Artigo - DEMÓSTENES TORRES |
O Globo |
23/2/2007 |
O Palácio do Planalto decretou que não vai haver mudança na idade penal. A medida visa garantir o direito juvenil à delinqüência. O veto presidencial à iniciativa de alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente é uma daquelas providências que pensam nas próximas gerações, quando todos estarão devidamente educados e a violência estará dissolvida pelos benefícios das bolsas governamentais. Seria de reconhecer a preocupação do presidente de que a alteração pode "desproteger os adolescentes" caso não estivesse sendo sonegado que os jovens brasileiros são os que mais matam e mais morrem no País. De acordo com o Mapa da Violência de 2006, nos últimos 25 anos, o índice de homicídios na faixa etária dos 14 aos 25 anos subiu de 30 para 51,7 para cada 100 mil habitantes. Neste quesito, só perdemos para a Colômbia e a Venezuela, dois países não recomendados quando o assunto é criminalidade. A vontade do presidente será feita, e o Congresso Nacional já mudou o tom da conversa. Aquele espasmo de indignação pela morte do garoto João Hélio Fernandes passou. Bastaram o minuto de silêncio no Maracanã e os discursos parlamentares. A justificativa básica é de que não se pode fazer legislação do pânico. A tragédia da hora não pode motivar a evolução política do debate sobre segurança pública como se fosse um fato isolado, quando a criminalidade violenta é a regra. Outra premissa temerária é a de que não se pode legislar no calor dos acontecimentos porque o tempo está a nosso favor e, assim, podemos esperar pelas "promessas estruturantes". O presidente Lula garantiu dias atrás que um choque da cidadania iria fazer o crime acabar por si só na Favela da Rocinha, mas é preciso ter paciência até que as causas sociais da violência sejam eliminadas. No Brasil, tornou-se lugar-comum encontrar para a segurança pública soluções que estão sempre fora do alcance desta finalidade pública do Estado. Um exemplo é a educação. É claro que a escola em tempo integral é uma política preventiva do delito, no entanto, é uma afronta tratar o péssimo desempenho da escola pública como razão motivadora dos cinco desqualificados indivíduos que decidiram ir além de qualquer maldade e esquartejaram uma criança de seis anos. Assim, temos de condenar o professor do tal Elias Maluco, que matou o jornalista Tim Lopes, e indiciar por co-autoria quem não educou adequadamente os latrocidas que incineraram quatro pessoas em Bragança Paulista. A crise da segurança pública no Brasil decorre da perda progressiva de substância do Estado provocada pela legislação penal dirigida a beneficiar o bandido, aliada à deterioração da atividade policial. Na década de 1980, os indicadores de criminalidade já apontavam que a violência iria explodir em decorrência do incremento econômico do tráfico de drogas. Em vez de fortalecer o aparato de segurança do Estado, a alternativa adotada foi afrouxar as leis sob o entendimento de que proteger os direitos dos presos era condição necessária para a democracia. O erro ainda vigora, pois, no Ministério da Justiça, e isso não é invenção do governo Lula, impera o conceito de que a legislação penal precisa atender aos reclamos da advocacia criminal. É muito fácil dizer que não podemos atirar os adolescentes à cova dos leões do sistema penitenciário porque ali viceja uma escola do crime. Perfeitamente, mas deixar que o Estatuto da Criança e do Adolescente seja um conselheiro da impunidade é plausível. Executar arremedo de política prisional também. Não ter educação de qualidade, idem. Para o governo federal, é interessante tratar a segurança pública como um problema sem solução até para ter uma escusa incontestável. É como se dissesse: investir em segurança é lançar sal em carne pobre. Nesta semana, o governo espanhol comemorou a queda nos indicadores de criminalidade. No país europeu, morreram 1,2 mil pessoas vítimas de homicídio no ano passado. No Brasil, matam-se dez por cento deste número todos os dias e a gente lava as mãos. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, fevereiro 23, 2007
Mata-se todo dia e a gente lava as mãos
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