RIO DE JANEIRO - Um roteiro que reúna 60 mil personagens em 14 horas de espetáculo traz consigo um risco enorme de dar errado. A confusão é tamanha que os personagens passam em número o total de assistentes presentes, uma coisa estapafúrdia, se essa audiência não fosse também essencial para o sucesso do espetáculo.
Sua organização e financiamento, mais do que peculiar, é uma zona de sombra. Há uma concepção artística geral -muitíssimas vezes errada, com enredos frankstein- em que se encaixam obras artesanais de costureiros e artistas plásticos intuitivos e pragmáticos.
A Prefeitura do Rio subvenciona as escolas, mas, numa operação típica de bêbado de Carnaval, consegue tomar prejuízo num espetáculo em que todos os ingressos são vendidos, que tem os direitos de TV bem remunerados e é um produto típico de exportação. Dizem os jornais que, dos R$ 7 milhões que a Beija-Flor gastou para ir à avenida, o "patrono" Anizio Abrão David colocou a metade do próprio bolso.
Quer dizer que quem ganha dinheiro no Carnaval é o Zé Pereira? Seria divertido uma CPI em que fossem convocados a depor Arlequim, Pierrô e Colombina e o Pirata da Perna de Pau para explicar os desvios do Carnaval. Deixaria de ser uma metáfora dizer que até as CPIs acabam em samba.
Imagine os nobres deputados quebrando os sigilos fiscal, bancário e telefônico para descobrir que o pobre do Zé Pereira é só um sapateiro português do fim do século 19, cujo pecado maior era animar a folia nas ruas ao som de zabumbas e tambores e que tinha até nome e sobrenome (José Nogueira de Azevedo Paredes). Restará ao relatório final da egrégia CPI absolvê-lo como fez com a turma do mensalão, cantando em condão: "Viva o Zé Pereira, pois que a ninguém faz mal. Viva a pagodeira dos dias de Carnaval".
Entrevista:O Estado inteligente
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