O Globo |
22/2/2007 |
Nesses dias de carnaval, dois fatos isolados, e separados pela distância, colocaram em realce o que pode vir a ser fundamental para o futuro político que já está se armando com vistas à corrida sucessória. Em uma conversa com políticos em Brasília, ao ouvir de um tucano um comentário qualquer que começava com a afirmação "nós da oposição", o presidente Lula o interrompeu e, cheio de simpatia, fez o reparo: "Eu não considero vocês de oposição. Vocês são da situação, só que um pouquinho mais intransigentes". Não há registro de nenhuma reação contrária. Em outro episódio, durante o desfile de escolas de samba no Rio, ao ver a confraternização entre políticos da oposição e do PT, o ministro do Supremo Marco Aurélio de Mello comentou: "No fundo, são todos da mesma tribo". Os dois comentários sugerem como realidade uma impossibilidade política, a união do PT com o PSDB. Mas, mesmo não sendo viável um acordo, há interesses que ora aproximam, ora separam petistas e tucanos, e esses movimentos estão em andamento neste momento. A união entre os dois partidos já foi um projeto que andou na cabeça de muita gente boa, a começar pelos seus principais líderes, o presidente Lula e o ex-presidente Fernando Henrique. Fora o fato histórico de que os dois estiveram juntos em momentos políticos importantes, a começar pela primeira campanha eleitoral de Fernando Henrique, que teve Lula como distribuidor de panfletos, até estourarem os escândalos do mensalão, em 2005, o ambiente político era propício a uma aproximação das duas forças políticas que polarizam a disputa pelo poder no país há quase 20 anos. O ex-presidente Fernando Henrique, que foi subindo o tom de suas críticas até se transformar de adversário em inimigo político de Lula, esperava que a transição de poder mais pacífica e democrática que se fez neste país após a vitória de Lula em 2002 levasse a um governo de coalizão. O presidente Lula, mesmo tendo cunhado a expressão "herança maldita" para justificar as dificuldades que enfrentava no seu primeiro mandato, ainda em 2004 mantinha conversações políticas com vistas a uma união dos dois grupos, que têm a mesma origem - os movimentos de esquerda ligados à Igreja e à intelectualidade paulista - e poderiam ter uma ação política comum se não disputassem a mesma fatia de poder no maior estado do país. Na verdade, as brigas paulistas são a origem da impossibilidade de acordo político entre PT e PSDB, e é nesse núcleo paulista do PT que está hoje a maior dificuldade para uma definição do Ministério do segundo mandato de Lula. O Campo Majoritário, que já foi a base de apoio que manteve Lula no comando do PT e o levou à Presidência da República em 2002, hoje representa uma questão política a ser ultrapassada, embora não signifique uma dissidência do governo. Enfraquecer o Campo Majoritário, retirando do ex-ministro José Dirceu o poder político que ainda detém, é fundamental para o projeto pessoal de Lula, que no momento se afasta cada vez mais do PT à medida que se aproxima de um governo de coalizão ampla, que lhe permita fazer uma gestão que fique registrada na História como a do desenvolvimento econômico e social, que o levaria a aspirar a um terceiro mandato ou, hipótese mais provável, a volta à Presidência em 2014. Para que isso aconteça, duas coisas não podem acontecer: a reeleição continuar existindo e o PT fazer o seu sucessor. A começar pela presidência da Câmara, Lula queria fortalecer a coalizão partidária que apóia seu governo sem abrir muito espaço para o PT, e por isso apoiou Aldo Rebelo, do PCdoB, e engoliu à força a candidatura Chinaglia, afinal vitoriosa. O Campo Majoritário está impondo suas pretensões políticas uma a uma, nessa queda de braço silenciosa com o Palácio do Planalto. Se emplacar a ex-prefeita Marta Suplicy em um ministério de ponta da área social, estará sinalizando suas intenções para 2010. Enquanto isso, no lado do PSDB, há movimentos de aproximação entre setores do PT refratários ao Campo Majoritário, tanto em Minas quanto em São Paulo, os dois estados governados por tucanos potencialmente candidatos à sucessão de Lula. A relação de Aécio Neves com o Palácio do Planalto na Era Lula, e com a Prefeitura de Belo Horizonte sob o comando do petista moderado Fernando Pimentel, é um pólo político importante nessa equação. Pimentel é candidato ao governo de Minas em 2010, e, assim como nunca disputou a liderança com Aécio, aguarda uma contrapartida em 2010. Ao mesmo tempo, ter Minas unida em torno de sua candidatura à Presidência é um trunfo para Aécio. Em São Paulo, o governador José Serra mantém uma aproximação administrativa e política com parcela do PT, assim como já agiu quando foi ministro da Saúde. Alvo de ataques do Campo Majoritário, cujo último episódio conhecido foi o caso do dossiê na eleição para o governo paulista, Serra mantém bons contatos com o próprio Lula. O que não impediu que parte do PSDB apoiasse Chinaglia no segundo turno da disputa na Câmara, desta vez para não fortalecer demais o lulismo. Na arena governista, a disputa aberta é entre o PT, que pretende ter um candidato à sucessão mesmo que seja para perder, e a força política cada vez mais autônoma de Lula. O fenômeno do lulismo poderá levar a que a base aliada venha a ter dois candidatos à sucessão de Lula, assim como teve dois candidatos à presidência da Câmara. Para os tucanos, a melhor opção seria que Lula estivesse fora da disputa, sem interesse direto em uma vitória de seu grupo, preparando-se para retornar ao poder em 2014. Com ou sem reeleição, é melhor tanto para Aécio quanto para Serra que Lula seja eventualmente adversário apenas em 2014, quando os tucanos esperam disputar a Presidência estand |
Entrevista:O Estado inteligente
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