Entrevista:O Estado inteligente

domingo, maio 28, 2006

Os desacertos de Mantega Suely Caldas

OESP


E-mail: sucaldas@estado.com.br

O governo Lula não se saiu bem no primeiro teste - sem Palocci - para acalmar o mercado e aliviar os efeitos da volatilidade que derrubou a Bovespa e elevou bruscamente o dólar e o risco País, na semana passada. Ressalve-se: o nervosismo do mercado atingiu o mundo inteiro e teve origem nos desequilíbrios da economia norte-americana, não nos nossos. Porém a firme atuação do governo, elucidando dúvidas e desconfianças, seria imprescindível para um país que ainda não resolveu todas as suas fragilidades econômicas e continua vulnerável aos ataques especulativos. O governo agiu, o presidente Lula veio a público garantir que não mudam as políticas cambial e fiscal, o Banco Central demorou, mas se manifestou.

Já o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a quem cabe parcela maior de responsabilidade, emitiu sinais desencontrados e provocou confusão. Como em outros países, aqui também o mercado se acalmou, embora não tenha recuperado tudo o que perdeu. Mas deste primeiro teste restou a impressão de que o governo precisa preparar-se melhor para enfrentar este ano eleitoral, porque os desequilíbrios da economia americana persistem, o Federal Reserve pode elevar os juros acima de 5%, a prosperidade econômica do mundo tende a declinar, nossa enorme dívida pública é fator de risco, não há convicção de firmeza na política fiscal e o trauma vivido no ano eleitoral de 2002 ainda paira no consciente coletivo.

Quando Mantega assumiu a Fazenda, a desconfiança em relação a ocorrerem confrontos com o presidente do Banco Central era tal que o presidente Lula veio a público afirmar que Henrique Meirelles passaria a responder diretamente a ele, não mais ao ministro da Fazenda. Apesar disso, a desconfiança persistiu, embates internos ocorreram. Até que, na semana retrasada, o ministro da Fazenda decidiu anunciar novas regras para o câmbio que resultariam numa maior desvalorização do real, reclamada pelas indústrias automobilística e de calçados. O tom do anúncio era de ufanismo, comemoração e urgência: as novas regras viriam logo e por medida provisória (MP). Dois dias depois, Meirelles moderou o tom, as medidas ainda estavam em estudo, não havia urgência nem decisão se elas viriam por MP. No mínimo, duas visões diferentes, o que é ruim.

Mercado agitado, dólar e risco Brasil em alta e Bovespa em queda livre, o ministro da Fazenda mudou de tom na semana passada. Ao apresentar a jornalistas o novo secretário de Política Econômica, Júlio Sérgio Gomes de Almeida, Mantega mudou radicalmente o sentido de urgência das mudanças no câmbio: só seria tomada uma decisão depois de o assunto amadurecido. Com o mercado mais calmo, na quinta-feira, ele retomou a linha inicial e lamentou a interrupção da desvalorização do real.

Há quem diga que derrubar o câmbio é fácil - basta uma combinação de falas inconsistentes e inconvenientes. O difícil é, depois de o estrago feito, recuperar a confiança e trazer a taxa para o equilíbrio. Ainda não é o caso, mas o ministro da Fazenda precisa ter mais cuidado com o que fala, evitar sinais contraditórios, confusos, de insegurança. Ávido por oscilações de preços, o mercado aproveita qualquer deslize de quem regula ativos financeiros para produzir lucros. É preciso evitá-los.

Um exemplo: no dia em que o mercado mais exacerbava seu nervosismo, o ministro convocou a imprensa para anunciar a nomeação de seu novo secretário de Política Econômica. Poderia ter evitado, adiado o anúncio para um momento mais calmo. E por quê? O economista Júlio Sérgio Gomes de Almeida é identificado com uma linha de política econômica de um Estado mais intervencionista, oposta à que vinha sendo conduzida pelo ex-ministro Palocci. Os agentes do mercado viram sinais de alteração no comportamento do governo, possibilidade de maior interferência nas taxas de juros e de câmbio, e passaram a cogitar de mudanças nas políticas econômica, monetária e fiscal num possível segundo mandato de Lula.

Se está realmente empenhado em garantir um ano eleitoral tranqüilo na economia e afastar o fantasma da crise de 2002, Lula precisa cuidar é de economizar despesas, qualificar os gastos, não desperdiçar e produzir um superávit capaz de reduzir a relação dívida-PIB. Ter em conta que só o déficit da Previdência engoliu R$ 11,1 bilhões até abril e vai piorar muito com o aumento do salário mínimo e do reajuste de aposentados. Gastar menos e melhor é o sinal mais eficaz para assegurar uma travessia inversa à de 2002.

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