Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, maio 25, 2006

Alberto Tamer - Investimento sai, pobreza entra





O Estado de S. Paulo
25/5/2006

O Brasil parece um país indiferente à pobreza, à miséria, suas causas e conseqüência. Talvez já esteja "acostumado" e não se preocupa em analisar mais a fundo suas causas. Se o fizesse, veria que fome e miséria não se combate com assistencialismo, mas com empregos. E emprego só se cria com investimento. Não investe, não cresce, mas, como a população continua se expandindo e a entrada de jovens no mercado aumenta de forma explosiva, o que temos é um empobrecimento generalizado das classes média e baixa.

Segundo o IBGE, o governo informou que 72 milhões de brasileiros (quase 40% da população) passam o que sofisticadamente se chama de "insegurança alimentar". Mais especificamente, 14 milhões de pessoas (7,7% da população do país) passam fome mesmo. Mais grave, dramático, como diz editorial do Estado de sexta-feira, "é que nada menos do que metade das crianças de até 4 anos de idade está sob risco de insegurança alimentar... e a perspectiva de uma desnutrição endêmica".

E, mais ainda, cerca de 80% dos assalariados registrados ganham entre 1 e 1,5 salários mínimos, de acordo com dados do Ministério do Trabalho. Se ele optar por não se registrar, recebe um pouco mais e entra na imensa lista da informalidade.

O INVESTIDOR FUGIU
Este cenário só tende a agravar-se no governo atual porque os investidores externos diretos, e os internos também!, os que constroem fábricas e criam empregos, estão sumindo. Não confiam nem no Brasil nem no governo. Exagero? Vamos aos números do Banco Central

1 - Em abril os investimentos externos (não as aplicações financeiras) despencaram para US$ 790 milhões. Foi uma queda brutal, pois em janeiro havia entrado US$ 1,5 bilhão, em fevereiro recuaram para US$ 854 milhões. Deram um salto para US$ 1,6 bilhão em março e desabaram em abril.

2 - No quadrimestre janeiro-abril, acumulado, não foram mais do que US$ 4,748 bilhões (só 1,6% do PIB!) uma ninharia comparado com qualquer país em desenvolvimento.

POR QUÊ?
Quais as causas dessa verdadeira aversão ao Brasil? Há várias, juros altos, carga tributária cada vez mais elevada que já chega a 40%, mas, nos últimos 12 meses, a causa principal pode ser apontada da errática política cambial como tem afirmado com insistência o ex-ministro Delfim Netto. "Hoje é cada vez mais visível a lenta desintegração do setor produtivo, em conseqüência da 'supervalorização' do real...", diz em artigo de terça-feira no Valor.

Nenhuma empresa investe a um câmbio alto para exportar a um câmbio baixo; não só isso, ela não tem a menor idéia de até que ponto esse câmbio vai desabar! Não são suicidas e vão para países como a China onde as promessas são mantidas, as regras não mudam e - mais importante - sabem com quem falar.

A valorização do real em enorme parte é demagógica e eleitoral, uma "vitória problemática" sobre a inflação, ironiza Delfim. O dólar desvalorizado torna mais barato importar, mas rouba empregos nas empresas nacionais e estrangeiras e os cria lá fora. Isso desmorona sobre a agricultura e a indústria, que perdem condições para exportar e ou saem do País ou demitem. Os agricultores estão no fundo do poço e bloqueiam estradas em protesto.

Os industriais apresentaram uma série de sugestões para conter a valorização do real, ao ministro Mantega. Ele garantiu uma série de promessas. Declarou mesmo que o governo estava preocupado com os efeitos negativos, da excessiva e crescente valorização do real. Foi um suspiro de alívio de toda a classe produtora, agrícola, pecuária, industrial, mas que durou não mais do que um dia.

E ELES ESTÃO INDO EMBORA
Enquanto isso, os investidores financeiros, não diretos, que haviam trazido bilhões de dólares para obter lucros no mercado interno, em grande número, estão indo embora.

Inúmeras e grandes empresas nacionais estão fazendo o mesmo, indo investir no exterior, onde podem produzir, exportar a custo menores, política cambial e governos mais confiáveis e competir com mais vantagens e segurança. Como investir e exportar com esta incerteza e com este câmbio?

E LULA DIZ NÃO
Terça-feira, Lula desmentiu publicamente tudo o que Mantega havia prometido há dois dias. "Não haverá mudanças no câmbio." Ou seja, o real vai continuar valorizado ou valorizando-se diante do dólar, ao contrário dos bobocas da China, e outros países, que desvalorizam suas moedas para exportar mais.

Isso só vai agravar-se até as eleições, com os pobres iludidos com as esmolas que só adiam a sobrevivência na miséria. É triste. Pobreza e miséria não se combatem com dinheiro e esmola, mas investimento e emprego. Exatamente o que não temos e não teremos neste ano que já acabou antes de terminar.

* E-mail: at@attglobal.net

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