Depois do futebol, das mulatas seminuas e das chacinas gerais, o Brasil está sendo conhecido no mundo pela capacidade de produzir combustíveis renováveis. É notável o interesse da mídia européia e norte-americana pela iniciativa, especialmente em razão do forte apelo ambiental nestes tempos de torrefação climática. De fato, demos um grande salto desde os anos 1960, quando alternativas energéticas em relação ao petróleo começaram a ser projetadas e dos anos 1980, quando o plano saiu do papel com o pro-álcool. O Brasil se tornou vanguardista no setor de biocombustíveis, está pronto para se firmar neste novo mercado mundial, mas além da fotossíntese, da abundância de água e do solo generoso precisa de pragmatismo para não se tornar, de novo, uma monocultura de resultados.
Ainda que o presidente George W. Bush tenha entrado na fase de "pato manco", a visita ao Brasil pode se converter em uma guinada nas relações entre os dois países. A melhor idéia me parece ser a de trocar o viés ameríndio do diálogo sul-sul pela realização de bons negócios. O que se recuou nas relações bilaterais com a rejeição de chofre da Alca pode ser um terreno recuperado com o mercado de etanol e do biodiesel. É uma oportunidade de ouro, no entanto não me parece vantajoso a longo prazo se confirmar as palavras do brasilianista da Universidade de Columbia, Tom Trebat, segundo as quais o país poderá se tornar a Arábia Saudita do etanol.
O Brasil precisa obter maiores vantagens da sua posição privilegiada de líder na produção de biocombustíveis quando for assinar um tratado neste sentido com os EUA. A idéia é ir além de mero fornecedor de uma commodity e receber compensações financeiras pela capacidade tecnológica adquirida. Por mais que o presidente Lula queira atribuir a si mesmo a paternidade do programa de biocombustíveis, a iniciativa demandou quatro décadas de esforço e chegou a hora da colheita. Não há queridismos quando se fala de negócios. Os EUA não agem sob emoção ao defender suas patentes de medicamentos para soropositivos ou impor regras draconianas para utilizar a base de Alcântara.
Não vejo sinal positivo nesta imagem da nova Arábia Saudita. O Brasil não pode se reduzir ao papel de plantation da aldeia global. Já fizemos isso e deu no que deu com os ciclos da cana de açúcar, do café e da borracha. Veja que a vantagem tecnológica de hoje pode ser reduzida a nada em menos de uma década. No começo do século 17, o Brasil era vanguardista na produção de açúcar, então uma especiaria na Europa, até o holandês desenvolver o produto nas Antilhas. Depois, temos de pôr na balança o impacto que a expansão dos canaviais irá causar na produção de alimentos. O Brasil ainda não teve uma explosão social porque a comida ainda é muito barata. Fazer o etanol ao custo do desabastecimento ou do aumento da carestia é algo irresponsável.
Pode parecer lindo o mar de canavial ou de mamona a compor a paisagem de uma terra em que se plantando dá, como mencionaria um Policarpo Quaresma, mas não é isso que interessa. Se eles querem novas bases de relação comercial a partir do programa de biocombustíveis que cedam na questão tarifária, que apresentem um programa consistente de investimento em infra-estrutura no ciclo de produção do etanol, que façam inversões decisivas no setor de pesquisa e desenvolvimento e que assumam os custos de compensação ambiental pelos impactos a serem causados pelo programa. Só assim vamos saber se os EUA querem mesmo um parceiro confiável e capaz, como mencionou Mr. Trebat, ou apenas nos transformar em um imenso e desalmado canavial.
Entrevista:O Estado inteligente
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