Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

A ‘greve branca’ do PCC


editorial
O Estado de S. Paulo
23/2/2007

É no mínimo insólita a “greve branca” coordenada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) no sistema penitenciário paulista, para protestar contra a “opressão carcerária”. Além de se recusarem a deixar as celas para ir para o banho, comparecer a audiências judiciais, trabalhar nas oficinas e realizar pequenas tarefas dentro das unidades, como limpeza e distribuição de comida, os presos encaminharam uma carta à primeira-dama Marisa Silva, na qual ameaçam “fazer algo” caso não sejam imediatamente ouvidos pelo governo federal.

Iniciada na quarta-feira, a greve atingiu 80 das 144 unidades prisionais do Estado de São Paulo, que abrigam 132 mil pessoas. O protesto começou a ser planejado há quase um mês na Penitenciária 2 (P-2) de Presidente Venceslau, onde 729 integrantes do PCC cumprem pena, e a convocação se deu por telefonemas feitos por celulares dentro das celas e por mensagens passadas, nos dias de visitas, a familiares que as retransmitiram de prisão em prisão.

O protesto é mais uma demonstração de força do PCC e mostra a inversão de valores hoje reinante no sistema penitenciário brasileiro. A greve foi deflagrada em protesto contra a transferência, para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), de três presos da facção criminosa flagrados com 18 celulares na P-2 e contra a suspensão das visitas de familiares na unidade por determinação da Secretaria da Administração Penitenciária.

Embora na maioria dos países desenvolvidos a utilização de telefones celulares dentro de prisões seja há muito tempo tipificada como crime e as visitas de parentes sejam autorizadas de acordo com critérios bastante rigorosos, os líderes do PCC não só classificaram como “opressivas” as medidas tomadas pelas autoridades estaduais para manter a ordem, como ainda tentaram obter apoio político de entidades de defesa dos direitos humanos. Ao menos desta vez, essas entidades tiveram o bom senso de não se deixar usar por delinqüentes espertos e de alta periculosidade, que se valem de palavras de ordem politicamente corretas para tentar dar um verniz ideológico aos seus ataques e afrontas às instituições governamentais.

A audácia desses criminosos pode ser vista em cada um dos detalhes da “greve branca”. Ao se recusarem a atender a comparecer a audiências previamente marcadas, eles têm por objetivo tumultuar a tramitação dos processos e criar pretextos para que seus advogados possam interpor recursos protelatórios, adiando indefinidamente o julgamento de seus crimes.

Ao reclamarem que seus parentes têm de passar por “revistas humilhantes”, o que querem é constranger as autoridades carcerárias e continuar fazendo das visitas uma via de contrabando de celulares, drogas e armas para dentro das prisões. E, ao tentar envolver a primeira-dama Marisa Silva, que não tem qualquer função executiva, o que o PCC pretende é envolver o governo federal numa questão de competência específica dos governos estaduais, aos quais cabe o controle do sistema prisional. Trocando em miúdos, o que a facção criminosa quer é jogar o PT contra o PSDB e se aproveitar do confronto entre as duas agremiações.

As autoridades do Executivo e do Judiciário não podem se deixar levar pelas artimanhas políticas e pelas chicanas jurídicas do PCC. Quando um réu deixa de comparecer por decisão própria a uma audiência, nada impede que seja tratado como revel. Ou seja, apesar de ter o direito de ser ouvido e de apresentar suas razões, ele abdica dessa prerrogativa quando, conscientemente, deixa de atender a uma convocação judicial. Portanto, diante da acintosa “greve branca” dos presos de 80 das 144 unidades do sistema prisional estadual, os juízes criminais precisam ser rigorosos no cumprimento dos prazos, para evitar a desmoralização da própria Justiça. O mesmo ocorre com as autoridades carcerárias. Se forem lenientes nas revistas de familiares nos dias de visitas, elas também estarão se desmoralizando perante a população carcerária.

Na realidade, o que se espera do poder público, nessa greve promovida pela facção criminosa, é que cumpra rigorosamente o que é previsto pela legislação.

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