Em Notas sobre um Escândalo, Judi Dench
e Cate Blanchett praticam a franqueza
na sua (extrema) forma britânica
Isabela Boscov
Divulgação |
Cate e Judi, como a sonsa Sheba e a cobiçosa Barbara: dispostas a tudo |
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Em Notas sobre um Escândalo (Notes on a Scandal, Inglaterra, 2006), desde sexta-feira em cartaz no país, Judi Dench subtrai todos os aspectos ligeiros e espirituosos que habitualmente imprime às suas personagens para interpretar Barbara Covett, professora de uma escola pública de Londres, solteirona, reprimida e intolerante – e também uma homossexual enrustida, com a cabeça cheia de fantasias românticas. Barbara escreve um diário no qual destila, todas as noites, observações crudelíssimas sobre os colegas de trabalho. Inclusive sobre Sheba (Cate Blanchett), a sílfide loira e meio riponga que começa a dar aulas de arte na mesma escola. Barbara escarnece das boas intenções da novata (ela é do tipo que trabalha não porque precise, mas porque quer "fazer alguma diferença"), ri da maneira como homens que não têm a menor chance tentam se aproximar dela e se diverte com a falta de autoridade da moça perante os estudantes. Até o dia em que Sheba dá atenção a ela. Aí a paixão é fulminante – mas nem de longe correspondida. De tanto andar nos calcanhares de Sheba, Barbara descobre que ela está tendo um caso com um aluno. E, depois de uma breve confrontação, na qual se dá conta da confusão da amiga ("ele vai fazer 16 anos em maio", e "é muito maduro", diz ela), Barbara enxerga a sua grande oportunidade: enquanto posar de confidente de Sheba e de sua grande aliada no propósito de evitar que o escândalo estoure, terá franqueado o acesso ao seu objeto de desejo. E aí, imagina, como uma adolescente sonhando com o príncipe encantado, terá Sheba inteira para si.
Notas sobre um Escândalo é adaptado de um romance de sucesso da inglesa Zoë Heller – e muito bem adaptado, pelo veterano diretor de teatro e televisão Richard Eyre e pelo roteirista Patrick Marber (indicado ao Oscar, juntamente com a música de Philip Glass e os desempenhos de Judi e Cate). A dupla não apenas muda o desfecho, tornando-o ainda mais venenoso, como descarta todas as subtramas. O que interessa a eles é apenas o essencial: as relações predatórias protagonizadas por Sheba e por Barbara, que diretor e roteirista tratam num admirável ritmo de suspense e em 92 minutos de economia exemplar. Como em todo drama inglês, esta é primeiro uma história de classes sociais e de aspirações sepultadas. E, no momento em que atinge seu ponto crítico, passa a ser também uma demonstração de uma característica – a franqueza – que, praticada à moda britânica, deixa no chinelo as contrapartidas de outras nacionalidades. Mais importante, porém, é o que Notas mais uma vez confirma: para atrizes dispostas a tudo, nunca há de faltar trabalho. Bom trabalho.