Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, agosto 02, 2007

Era uma vez...

Era uma vez...

...um presidente da República que dizia não saber de nada que pudesse embaraçá-lo.


Não sabia que o apoio do PP à sua candidatura em 2002 havia sido comprado por pouco mais de R$ 6 milhões - embora estivesse no mesmo apartamento de Brasília onde alguns dos seus companheiros se ocupavam em fechar a compra. "Tudo certo", ouviu depois de um deles. Certamente não se interessou por saber como tudo fora acertado.


Não sabia que a equipe de arapongas montada com seu consentimento ainda em 1998 espionava adversários, armava para cima deles e ía além de todos os limites da irresponsabilidade.


Não sabia que o encarregado de arranjar grana para bancar as despesas de sua campanha recebia doações por debaixo dos panos e sonegava dados à Justiça Eleitoral - embora o sujeito fosse tão íntimo seu que mais tarde se hospedou na Granja doTorto, uma das residências oficiais do presidente da República.


Não sabia da ação nefasta da "sofisticada organização criminosa" que se formou em torno dele para mandar em parte do aparelho do Estado, como mais tarde denunciou o Procurador Geral da República. Na ocasião, sentiu-se traído - mas não soube apontar o nome dos traidores.


Não sabia que deputados foram pagos para votar na Câmara a favor de projetos do governo. Como não soube que o ministro da Fazenda frequentava festinhas íntimas em mansão alugada por ex-assessores envolvidos em tenebrosas transações.


Não sabia que o sigilo bancário de um caseiro havia sido violado por ordem do seu principal ministro - e quando soube, lamentou a perda do ministro e se despediu dele chamando-o de "irmãozinho".


Não sabia da iniciativa deletéria de um bando de aloprados empregados na coordenação de sua campanha à reeleição. Mas ao saber que eles haviam criado um falso dossiê contra candidatos do PSDB, apartou-se deles indignado. E deu ordens expressas à Polícia Federal para que os investigasse. A investigação terminou sem apontar culpados.


Não sabia das tentativas do irmão mais velho de fazer amigos, influenciar pessoas dentro do governo e negociar facilidades. Julgava-o tão ingênuo que sequer o advertiu face a face quando ficou sabendo de suas estripulias. Mandou recados por meio de outro irmão.


Não sabia da crise aérea antecipada por um relatório do seu primeiro ministro da Defesa ainda nos idos de março de 2003. Ouvira falar de outros idos.


É fato que mais de uma vez pediu para que se marcasse o dia e a hora do fim da crise. Mas tal lembrança foge do scripit e, portanto, é melhor esquecê-la.


Como desconhecia o que estava por vir, não liberou dinheiro a tempo de evitar o apagão aéreo que culminou com a morte de 199 pessoas no aeroporto de Congonhas.


Por não saber o que deveria, o que tinha obrigação de saber, e o que é inimaginável que não soubesse, foi feliz e bem recebido em toda parte pela clientela dos programas sociais do seu governo - e também por aqueles que preferiram dispor de um presidente mal informado a um legítimo representante da elite branca, conservadora e racista, empenhado em restabelecer antigos, carcomidos e detestáveis costumes.


Até que...


Até que um dia, para seu próprio espanto, foi faturar no Rio o patrocínio dos jogos do PAN e acabou sonoramente vaiado no Maracanã. Povo ingrato, o carioca.


O resto dessa história ainda está por ser escrito.

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