Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 11, 2007

André Petry


Os mineiros são tolos?

"Aécio Neves nunca perdeu uma votação relevante na Assembléia Legislativa de Minas. Nem no primeiro nem no segundo mandato. Dos 77 deputados, ele tem o apoio de, no mínimo, sessenta. Ganha de lavada, sempre. Agora, esperto como uma raposa, perdeu"

Os bons mineiros sabem que a esperteza, quando é excessiva, acaba comendo o próprio dono. É o que parece estar acontecendo com o governador Aécio Neves, de Minas Gerais. Ele acaba de vetar uma excrescência aprovada pela Assembléia Legislativa, que mutila a ação dos promotores estaduais e dá foro privilegiado a quase 2.000 autoridades do estado. E a Assembléia Legislativa, com maioria estrondosa, acaba de derrubar o veto. E o governador, esperto como uma raposa, acaba de dizer que lamenta a decisão dos deputados, mas, sendo um "democrata", vai respeitá-la.

Parece bonito, mas é pura esperteza.

Aécio Neves é um governador muito bem avaliado, tanto que foi reeleito com votação estonteante e seu nome é presença constante em qualquer lista de candidatos ao Palácio do Planalto em 2010. Com todo esse capital, poderia ter feito o que dele se esperava: vetar a vilania do foro privilegiado e orientar sua bancada para manter seu veto de pé. Aécio Neves, esperto como uma raposa, querendo fazer bonito para os dois lados, a opinião pública e os deputados, entregou um doce para cada um. Seu veto agrada ao eleitor mineiro. Sua inércia à derrubada do veto é mimo para deputados.

Parece esperteza que dá certo, mas ela é carnívora.

Aécio Neves nunca – repetindo: nunca – perdeu uma votação relevante na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Nem no primeiro nem no segundo mandato. Dos 77 deputados, ele tem o apoio de, no mínimo, sessenta. Ganha de lavada, sempre. Tanto que o deputado Sávio Souza Cruz, que, embora seja do PMDB, não reza pela cartilha do governador, já sugeriu trocar o nome da Casa para "Assembléia Homologativa de Minas". Agora, esperto como uma raposa, Aécio Neves perdeu: 60 contra, 9 a favor e 1 abstenção. Basta conferir quem, antes, votara pela ampliação do foro privilegiado. Na lista estão o líder do governo de Aécio (Mauri Torres), o líder do partido de Aécio (Luiz Humberto Carneiro) e o líder da maioria de Aécio (Domingos Sávio).

Com seu veto derrubado, Aécio Neves recusou-se a promulgar a lei. Caberá à própria Assembléia Legislativa fazê-lo. Aécio Neves terá direito a dizer no palanque que vetou o projeto insano duas vezes e se recusou a promulgá-lo. A esperteza é olímpica, mas a condição do sucesso é que os mineiros sejam tolos. Se estavam certos quando reelegeram Aécio Neves, tolos é que não são.

Criado no Brasil imperial, o foro privilegiado não presta para nada, a não ser para jogar lenha na fogueira da impunidade e dividir os brasileiros entre a minoria da casa-grande e a maioria da senzala. Eles e nós, em resumo. No caso mineiro, o foro antes privilegiava apenas três autoridades. Agora, na massa de quase 2.000, entra uma boiada, inclusive, é claro, os deputados estaduais.

Aécio Neves ainda tem chance de recuperar-se. Pode ir ao Supremo Tribunal Federal alegar que a lei dos deputados é inconstitucional. O procurador-geral de Justiça, Jarbas Soares Júnior, um genuíno interessado em barrar a patacoada, já anunciou que fará isso.

Se Aécio Neves for junto, comerá a esperteza.

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