Como o carioca André Esteves se tornou
o novo Midas do mercado financeiro brasileiro
Cíntia Borsato
Divulgação |
Esteves: ele saiu das salas de computadores para os salões do poder |
O carioca André Esteves, diretor-presidente na América Latina do banco suíço UBS, tem 38 anos e é bilionário. Juntos, esses dois atributos lhe conferem um status invulgar no capitalismo brasileiro. E também no mundial: ele poderá estrear no próximo ranking anual dos mais ricos do planeta, elaborado pela revista americana Forbes. Para ser mais exato, seu patrimônio pessoal, calculado com base no valor de mercado de suas ações e títulos, situa-se numa faixa entre 1,1 bilhão e 1,4 bilhão de dólares. Dos 793 nomes que compuseram a edição de 2006 da Forbes, apenas 24 eram tão ou mais jovens que Esteves. Destes, dois tinham nacionalidade brasileira: Henrique Constantino, 35 anos, e Constantino de Oliveira Júnior, 38. Embora talentosos, ambos contaram com um empurrãozinho familiar: são os filhos mais novos do fundador da Gol, Constantino de Oliveira.
Esteves, ao contrário, só deve seu êxito ao talento pessoal. Analista de sistemas criado na Tijuca, bairro de classe média da Zona Norte do Rio de Janeiro, ele ergueu sua vida profissional dentro do Banco Pactual, no qual ingressou como estagiário, em 1989, com a modesta incumbência de manter os computadores funcionando enquanto os operadores ganhavam dinheiro. Em 1990, foi promovido a operador. Alguns anos depois virou sócio minoritário. Em 1999, liderou o traumático levante societário que forçou a saída do fundador do Pactual, Luiz Cezar Fernandes. Esteves mostrou a frieza que o caracteriza. Endividado no plano pessoal, Fernandes teve de ceder o controle do banco. Esteves condicionou novos empréstimos a Fernandes à sua saída do Pactual. Numa entrevista recente, Fernandes resumiu sua opinião sobre o ex-empregado: "Sempre tive consciência de que Esteves venderia a mãe para ter o poder".
Quando Fernandes deixou o Pactual, muitos duvidaram que o banco sobreviveria. Mas a instituição floresceu. Em 1999, geria 2,9 bilhões de reais de recursos de terceiros. Ao ser vendido ao UBS, em maio do ano passado, tinha ativos superiores a 40 bilhões de reais. Qual o segredo para essa multiplicação impressionante? Enquanto operadores tradicionais de mercado se limitavam a especular com títulos do governo, juros e câmbio, Esteves percebeu que as empresas brasileiras passavam por uma revolução. Mais produtivas e transparentes, estavam maduras para receber recursos de acionistas privados. Só faltava um banqueiro capaz de unir as duas pontas. Foi o que ele fez, antes de todos. Coordenou a abertura de capital de companhias como Natura, TAM, Datasul, Embraer e Gol. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, ele resumiu esse momento da economia: "É uma revolução do capitalismo brasileiro. Isso gera tudo: renda, divisas, tributos, empregos e uma dinâmica empresarial que não víamos havia muito tempo".
Além do talento financeiro, Esteves desenvolveu habilidades políticas. Desde que o PT chegou ao Planalto, passou a mover-se com desenvoltura nos círculos do poder. Numa economia espremida pelo Estado, percebeu que o contato com figuras-chave da República lhe abriria portas. Em 2003, aproximou-se do então ministro da Fazenda Antonio Palocci e de seu chefe-de-gabinete, Juscelino Dourado. Ficou sabendo por eles que, para dinamizar o mercado de capitais no Brasil, o governo "teria todo o interesse" em atrair um grande banco estrangeiro de investimento. Ele viu nisso uma oportunidade e tanto. Foi a Nova York e propôs parceria ao americano Goldman Sachs, que aceitou comprar parte do Pactual desde que Esteves ficasse no comando. Tudo com a bênção do governo. Só havia um problema. O banqueiro respondia a um processo administrativo por operações irregulares realizadas em 1999 e corria o risco de perder sua habilitação para operar no mercado. A fim de se livrar da pendência, usou de sua proximidade com Palocci. "Nesse período, eles se falavam dezenas de vezes por dia", conta uma ex-funcionária do ministério. Essas conversas permitiram a Esteves acesso aos membros do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, órgão do Ministério da Fazenda. Conversa vai, conversa vem, Esteves recebeu apenas uma advertência. Com isso, ele ficou livre para negociar com o Goldman Sachs. Mas o banco americano, por razões nebulosas, desistiu da compra do Pactual. O suíço UBS entrou na jogada. Ofereceu condições ainda mais vantajosas e levou o Pactual por 2,6 bilhões de dólares – um terço disso irá somar-se ao patrimônio que Esteves já tinha acumulado. E ele ainda se manteve no cargo de direção da nova instituição criada com a venda.
Casado, três filhos, ele hoje se divide entre São Paulo e Rio de Janeiro. Na cidade natal, mora em um apartamento de 730 metros quadrados, na Avenida Vieira Souto, avaliado em 7 milhões de dólares. Como todo rico de trajetória meteórica, começou a colecionar obras de arte (há quem afirme que Lichtenstein é um dos seus preferidos) e a apreciar bons vinhos. Quanto aos novos negócios, Esteves anda animado com as perspectivas do setor sucroalcooleiro. Outro ramo que o entusiasma é o de mídia. Isto é, revistas, televisão e sites. Estudos de sua equipe mostram que os ativos nacionais do setor estão subavaliados. Para um homem atento como ele, oportunidades de enriquecer nunca faltam – e também as de enriquecer os outros, é claro.