Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, maio 30, 2006

Míriam Leitão - Juros e PIB



Panorama Econômico
O Globo
30/5/2006

O que fará a reunião do Copom esta semana? Pelo manual de metas de inflação, o Banco Central pode confortavelmente reduzir os juros, porque a inflação está abaixo da meta. Mas a turbulência da semana passada pareceu, a vários economistas do Brasil e do exterior, o começo de uma fase mais difícil da economia internacional. Todos os bancos centrais estão subindo os juros e isso pode acabar incentivando o conservadorismo do Banco Central brasileiro. A boa notícia da semana será o PIB positivo a ser divulgado na quarta-feira.

— O IPCA-15 está abaixo da meta nos últimos doze meses. O IPCA de maio, quando for divulgado, ficará abaixo do último IPCA-15. O álcool é um dos fatores de queda. O preço dos alimentos in natura também está negativo. Os IGPs estão em alta, mas, mesmo subindo, o acumulado dos últimos doze meses permanece negativo. Há, portanto, espaço para queda dos juros — afirma o economista Luiz Roberto Cunha, da PUC.

O problema, diz o professor, é que o cenário internacional ainda é incerto, as avaliações, desencontradas; tudo leva a acreditar que haverá mais volatilidade. O mundo está hoje numa fase diferente daquela que, nos últimos três anos, garantiu um crescimento forte com inflação baixa, apesar da alta dos preços do petróleo. Na dúvida, entre um cenário favorável de inflação e incertezas da economia mundial, o que o Banco Central deve fazer é reduzir a taxa de juros, mas com mais parcimônia. A maioria das apostas se concentra em 0,5 ponto percentual.

A última edição da "The Economist" traz na capa um urso — símbolo usado pelo mercado para significar uma fase de queda das cotações e pessimismo — perguntando em que direção fica Wall Street. No artigo central, a análise é de que a "economia está forte, apesar dos tremores do mercado, mas ninguém deve apostar a sua casa nisso", numa referência ao grande ponto de incerteza: o mercado imobiliário americano.

A economia mundial cresceu 4% em taxa anualizada por 11 trimestres consecutivos, lembra a revista. Essa é a melhor alta em 30 anos. Mesmo assim, a inflação mundial permaneceu baixa; e isso tudo com um petróleo batendo em US$ 70 o barril, o que significa que seu preço triplicou desde 2003.

Recentemente, um economista americano que visitou o Banco Central admitiu, numa reunião por lá, que, se lhe perguntassem se era possível a economia mundial crescer forte com um petróleo a US$ 70, ele responderia que não.

Outros choques de petróleo levaram à estagflação. Desta vez, foi diferente por três forças que puxaram a economia mundial. Para começar, o crescimento de países como China e Índia e outros emergentes. A segunda força foi a redução das taxas de juros em todo o mundo desenvolvido. Em 2003, as economias industrializadas estavam com as taxas mais baixas em 30 anos. A terceira força foi que o dinheiro barato incentivou os consumidores, principalmente americanos, a se endividar e gastar. Nos Estados Unidos, esse dinheiro barato alimentou uma alta dos preços dos imóveis que levava a mais endividamento. Os donos dos imóveis tomavam mais empréstimos baseados no valor mais alto dos seus imóveis e, com esses recursos, consumiam mais.

"A era do dinheiro barato está perto do fim", diz a "Economist". Pela primeira vez em 15 anos, os bancos centrais dos três blocos de países industriais — Estados Unidos, Europa e Japão — estão subindo as taxas de juros. Sem o crédito barato, a alta do petróleo pode causar mais danos à economia. Os tremores da semana passada foram a lembrança de que, mais cedo ou mais tarde, o crescimento vai cair e a inflação vai subir. Não se sabe quando isso ocorrerá, mas a qualquer novo indicador que mostre uma coisa ou outra o mercado passa por momentos de incerteza, até porque o novo presidente do Fed, Ben Bernanke, não tem a reputação de Alan Greenspan. Pelo contrário, tem sido mal avaliado. Se ele não conquistar a confiança, terá que subir mais os juros para mostrar firmeza; do contrário, os juros subirão de qualquer jeito por pressão do mercado. Essa alta dos juros reduzirá o dinheiro disponível para países emergentes, como o Brasil. Ainda que o tremor tenha sido curto na semana passada, ele detonou um processo, já em curso, de revisão de expectativas.

Se os preços dos imóveis ao menos se estabilizarem — alerta a "Economist" — a economia pode reduzir o ritmo por força do aperto no consumo e na indústria de construção. Mas se os preços dos imóveis caírem, a economia americana pode ter uma recessão.

Esse é o pano de fundo internacional no qual o Banco Central vai se reunir para decidir esta semana a taxa de juros brasileiros, que continua nos píncaros dos 15,75%, mostrando que o melhor momento para a redução dos juros já passou. A diminuição do ritmo de queda não deve provocar maiores críticas ao Banco Central porque, por uma feliz coincidência para o Copom, no mesmo dia do resultado da reunião, será divulgado o PIB do primeiro trimestre. E os números vão mostrar retomada do crescimento. A aposta mais comum no mercado é de um crescimento que pode chegar a 1,4% em relação ao último trimestre, o que daria perto de 3,5% em relação ao mesmo trimestre do ano passado.

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