O Estado de S. Paulo |
29/5/2006 |
Foram duas semanas de lascar. Primeiro, o terror em São Paulo, depois, a tremedeira dos mercados financeiros. Esta última destruiu riqueza tanto de poupadores quanto de especuladores e mostrou o principal problema da economia brasileira: não ter aproveitado o excelente momento da economia mundial para tocar algumas reformas, cuja falta já se sentiu nesse momento agudo. A crise de segurança pública foi muito pior. Destruiu vidas e mostrou mais uma vez a extrema vulnerabilidade da sociedade ao crime organizado. As duas passaram da fase aguda e, como sempre, ao menos por algum tempo, fica um debate. No caso da crise financeira, o presidente disse que a economia brasileira estava sólida e, por isso, não se abalava mais só porque o presidente do banco central (Fed) dos EUA dava um espirro. É verdade que as contas externas brasileiras são hoje infinitamente mais confortáveis. Contando o superávit do comércio externo e a entrada de investimento externo direto, o País recebeu no ano passado mais de US$ 61 bilhões. Colocando mais uns US$ 7 bilhões de aplicações financeiras, em busca dos juros altos, dá quase US$ 70 bilhões de entradas líquidas. E deve ser a mesma coisa neste ano. Por isso, aliás, o dólar ficou tão barato. Tem excesso de oferta. Ainda assim o dólar saltou de R$ 2,05 para R$ 2,40, em três dias, só por causa de espirros nos EUA. Desde 2003, para sorte de Lula, o mundo engatou numa marcha de crescimento puxado pelos EUA, o shopping do mundo. Quatro anos seguidos de crescimento vigoroso, sem inflação, mas com o acúmulo de dívidas e déficits. Lá nos EUA, todos - o país, o consumidor e o governo - gastam mais do que ganham. E são financiados pelo resto do mundo, pelos países que vendem para os americanos. O medo no mundo é o seguinte: numa hora dessas, vai dar inflação nos EUA, o banco central deles eleva os juros, a economia desacelera, o país, endividado, tem de economizar para pagar seus débitos com juros mais altos, e lá se foi o crescimento mundial. Toda a confusão da última semana começou com números que sugeriam a volta da inflação. E terminou com dados mostrando que a inflação está sob controle. Por que o Brasil sofreu mais que outros países? Porque, embora tenha melhorado muito, ainda tem indicadores piores, especialmente a dívida líquida do setor público, equivalente a 51% do produto interno bruto, quando deveria ser 30%. E o governo Lula, embora tenha conseguido uma pequena redução nessa dívida, não fez nenhum programa de forte redução do gasto público. Ao contrário, está aumentando. Quanto à outra crise, a da segurança, Lula observou, entre outras coisas, que o gasto com um presidiário é maior do que com um aluno do ensino fundamental e que com mais educação haverá menos criminosos. Meias verdades. Educação ajuda a longo prazo, não dispensa eficiência da polícia e do Judiciário - no que este governo manteve a tradição dos anteriores: o fracasso. E FUNCIONOU! Em artigo de 16/1, reproduzimos e-mail de um leitor, Alfredo A. Schnabel Fuentes, executivo da filial brasileira de uma multinacional alemã do ramo de sensores, que contava uma história exemplar, no mau sentido, sobre a nossa burocracia. A matriz da multinacional queria exportar sensores para o Brasil em reais. Bom negócio para a filial brasileira, que ficava devedora em reais, não em euros. Claro, bom negócio também para as contas externas brasileiras. Desde 1999 a companhia tentava viabilizar essa importação. Até que, em 2005, o Banco Central editou norma que equiparava as importações em reais às feitas em outras moedas, sem a necessidade de emissão prévia de Licença de Importação (LI), com custos menores. A filial brasileira fez uma operação teste, com êxito, e, quando se preparava para acelerar os negócios, surpresa: o Ministério do Desenvolvimento editou nova portaria, passando a exigir a LI prévia para importações em moeda nacional. Quando nos escreveu, em janeiro, o leitor já estava desanimado, mas resolveu tentar mais uma vez. E deu certo. Eis o que nos contou em e-mail da semana passada: "Conseguimos agendar uma reunião com o secretário do Ministério do Desenvolvimento, Armando de Mello Meziat. A reunião ocorreu em 24/2, no Rio de Janeiro, em plena véspera de carnaval. Fomos, eu e o presidente da empresa, muito bem atendidos pelo próprio secretário, que convocou seus assessores para estudar o assunto. O próprio Meziat já havia lido a coluna no Estado e se mostrou totalmente favorável à revisão da norma. Três meses depois, no último dia 5, a portaria foi modificada e as importações em reais finalmente estão liberadas de Licença Prévia de Importação. Fazendo justiça ao secretário, todo o processo foi muito profissional." Ponto para o secretário Meziat e para o ministro Luiz Fernando Furlan. |
Entrevista:O Estado inteligente
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segunda-feira, maio 29, 2006
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