Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Estados Unidos Barack Obama: um candidato atípico

Um presidente negro
na casa branca?

Barack Obama disputa com Hillary Clinton
a candidatura democrata e – surpresa!
– ela tem a maioria dos votos dos negros


Diogo Schelp

Jason Reed/Reuters
Gerald Herbert/AP
Obama (à esq.), em Iowa, na semana passada. McCain (à dir.) é a mais forte opção dos republicanos

"Minha superexposição na mídia é tal que faço Paris Hilton parecer tímida", encantou-se Barack Obama em 2005, ao assumir seu primeiro mandato como senador em Washington. Nunca mais saiu do foco dos holofotes. Na semana passada, Obama lançou seu nome na disputa pela candidatura democrata nas eleições presidenciais do próximo ano – disputa que tem como favorita a senadora Hillary Clinton. Há várias razões para a especial atenção dada a Obama. Ele é o primeiro candidato negro com chances reais de chegar à Casa Branca (as pesquisas o mostram à frente de John McCain e Rudy Giuliani, os melhores nomes entre os republicanos). Mesmo que desta vez fique pelo caminho, Obama deve permanecer no andar superior da política americana pela próxima década – quem sabe como aspirante a vice-presidente em 2008 e candidato a presidente mais tarde. Há também, como insiste a direita republicana, a questão do nome do meio: Hussein. Que ironia seria George W. Bush entregar a Casa Branca a um sucessor chamado Hussein.

Hillary leva vantagem em relação a Obama em pelo menos dois quesitos. Com oito anos como primeira-dama e seis como senadora, ela tem mais experiência política que Obama (ele serviu apenas oito anos no Legislativo de Illinois e dois no Senado americano). Hillary também tem à sua disposição uma máquina eleitoral que já se mostrou eficiente em duas ocasiões para seu marido. As pesquisas revelam que 40% dos eleitores democratas apóiam a candidatura de Hillary, contra 21% de Obama e 11% de John Edwards, outro pré-candidato. Os mais velhos ainda lembram quando a cor do candidato era uma questão central na política americana. Os tempos mudaram e Obama agora disputa o eleitorado negro com a senadora Hillary Clinton. A ex-primeira-dama leva a melhor. Uma pesquisa recente deu-lhe 60% dos votos dos negros, contra 20% para Obama.

Obama anda às voltas com a inesperada tarefa de combater a suspeita de que "não é negro o suficiente". O que isso quer dizer? Militantes dos direitos civis dizem que lhe falta essa experiência essencial para um político negro tradicional. Outro detrator levantou o fato de ele não ser um descendente de escravos – privado, assim, teoricamente, da memória de injustiça e sofrimento que moldou a psique negra americana. Por fim, não há nada em seu estilo de vida que possa ser associado ao gueto afro-americano. Essas afirmações são a expressão da complexa identidade negra nos Estados Unidos.

Dima Gavysh/AP
Hillary Clinton: mais experiência política, estrutura de campanha melhor que a de Obama e herdeira do eleitorado do marido

Os avanços desde a luta pelos direitos civis foram de tal dimensão que hoje talvez fosse mais realista se os políticos negros abandonassem o velho discurso sobre classe racial e começassem a pensar em termos de classe social, independentemente da cor da pele. Apesar da enorme quantidade de negros ainda encurralados pela pobreza nos guetos, nada menos que 1,1 milhão de famílias negras americanas ganham acima de 100 000 dólares por ano. Obama será o homem capaz de representar essa mudança? Nascido no Havaí, ele é filho de um imigrante queniano – de quem herdou o nome – que abandonou a família quando o filho tinha apenas 2 anos. Com a mãe, que é branca, e seu segundo marido, Obama passou quatro anos de sua infância na Indonésia, onde estudou em uma escola islâmica e, depois, numa católica. De volta ao Havaí, morou com os avós maternos, com os quais viveu uma típica vida de classe média branca. Só entrou em contato com a pobreza negra aos 24 anos, já formado em ciência política pela Universidade Colúmbia, quando se mudou para Chicago para fazer trabalhos sociais em bairros pobres. Seis anos depois, formou-se em direito pela Universidade Harvard e passou a advogar e lecionar em Chicago.

Obama nunca tentou se apresentar como o candidato dos negros. "Ele quer se distinguir por seu histórico pessoal, sua habilidade de comunicação, seu carisma e seus projetos de governo, não pela quantidade de pigmento na pele", disse a VEJA o cientista político americano Stephen Wayne, da Universidade Georgetown, em Washington. "Talvez por isso seja criticado por tantos ativistas negros." O maior trunfo eleitoral de Obama é o fato de ser jovem (45 anos) e passar a imagem de um homem bem-sucedido com um discurso otimista e conciliatório, em oposição aos ranços ideológicos dos políticos tradicionais. Falta, contudo, dizer exatamente a que veio, já que ele não deixou claro até agora quais são suas propostas de governo.

Com reportagem de Thomaz Favaro

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