eram um ótimo sistema ferroviário urbano e foram fator decisivo para que as cidades se expandissem corretamente. Quem analisa, hoje, a tragédia da favelização de nossas principais cidades sabe, muito bem, que a causa principal desse processo foi a ausência de um sistema de transporte coletivo, rápido, eficiente e ao alcance do bolso dos trabalhadores.

Quando Getúlio Vargas mergulhou o País no primeiro vexame político de sua História, os serviços públicos de transporte ainda funcionavam bem. Eles ficavam a cargo de empresas privadas concessionárias, vencedoras de concorrências abertas, conhecidas e fiscalizadas. Infelizmente, embora esse fosse o modelo dos países civilizados, o ditador preferiu imitar os modelos totalitários de sua época. Fez o que Evo Morales e Hugo Chávez estão fazendo. Insensato como todo caudilho, ele resolveu nacionalizar tudo! Incorporou todas essas empresas ao patrimônio nacional. Nada escapou. Desde a Marinha Mercante, as ferrovias, os bondes, a luz, a energia, o gás, a água, os esgotos, as hidrovias, os portos marítimos e fluviais e até o bondinho do Corcovado! Da noite para o dia, o Estado passou a decidir sobre tudo. Apesar de todo o esforço de democratização do País, as conseqüências dessa insensatez política ainda pesa sobre nós. Por isso somos um país sem ferrovias, sem bondes, sem navios, sem portos e, o que é pior, com uma política de transportes completamente esquizofrênica.

É o caso dos portos, por exemplo. E das estradas que lhes dão acesso, também. Eles são os maiores obstáculos, caso o País venha a crescer de fato. Se tivermos a oportunidade de inundar o mundo com etanol, grãos, carne e manufaturados, vai ser um pesadelo!

Na famosa Agenda dos Portos, apresentada há três anos, Luiz Inácio Lula da Silva se comprometia a executar 64 projetos de emergência em 11 portos. Esses projetos impediriam um colapso em face do aumento das exportações ou das importações. Nada foi feito. Descobriram que não havia projetos para a execução das obras.

Em 2007, Lula disse que havia destinado R$ 434 milhões para essas mesmas obras. Já estamos em agosto e nada! Até agora, R$ 37 milhões serviram para cobrir os restos a pagar de 2005 e 2006. Nos portos aplicaram R$ 13 milhões, não se sabe para quê.

Enquanto isso, o gerenciamento das Docas continua sendo moeda de troca para garantir a base parlamentar do Planalto, comandada por grupos reconhecidamente corruptos.

Nas rodovias federais nem é bom falar. As que foram privatizadas, apesar da gritaria dos petistas, são as únicas que funcionam. As outras, todos sabem: ou assassinam as pessoas ou matam a economia. Sem alternativas, o brasileiro passou a voar. Este ano, os embarques e desembarques chegaram a 102 milhões!

O que fez Lula para melhorar as estradas? Nada! Loteou milhares de cargos do sistema rodoviário e gastou muito em propaganda enganosa. Prometeu usar R$ 400 milhões para tapar buracos nas rodovias federais. Os recursos seriam retirados de uma verba destinada à segurança de vôo. Funcionou? Não. Os buracos estão todos lá, piorados. Mas as televisões exibiram lindas peças de propaganda: "Uma Viagem para Todos" e o "Artesanato Brasileiro". Nosso dinheiro pagou por elas exatos R$ 1.331.000.000,00 - um bilhão e trezentos e trinta e um milhões de reais! E o projeto de segurança de vôo também não saiu...

Não vejo, pois, como a pasta da Defesa possa ter poderes e recursos para resolver o problema dos aeroportos - além do das rodovias, dos portos, das ferrovias, etc. Todos os projetos a serem implementados são projetos da área dos transportes.

Fica bem claro que a questão fundamental desta triste situação reside na falta de um plano nacional, na falta de uma política de transportes moderna, ágil e livre das amarras estatais. Sem isso, o Brasil continuará proibido de crescer, de produzir, de viajar, de transportar, de passear. E continuará a chorar os seus mortos.

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