É preciso criar punições adequadas e elevar a chance de apreensão do menor que cometer um crime violento |
O ASSASSINATO de João Hélio, um menino de apenas seis anos, reacendeu o debate sobre a situação da segurança pública no Brasil e sobre o que precisa ser feito para reduzir a violência e a criminalidade. Porque um dos acusados é menor de idade, uma boa parte da discussão gerada pelo brutal episódio concentrou-se na questão da maioridade penal.
O crime violento é uma atividade de jovens. Dados americanos indicam que o envolvimento com esse tipo de crime aumenta dramaticamente durante a adolescência e atinge o seu máximo aos 18 anos. No final do século 20, os americanos entre 15 e 19 anos totalizavam 7% da população daquele país, mas constituíam 20% dos acusados por crimes violentos. Como no Brasil não deve ser diferente, a redução da violência e da criminalidade exige uma mudança no tratamento do infrator adolescente no nosso sistema judicial.
Li, nesta Folha, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria dito, a propósito do menor acusado: "A gente fica imaginando se a gente tivesse naquele lugar e pudesse fazer alguma coisa. O que faria? Certamente faríamos quase a mesma barbaridade que ele fez com aquela criança". A declaração atribuída ao presidente é particularmente absurda, mas espelha a visão de uma parte dos nossos políticos, para quem o criminoso de menos de 18 anos é apenas o resultado das péssimas condições sociais em que vive. A única solução para o crime seria resolver os problemas de pobreza e desigualdade. O fato de que a grande maioria dos nossos jovens pobres não é criminosa parece escapar a esses observadores.
Estudos empíricos demonstram que diversos fatores sociais têm influência importante na taxa de criminalidade. A criminalidade é maior nos países com mais desigualdade. O aumento da escolaridade entre os jovens do sexo masculino está associado a uma menor probabilidade de participação em atividades criminais. James Heckman, o Prêmio Nobel e professor de economia na Universidade de Chicago, tem documentado o papel da educação pré-escolar na redução da taxa de criminalidade. Diminuir a criminalidade é mais uma razão para políticas focadas em melhorar o futuro dos mais pobres. Mas os efeitos de uma melhor política social serão sentidos principalmente no longo prazo, e é urgente contemplar outras medidas com maior impacto imediato.
E, ao contrário do que muitos pensam no Brasil, há forte documentação empírica de que o criminoso adolescente responde a um aumento na probabilidade de apreensão e ao tipo de pena a que está sujeito.
Nos Estados Unidos, a punição por crimes violentos é em geral determinada por legislação de âmbito estadual. Há Estados em que os menores de 18 anos recebem penas muito mais suaves do que os adultos, enquanto em outros não há praticamente diferença. Steve Levitt, o autor de "Freakonomics" e professor na Universidade de Chicago, calculou que em cada um desses dois grupos de Estados os adolescentes de 15 anos cometem em média 30% menos crimes violentos dos que os de 16 anos. Também em cada um desses grupos de Estados os jovens de 16 anos cometem 20% menos crimes violentos do que aqueles com 17 anos.
Essa é, infelizmente, a progressão usual do crime durante a adolescência, que já mencionei. Há, no entanto, uma grande diferença entre os dois grupos de Estados quando se compara o grau de criminalidade entre os jovens de 17 e de 18 anos. Nos Estados em que o tratamento aos menores é leniente em comparação com o tratamento aos adultos, os adolescentes de 17 anos cometem crimes na mesma proporção daqueles com 18 anos, enquanto onde o tratamento de menores é mais severo os jovens com 17 anos cometem 20% menos crimes do que os seus correspondentes com 18 anos.
Evidentemente, a maior severidade das penas em alguns Estados age como instrumento de dissuasão para os menores. Nesse sentido, os jovens não são diferentes dos seus colegas mais velhos e levam em conta as possíveis conseqüências de seus atos para a sua futura liberdade.
A questão da idade de maioridade é de certa forma secundária. O que é preciso fazer agora é criar punições adequadas e aumentar substancialmente as chances de apreensão e encarceramento dos menores que cometerem um crime violento.