Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 24, 2007

DORA KRAMER O semeador de ventania


O presidente Luiz Inácio da Silva resolveu comprar brigas e disseminar a discórdia entre os partidos de sua base de apoio, atingindo principalmente os dois principais, PT e PMDB.

Em poucas horas, na quinta-feira, conseguiu intrigar um com o outro e ainda usar o governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, como menino de recados.

Na semana passada, Lula havia sinalizado ao PT que estava tudo certo para a nomeação de Marta Suplicy como ministra das Cidades ou da Educação.

Com o PMDB fez mais que emitir sinais, foi taxativo ao presidente e aos líderes do partido no Senado e na Câmara, quanto ao prazo da reforma: final de fevereiro. Além disso, garantiu que não se envolveria em questões internas, como a escolha do próximo presidente do PMDB.

Pois o governador de Pernambuco, ministro da Ciência e Tecnologia a maior parte do primeiro mandato de Lula, saiu de uma conversa de três horas com o presidente dizendo ter ouvido dele exatamente o contrário: que estava difícil “encaixar” Marta no ministério e que a reforma só sai depois da decisão sobre o comando do PMDB, na segunda quinzena de março.

Jovem, Eduardo Campos não é ingênuo. Não inventou nada nem deu entrevistas à saída do encontro reproduzindo aleivosias que lhe vinham à cabeça pelo simples prazer de futricar. Ninguém com um mínimo de responsabilidade e experiência sai de conversa com o presidente da República contrariando os interesses dele.

Só há duas hipóteses: ou o governador reproduziu o que ouviu do presidente ou disse o que o presidente lhe pediu que dissesse.

Diante de tanta contradição e perfídia, petistas e pemedebistas fizeram o previsto e foram conferir as informações no Palácio do Planalto. Ali não se desmentiu categoricamente o governador, mas se deu a entender que ele não tinha sido fiel ao pensamento presidencial.

Resultado: Eduardo Campos passou de menino de recados a intrigante, fofoqueiro e conspirador.

Em poucas horas, um governador e presidente de partido foi desmoralizado e os dois maiores sócios do governo no Congresso ficaram sem chão sob os pés. Isso sem contar o potencial de risco contido numa provocação a Marta Suplicy, hoje o único nome do PT paulista em condições de disputar uma eleição majoritária com chance.

A ex-prefeita ficou forte assim por exclusão, depois que todos os petistas paulistas credenciados a concorrer - Antonio Palocci, José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e Aloizio Mercadante - foram derrubados por escândalos, do mensalão ao dossiê.

Em tese, não deveria ser do interesse do presidente brigar com esse pessoal. Assalta, então, aos espíritos a dúvida: por que faz isso?

Não dá para entender e, ao que parece não existe nenhuma razão tática. O presidente simplesmente não gostaria de fazer mudança alguma, prefere tocar as coisas como protagonista absoluto, vai embromando os partidos até quando der, a cada hora com uma justificativa diferente, sem explicar direito o que está acontecendo, até para dar a impressão de que alguma coisa acontece.

Como a arte da tapeação é muito bem aceita entre nós, convencionou-se que o inteligente e bem informado deve atribuir os sucessivos adiamentos da reforma ministerial e os repetidos sinais contraditórios emitidos pelo Palácio do Planalto à argúcia do presidente Lula.

Diz-se que ele se inspira em Maquiavel, que divide para reinar, que está armando a equipe com estratégia cirúrgica e ele mesmo informa que está “bolando” uma “coisa nova” para o governo.

De novidade, até agora só o que se viu foi uma articulação política inteiramente desarticulada, o governo todo parado, ministros fazendo e desfazendo malas e pretextos para postergações sendo apresentados como questões de Estado.

Lula precisaria ser um presidente muito fraco - e não é o caso - para se ver realmente diante de um dilema para “encaixar” Marta Suplicy aqui ou ali. Presidente põe ministro onde quiser, ainda mais quando tem mais de 30 pastas à disposição e nenhum constrangimento de criar quantas mais forem necessárias.

A alegação sobre a espera da decisão dentro do PMDB soa ainda mais inverossímil. Os postulantes, Michel Temer e Nelson Jobim, além de serem ambos aliados do presidente, não têm poder de unir de verdade os pemedebistas. Estes já chegaram ao limite da unidade que poderiam conseguir. Tal condição se dá mediante a expectativa pelos cargos, nunca em torno deste ou daquele presidente.

Tanto faz que Jobim seja escolhido presidente do PMDB, assim como tanto fez Michel Temer ter presidido o partido oficialmente como oposicionista. O PMDB não atrapalhou e ajudou no fundamental, tirando Anthony Garotinho da parada presidencial.

Os otimistas têm todo o direito de invocar Maquiavel para envernizar os movimentos presidenciais, mas os realistas já começam a antever a aproximação da tempestade, baseados no velho lema caseiro: a esperteza, quando é muita, cresce, vira bicho e come o dono.

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