Nem tudo está perdido. Há tempo para os que souberem aproveitá-lo. Puxa a fila dos retardatários o presidente Lula, um aplicado convertido à máxima de discutível sabedoria do "deixa como está para ver como é que fica".
Mas não lhe falta a agudeza de antecipar a advertência às cobranças da oposição, sem muita folga para cuidar do governo com tantos embaraços a retardar os seus passos.
Cutucado pelas vaias, sacudido pela crise do apagão aéreo, com mais de duas centenas de vítimas, Lula alterna os pedidos de calma aos correligionários e adversários com o lançamento em série de projetos que dormiram o sono da irresponsabilidade. Em recado maroto pediu serenidade aos ansiosos e aconselhou que esperassem um pouco mais, até fevereiro ou março do cada vez mais próximo ano, quando os canteiros das obras do PAC estarão coloridos pelo verde da brotação dos mutirões na rede rodoviária, nos portos entupidos pela fila quilométrica dos caminhões, nas ferrovias que cortarão o país em todas as direções.
Não será fácil atender ao apelo presidencial. Em ano de eleição municipal, a madraçaria dos parlamentares viciados na semana de dois a três dias útil infla para o recesso branco das sessões do faz- de-conta de curtíssima duração, com meia dúzia de gatos pingados no plenário revezando-se no microfone para os recados ao voto. Entende-se: é a hora de paparicar os prefeitos e vereadores candidatos à reeleição e aos candidatos da sua base de sustentação nos municípios.
E, para mal dos pecadores, a ressaca que engrossa em ondas gigantescas que arrebentam na praia e arrastam a sujeira de escândalos veneráveis, sumidos por anos e meses e que se renovam para a nova temporada de depoimentos, acareações, denúncias ampliadas e a maciça cobertura da mídia.
Não tem fôlego para durar muito. Afinal, são coisas sabidas que retornam na nova etapa de longo caminho que parece não ter fim.
Não só o Congresso, com a eleição municipal à vista lutará por um espaço para mostrar serviço. A toga entrou no palco empurrada pelas críticas à sua lentidão e à evidência de que a demora nos julgamentos pavimenta a larga avenida da impunidade: rico não vai para a cadeia, escapa pelas frestas dos recursos e a lábia de bons advogados. Amanhã o Supremo Tribunal Federal (STF) começa a decidir se abre ou não o processo contra os que se emporcalharam no megaescândalo do mensalão, com o desvio do dinheiro público para a corrupção de parlamentares.
O cerco aperta em arrancos e interrupções. Em sacudidela brusca, o Ministério Público, com destacada atuação no combate à roubalheira, ingressou com cinco ações na Justiça Federal em que acusam 37 dos investigados por enriquecimento ilícito e espera reaver R$ 55 milhões que vazaram pelo valerioduto. No miolo da rapinagem brilham astros famosos, como o ex-ministro José Dirceu, o ex-senador e atual deputado José Genoino e os operadores do esquema Sílvio Pereira, Marcos Valério e Delúbio Soares.
Por enquanto ninguém está preso nem devolveu um níquel.
Como antídoto, o governo lançou o Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci), forrado com as melhores intenções de combater a violência atacando as causas sociais que a alimentam. Em ágil drible de corpo, o ministro da Justiça, Tarso Genro, advertiu que não se deve esperar por resultados a curto ou médio prazo.
É como se para o afogado nos últimos arrancos, o salva-vidas prometesse uma bóia que está sendo inflada e deve demorar algumas horas.
[ 22/08/2007 ]