Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, maio 25, 2006

Avanço nas regras eleitorais




editorial
O Estado de S. Paulo
25/5/2006

Um dia depois de o presidente Lula reclamar das limitações ao uso risonho e franco de dinheiro público em anos de eleição, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tomou na terça-feira uma série de decisões para fechar o cerco em torno do uso de "recursos não contabilizados", como andaram dizendo os companheiros do presidente na frustrada tentativa de apagar as pistas do mensalão. A principal medida do pacote moralizador foi a de considerar os candidatos co-responsáveis pelas informações que os tesoureiros de suas campanhas são obrigados a prestar sobre a movimentação financeira na temporada de caça ao voto.

Assim, se um gestor dos recursos da campanha que se chame, por exemplo, Delúbio, faltar com a verdade na prestação de contas à Justiça Eleitoral, o candidato a quem servir se verá, ele também, às voltas com os tribunais. E mais: rejeitadas as contas oficiais por omissão comprovada de recursos não contabilizados - o velho e malsão caixa 2 -, o registro do candidato poderá ser cancelado. A rigor, o que o TSE fez, em relação a essa e a outras regras, definidas na chamada minirreforma eleitoral aprovada recentemente pelo Congresso (e sancionada com apenas um veto substantivo pelo presidente da República), foi selecionar as que poderiam vigorar já no pleito de outubro próximo.

Pela Constituição, normas eleitorais devem estar definidas pelo menos a um ano da data de votação, salvo quando se tratar de aprimorar, mediante regulamentação, as normas existentes. Nem sempre, naturalmente, é fácil distinguir entre um mero ajuste e uma mudança de fundo. De todo modo, se esperava que o TSE fosse julgar inaplicáveis já agora quase todas as provisões da Lei 11.300. Felizmente, considerando a intenção dos legisladores, na esteira dos escândalos trazidos à tona no ano passado, o tribunal entendeu que as inovações devem ser adotadas desde logo, em vez de esperar as eleições seguintes.

Assim, embora os juízes eleitorais tenham resolvido, por maioria de 1 voto, que este ano os partidos poderão gastar quanto queiram - valendo apenas a partir de 2008 o artigo pelo qual a cada pleito tais gastos terão de ser definidos em lei específica -, em geral o ato do Congresso produzirá efeitos imediatos. Acaba, já não sem tempo, o uso de dinheiro vivo nas campanhas: doravante, as doações só poderão ser feitas mediante cheques nominais cruzados ou transferências eletrônicas. Partidos e candidatos terão de colocar na internet, em 6 de agosto e 6 de setembro, balancetes das entradas e saídas (sem identificação dos doadores). O balanço final precisará ser entregue até 30 dias depois da eleição. Contas rejeitadas poderão levar a cassações de mandatos.

Quando o projeto da minirreforma subiu à sanção presidencial, Lula vetou o artigo que proibia o uso de imagens externas no horário eleitoral e a participação de não filiados a partidos. Com isso, competirão pelo voto do eleitor, por exemplo, cenas das CPIs que desmoralizaram o PT e cenas de efusões populares envolvendo Lula; depoimentos revoltados de velhinhos nas filas do INSS e depoimentos eufóricos de beneficiários do Bolsa Família. Mas o público votante já não verá mais, deste ano em diante, showmícios nem outdoors de candidatos. Tampouco poderá receber brindes, como os bonés e camisetas que os mais carentes continuam a usar quando já nem se lembram em quem votaram para as câmaras legislativas.

Ao receber o projeto, o presidente perdeu uma oportunidade valiosa de tomar o partido da luz, vetando o artigo liberticida que proibia a divulgação de pesquisas eleitorais nos 15 dias que precedem as eleições. Para os candidatos, quanto menos bem informado o eleitor sobre as chances de cada qual às vésperas da votação, tanto mais fácil alardear o "já ganhou", quando os prováveis perdedores, as suas equipes e os jornalistas - que continuariam tendo acesso às sondagens sonegadas aos mortais comuns - saberão com exclusividade para onde sopra o vento.

Em boa hora, porém, a Justiça Eleitoral atestou o óbvio: a mordaça desejada pelos políticos é inconstitucional. A Carta, no seu artigo 220, assegura o pleno direito à informação e a plena liberdade de informar. (Curiosamente, houve quem divulgasse que o veto do TSE só valeria para este ano, como se o blecaute imposto às pesquisas pudesse ser inconstitucional em 2006 e constitucional depois...) Agora, é esperar que os tribunais eleitorais consigam fazer cumprir as novas regras.

Arquivo do blog