Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 10, 2007

O fim da doutrinação de diplomatas

Sururu no Itamaraty

Está suspensa a leitura engajada.
Já a política externa...


Otávio Cabral

André Dusek/AE
O ministro Amorim e a diplomacia ideológica: apenas um "mal-entendido"


A entrevista a VEJA do ex-embaixador do Brasil em Washington Roberto Abdenur produziu um salseiro no comportado mundo da diplomacia. Com 44 anos de carreira e aposentado há apenas duas semanas, quando deixou o posto nos Estados Unidos, Abdenur revelou que as promoções no Itamaraty ocorrem de acordo com afinidades política e ideológica, disse que a atual orientação tem um substrato "vagamente anticapitalista, antiglobalização, antiamericano, totalmente superado" e chegou a denunciar o que chamou de "doutrinação de diplomatas", obrigados a realizar leituras de viés esquerdista. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reagiu. Primeiro, afirmou que Abdenur deveria ter feito as revelações quando ainda estava no cargo, em Washington. Depois, anunciou uma providência. Diante de tudo o que Abdenur disse, Amorim mandou suspender as leituras obrigatórias no Itamaraty, classificadas pelo ex-embaixador na entrevista a VEJA como "vexatórias".

O ministro Celso Amorim rebateu as acusações de que as promoções no Itamaraty ocorrem de acordo com o alinhamento ideológico dos diplomatas. "É um absurdo e é até difamatório", reagiu. Até a leitura obrigatória, que Amorim mandou suspender diante da entrevista de Abdenur, foi minimizada pelo chanceler. Ele disse que, de três obras obrigatórias (Chutando a Escada, do chinês Ha-Joon Chang, Rio Branco, de Álvaro Lins, e Brasil, Argentina e Estados Unidos – Da Tríplice Aliança ao Mercosul, de Luiz Alberto Moniz Bandeira), apenas a última poderia ter algum viés esquerdista. Ainda assim, Amorim afirmou que decidiu suspender as leituras apenas para evitar o que chamou de "mal-entendidos" explicitados pela entrevista de Abdenur a VEJA.

A leitura obrigatória de obras alinhadas com a doutrina nacional-terceiro-mundista do chanceler Amorim foi introduzida pelo secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, no início de 2004. A leitura é parte de um cursinho de duas semanas a que Pinheiro Guimarães submete todos os diplomatas que estão sendo transferidos de posto. O viés ideológico das aulas, apelidadas no Itamaraty de "Escolinha do Professor Samuel", é inequívoco. Um dos livros cuja leitura foi suspensa traz um prefácio no qual o próprio Pinheiro Guimarães espicaça a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e os Estados Unidos. Responsável por promoções, transferências e pela formulação da política externa do governo petista, Pinheiro Guimarães professa ideário inútil e ultrapassado do fim do século XIX. Odeia a globalização, é contrário à abertura econômica, acredita no imperialismo ianque e adota como método de trabalho ampulheta e papel-carbono. As fichas de leitura engajadas acabaram. Pinheiro Guimarães segue forte no Itamaraty.

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