Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Míriam Leitão - Inflação dos outros



PAN ORAMA ECONÔMICO
O Globo
22/2/2007

Passada a Quarta-Feira de Cinzas, é hora de o ano finalmente começar no Brasil, afinal o mundo continua girando. Ontem, notícias de elevação dos juros no Japão e de uma inflação maior que o esperado nos Estados Unidos atraíram as atenções do mercado. A Bovespa, mesmo num dia normalmente morno, voltou a bater recorde.

A inflação ao consumidor americana, em janeiro, fechou em 0,2%, com o núcleo em 0,3%. Foi uma surpresa para todo o mercado, que esperava um número mais baixo. O índice contra o mesmo mês de 2006 ficou em 2,7%, o que é considerado ainda alto por muitos economistas. O mundo inteiro tem acompanhado de olhos bem abertos o que se passa na inflação americana. O medo é de que ela acabe pressionando os juros a ficarem altos por mais tempo e que isso faça com que o crescimento do país diminua. Os Estados Unidos continuam sendo a grande potência econômica mundial. Caso cresçam menos, isso tem impacto em todas as economias e, claro, também na brasileira.

Mas ainda que o resultado tenha vindo acima do esperado, o economista do WestLB Roberto Padovani acha que a inflação americana não é um problema, nem chegou a assustar muito:

- Quando vi o dado de aumento dos juros do Japão, fiquei preocupado, mas depois acho que os mercados reagiram bem, dando mais importância à notícia da inflação americana, que veio dentro do cenário positivo. No acumulado em 12 meses, ela está em 2% - comenta.

Padovani ressalta que o índice de preços no atacado nos EUA, que vem caindo ultimamente, tem impacto rápido sobre os preços ao consumidor. Ou seja: a inflação ao consumidor tende, em breve, a cair também.

A última sinalização dada por Ben Bernanke, presidente do Fed, era de que os juros ficariam em torno de 5,25% por um bom tempo. Desde junho de 2006 que eles não sobem. A ata do Fomc, divulgada ontem, indicou que essa posição de cautela permanece. O mercado, de um modo geral, contava que a queda dos juros lá pudesse vir ainda no terceiro trimestre deste ano, porém, diante do resultado da inflação de janeiro, a previsão de queda ficou para o último trimestre; ou apenas para 2008.

A maior pressão continua vindo dos aluguéis, que compõem boa parte do índice. Nos Estados Unidos, não há uma meta de inflação explícita, como acontece no Brasil, mas sabe-se que consideram até 2% ao ano um bom patamar.

Inflação e juros mais altos não são exclusividade dos EUA. Outras economias fortes também estão em processo de aperto monetário, como é o caso da Inglaterra e da Zona do Euro. A Zona do Euro cresceu em 2006 mais que se esperava. Os 2,7% do ano passado deixaram os economistas atentos para possíveis pressões nos preços. Uma reportagem do "Financial Times" diz que o crescimento lá deve continuar. Ela cita uma pesquisa mostrando que os industriais europeus estão mais otimistas: acreditam que aumentarão as vendas, o lucro e os empregos. Mas o jornal também afirma que "a combinação entre aumento forte de vendas e preços subindo daria ao banco central europeu boas razões para continuar a elevar os juros". A taxa na Zona do Euro estava em 2% até o fim de 2005; de lá para cá, teve seis altas de 0,25 ponto percentual e, no último mês de dezembro, chegou aos 3,5%. O Banco Dresdner acredita que ela pode subir mais 0,25 pp ainda no primeiro trimestre.

- O maior risco na Europa é por eles serem grandes importadores de petróleo, que é muito volátil e sempre pode pressionar os preços - diz Alexandre Póvoa, do Banco Modal.

Na Inglaterra, o banco central deu um último aumento para os juros no mês passado, o que levou a taxa para os 5,25%, mesmo percentual americano.

A elevação de ontem dos juros japoneses para 0,5% - que chega a ser curioso perto dos nossos 13% - também surpreendeu o mercado. Mas, apesar de ser mais uma a acontecer num país de economia forte, é de outra natureza, explicam os economistas. O Japão, por anos, teve juro zero e deflação. Muitas vezes, o mercado captou lá para aplicar em países com juros mais altos.

- O único impacto que poderia ter na economia mundial é o financeiro. Os juros lá estão agora voltando a um nível normal - afirma Póvoa.

- Isso poderia tornar mais caro o financiamento de capital para mercados emergentes, mas como ninguém espera uma puxada forte dos juros japoneses, não vejo risco - diz Padovani.

A inflação ao consumidor no Japão não é um problema. Para se ter uma idéia, ela fechou o ano de 2006 em 0,2%! A maior preocupação do banco central japonês é com o iene mais fraco e o preço dos ativos. Com os juros baixos há tanto tempo, há papéis na bolsa que ficaram muito valorizados e o temor é que se tenha formado uma bolha.

Se os juros continuarem subindo nas grandes economias, isso pode significar um período de menor liquidez e menor crescimento no mundo, mas ninguém mais acha que haverá uma queda abrupta na economia mundial.

- O maior medo é que os Estados Unidos subam mais os juros, pois eles são ainda a locomotiva do mundo. Se os juros ficarem altos por muito tempo, isso pode atrapalhar a economia de todos os países - conclui Póvoa.

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