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Governo analisa campanha de FH e faz manual para evitar impugnação
Para o público externo, o presidente Luiz Inácio da Silva diz que as
pesquisas não devem "iludir" ninguém, mas internamente manifesta
convicção de que os números antecipam mesmo o resultado das urnas e
que a reeleição está garantida.
Apesar da euforia, Lula tem hoje duas preocupações: a possibilidade de
o PSDB trocar o candidato a presidente da República, substituindo
Geraldo Alckmin por José Serra, e o comportamento da Justiça Eleitoral
sob o comando do ministro Marco Aurélio Mello.
O aviso do presidente do Tribunal Superior Eleitoral de que não haverá
"contemporizações" por parte da Justiça no processo eleitoral acendeu
no governo um alerta: esse vigor punitivo, aliado à personalidade
forte e ao gosto pela polêmica do presidente do TSE, indica que todo
cuidado será pouco na condução da campanha.
Será fundamental separar os atos do presidente e as ações do
candidato, a fim de não criar oportunidades para a oposição requerer
ao Judiciário punições contra Lula, sendo a maior delas a impugnação
da candidatura.
Antes mesmo de ter seu esquema de campanha montado, o presidente Lula
já conta com os preparativos da equipe de defesa sob a, digamos,
supervisão, do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.
O grupo de advogados está sendo escolhido enquanto o governo faz um
levantamento minucioso da campanha à reeleição de Fernando Henrique
Cardoso em 1998. A experiência será aproveitada por Lula, uma vez que
FH, como o pioneiro na disputa de eleições no exercício do cargo,
também foi assombrado pelo fantasma da impugnação.
Na época, temia que escorregões legais fossem aproveitados pelo PT
para contestações na Justiça.
A análise preliminar daquela fase deu aos auxiliares de Lula a
impressão de que o antecessor foi excessivo nos cuidados. Por exemplo,
Fernando Henrique reduziu drasticamente a quantidade de viagens e saiu
de Brasília apenas oito vezes entre junho e setembro de 1998.
O governo acha pouco, considera que Lula, tomadas as devidas
precauções, como separação de equipes de assessoria, transporte e
financiamento dos eventos a que o presidente/candidato comparecer,
pode viajar mais.
Para que Lula e seus assessores saibam perfeitamente bem o que podem e
o que não podem fazer está sendo elaborado um manual com todas as
restrições e permissões legais.
A desenvolta falta de cerimônia do presidente da República na mistura
dos dois papéis não poderá continuar a partir do próximo mês, sob pena
de, provocada, a Justiça Eleitoral começar a impor sanções ao
presidente.
Sem contar com punições a posteriori, pois a nova legislação
responsabiliza o candidato pelas contas do partido e, em caso de
irregularidade, é prevista a cassação do mandato por abuso de poder
econômico.
Precavido, o ministro da Justiça teve uma reunião na quarta-feira com
o presidente do TSE, não para discutir o caso específico de Lula. Para
todos os efeitos, a preocupação do governo em assegurar "eleições
limpas", mediante atuação de um grupo integrado pela Receita Federal,
pela Procuradoria-Geral da República, pelo Ministério da Justiça, pelo
Banco Central e pela Justiça Eleitoral, tem o caráter geral de
moralizar o processo.
Há essa intenção, mas há evidentemente o interesse do ministro em
estabelecer uma relação de parceria com o TSE para tomar o pulso da
Justiça e criar uma interlocução permanente, de modo a preservar as
boas relações entre o Palácio do Planalto e o Tribunal Superior
Eleitoral.
Marco Aurélio Mello, avalia o governo, observará os limites da lei.
Mas pretende fazê-lo da condição de protagonista, não deixando à
Justiça um papel secundário.
Aos navegantes
Vale relembrar o trecho final do discurso de posse de Marco Aurélio
Mello no início do mês.
"No que depender desta presidência, o Judiciário compromete-se com
redobrado desvelo na aplicação da lei. Não haverá contemporizações a
pretexto de eventuais lacunas na lei, até porque, se omissa a
legislação, cumpre ao magistrado interpretá-la à luz dos princípios do
direito, atendendo aos anseios da coletividade."
"Que ninguém se engane: não ocorrerá tergiversação capaz de turbar o
real objetivo da lei, nem artifício conducente a legitimar a aparente
vontade das urnas se o pleito mostrar-se eivado de irregularidades.
Esqueçam, por exemplo, a aprovação de contas com as famosas
ressalvas."
"Passem ao largo das chicanas, dos ardis possibilitados pelas
entrelinhas dos diplomas legais. Repito: no que depender desta Cadeira
não haverá condescendência de qualquer ordem. A lei será aplicada com
a maior austeridade possível - como, de resto, é o que deve ser."
Dito popular
O advogado Sergio Wesley disse o que se diz nas ruas: em matéria de
malfeitorias, o Congresso é professor.
A impertinência reflete o que o Parlamento fez consigo mesmo.