editorial |
O Estado de S. Paulo |
14/2/2007 |
P ara a maioria dos leitores, o noticiário dos trâmites para a formação da equipe do segundo termo do presidente Lula consegue a proeza de ser ainda mais aborrecido do que o da disputa para a presidência da Câmara dos Deputados, antes que a ela se juntasse um anticandidato disposto a injetar na pequenez da peleja as preocupações da sociedade com os descalabros recorrentes na instituição, coroados pela tentativa do aumento salarial de 91%. Mas há uma diferença entre as duas situações, e se, não obstante isso, ambas são recebidas com alto grau de desinteresse, é porque o problema não está nem na cobertura política nem nos leitores: existe algo de muito errado nos próprios fatos. A diferença apontada é a seguinte: apesar do papel central exercido pelos titulares do Congresso, a começar da Câmara, no processo legislativo, com efeitos menos ou mais palpáveis para o cotidiano da população, o jogo político que antecede as eleições bienais no âmbito parlamentar efetivamente não é de tirar o fôlego do cidadão comum - em nenhum país, por sinal; mas, quando se trata da formação de um governo nacional, o que está em pauta é a ação do poder público na ampla variedade de áreas em que se espera dos condutores do aparelho estatal clareza de rumos e competência administrativa para que o desempenho dos respectivos setores justifique a sua (onerosa) existência. Se a presença do Estado é tida como necessária para o progresso da vida nacional em suas múltiplas dimensões, a escolha dos responsáveis diretos pela qualidade dessa presença, em cada caso, deveria atrair as atenções pelo menos das parcelas mais preparadas da coletividade. Se isso não ocorre, é porque o que transparece dessa escolha é precisamente a irrelevância objetiva dos critérios que a orientam, no lugar daqueles outros, esses sim substanciais, descartados do processo. Fossem as circunstâncias as que o interesse do País desejaria que fossem, a informação de que o presidente da República teria dito aos dirigentes do PMDB - um dos dois grandes pilares do seu esperado governo de coalizão - que nos próximos 20 dias sairá o esboço do novo Ministério poderia ser interpretada, com alguma leniência, é bem verdade, como um dado positivo. Significaria que o chefe do governo está empenhado à raiz dos cabelos em selecionar a nata dos melhores e os mais brilhantes quadros disponíveis para compor o primeiro escalão do Executivo federal e executar uma política cuidadosamente acertada, condição indispensável para que ele possa deixar o Planalto em 1º de janeiro de 2011 com o sentimento legítimo do dever cumprido. Mas o público está farto de saber que a morosidade das nomeações - a mesma das duas reformas ministeriais do primeiro mandato - nada tem que ver com excesso de zelo administrativo ou o desejo do presidente de realizar uma gestão excepcional, e tem tudo que ver com a sua imensa dificuldade de conciliar, antes de mais nada, as expectativas dos vários PMDBs governistas e satisfazer, em seguida, a gula dos demais 7 partidos da coalizão em fase de montagem. O público também sabe, à saciedade, que as tratativas para a definição do futuro Gabinete se dão sob o signo de uma conta de chegar: quantas e quais Pastas tocarão a tais ou quais agremiações. Nenhuma palavra - ou nenhuma palavra que mereça ser levada a sério - sobre a qualificação dos ministeriáveis que os chefes partidários teriam a oferecer. Em cada agremiação, a filtragem dos nomes obedece primordialmente às conveniências da caciquia e aos arranjos regionais internos ou entre as suas facções. O conceito-chave do negócio, por isso mesmo, é cota, equivalente ao QI de que falam os políticos - quem indica. E não se tem notícia de que, nos entendimentos com os seus interlocutores, o presidente venha dando prioridade ao quesito competência. Também ele parece se dedicar exclusivamente à relação aritmética entre as reivindicações dos partidos e os assentos disponíveis na Esplanada dos Ministérios. O que desanima o leitor das páginas políticas, em suma, não é nem a compreensível disputa de espaços entre as forças de sustentação do governo, mas o silêncio absoluto em relação ao que os partidos, por intermédio dos seus cotados, "pretendem fazer pela Nação", como escreveu ontem neste jornal a colunista Dora Kramer. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, fevereiro 14, 2007
O tedioso rateio da Esplanada
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