Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 28, 2007

Palavra de honra DORA KRAMER

Em princípio, não há razão para duvidar da palavra do presidente Luiz Inácio da Silva, empenhada na entrevista ao Estado publicada domingo.

''''Meu mandato termina no dia 31 de dezembro de 2010. Agradeço ao povo brasileiro o carinho que teve comigo e passo a faixa a outro presidente da República em 1º de janeiro de 2011'''', disse ele, no que pode ser tomado como um epitáfio no túmulo da idéia de um terceiro mandato subseqüente ao atual, mediante alterações constitucionais.

Lula repudiou a proposta, mesmo se originária ''''do povo''''. Faltou dizer, mesmo se fruto de plebiscito sugerido pelo PT, caso o Congresso do partido, a ser realizado nesta semana, aprove a tese da Assembléia Nacional Constituinte exclusiva para a reforma política.

Em princípio, está firmado, por parte do presidente Lula, o compromisso do respeito à alternância do poder tal como expresso na lei em vigor.

O presidente, assegura, organizará sua sucessão, participará dela ativamente e trabalhará para eleger o substituto ao molde de suas convicções do que seja melhor para a continuidade da ''''política que estamos plantando agora''''.

Mais que apropriada, a manifestação presidencial era indispensável neste momento para aplacar desconfianças e deixar que o debate da sucessão comece em termos de normalidade institucional e assim prossiga até o momento da definição de candidaturas e da campanha propriamente dita.

Tudo muito bem posto e definitivamente esclarecido não fosse o histórico de compromissos firmados num dia e ignorados nos seguintes, não fossem também as diversas oportunidades em que Luiz Inácio da Silva empenhou a palavra num sentido e agiu em outro, não raro oposto.

Deixemos de lado opiniões de Lula e do PT quando eram de oposição. Tomemos o critério proposto por ele mesmo na entrevista ao Estado: ''''Na hora do discurso, à frente de um partido, você pode ser principista (ortodoxo), mas na hora de governar você precisa saber que tem um jogo a ser jogado.''''

Mesmo assim, só levando em conta o período do jogo em curso, a série de ditos presidenciais à luz da freqüência e da falta de cerimônia com que foram desmentidos pelo autor não confere fé absoluta na palavra do presidente.

Quantas vezes já não se ouviu Lula assegurar que teria uma relação institucional com os partidos, fugindo da lógica do fisiologismo agora incorporada como ''''uma coisa crônica'''' no País?

Uma vez pelo menos com toda segurança, no discurso logo após a eleição, ouviu-se do presidente a defesa veemente da reforma política como ação primordial de seu segundo mandato. E ao que se resumiu essa reforma hoje, depois de o PT ter contribuído para enterrar as propostas em tramitação no Congresso?

Ao seguinte, na concepção presidencial: ''''Fazer uma reforma política com as mesmas pessoas que estão lá, no Congresso, sendo beneficiadas pelas regras atuais, é muito mais difícil. Não me pergunte o que seria ideal. O ideal seria que o Congresso e os partidos decidam fazer uma reforma política.''''

O presidente foge, assim, de qualquer compromisso do Poder Executivo em relação à reforma e, ao mesmo tempo, se abstém de afastar a possibilidade de apoio à Constituinte exclusiva. Ao contrário, deixa uma porta aberta, como se verifica na afirmativa segundo a qual é ''''mais difícil'''' reformar a política com o Congresso tradicional.

De qualquer forma, é animadora a assertividade do repúdio de Lula à tese do terceiro mandato, inclusive porque é, ao longo da entrevista, a única afirmação peremptória no campo político.

No tocante a outras questões, o presidente preferiu tergiversar: não condenou nem absolveu os mensaleiros, não se comprometeu com o destino de Renan Calheiros e não foi definitivo quanto à candidatura presidencial única por ele defendida.

''''Acho improvável que um partido do tamanho do PT não tenha candidato, assim como é bastante provável que os outros partidos da base apresentem candidato. Mas é importante que o PT esteja disposto a conversar, que a gente construa a possibilidade de uma candidatura única.''''

E acrescentou: ''''Tudo vai depender de como o governo chegará ao final do mandato.''''

Noves fora, o roteiro da sucessão presidencial ainda é, na visão do presidente, uma obra a ser escrita sob a ótica das condições políticas a serem postas mais adiante. Por enquanto, é tudo provisório.

Na fogueira

A análise do presidente Lula sobre a oportunidade de apresentação de nomes de candidatos não soou exatamente favorável a Ciro Gomes, citado por ele em reuniões com os líderes partidários, e na própria entrevista, como um possível candidato da base aliada.

Diz Lula: ''''Quando você cita um nome com antecedência, você queima esse nome. Primeiro internamente, com os possíveis pré-candidatos. Depois, queima na base aliada, com os candidatos dos outros partidos. E, finalmente, os adversários e a imprensa colocam uma flecha direcionada para ele 24 horas por dia. Então, penso que o nome deve ser mantido sob segredo de Estado.''''

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