Não faz sentido dizer que a violência só será controlada quando houver emprego e educação para todos
AS CAUSAS do crime são complexas. Mais difícil ainda é sugerir uma solução para o problema. A economia pode ajudar. Ou pelo menos os economistas vivem dando palpite sobre o assunto. A Colômbia avançou no combate ao crime. Não é por acaso que Álvaro Uribe deve se reeleger amanhã para a Presidência do país. A Colômbia recebeu US$ 10 bilhões de investimento direto em 2005, algo perto de 8,3% do PIB. Esse percentual aplicado ao Brasil resultaria em US$ 63 bilhões, mais de quatro vezes o investimento direto que o Brasil recebeu no ano passado. Seria exagero afirmar que tais números são explicados pelo sucesso da política de segurança de Uribe, mas é inegável que houve uma percepção de melhora no problema da violência. Há menos de uma década, quando uma multinacional queria se livrar de um executivo, mandava-o para Bogotá. A situação atual é melhor. Há, portanto, lições interessantes do caso colombiano. E não só na esfera do governo federal. Um exemplo nesse sentido é o estudo de Maria Victoria Llorente e Ângela Rivas sobre as políticas adotadas em Bogotá, disponível no endereço eletrônico www.worldbank.org. Mas cuidado com as lições do exterior. Tome-se o celebrado sucesso de Nova York. Há 20 anos era perigoso andar no Central Park. Hoje, qualquer velhinha toma metrô de madrugada. Mas há muita polêmica acerca das causas do sucesso. A leitura divertida do livro "Freakonomics", do economista de Chicago Steven Levitt, convence o leitor de que a badalada estratégia de "tolerância zero" guarda pouca relação com o fenômeno. Mas é preciso cuidado redobrado com as fórmulas mágicas do próprio Levitt. Mediante exercício estatístico, Levitt consegue explicar a queda da criminalidade pela legalização do aborto. Tal resultado é, no entanto, desmontado por outros autores, como Christopher Foote e Christopher Goetz. A melhor maneira de enfrentar um problema complicado é fracioná-lo, ou esquartejá-lo, para ficar na linguagem dos crimes lendários. A questão pode ser dividida em quatro partes. Em primeiro, não há uma relação direta entre criminalidade e crescimento. Mas é preciso resgatar uma taxa mínima de expansão da economia para gerar oportunidades de emprego e renda. Tampouco há uma relação simples entre criminalidade e escolaridade. Mas é crucial democratizar a educação para a obtenção de renda e de valores essenciais para a vida em sociedade. Em segundo, a vida econômica deve tornar-se mais transparente. A economia subterrânea é um esconderijo natural para o crime. Lembre-se de que a informalidade em várias economias latino-americanas supera 20% a 30%, chegando a 40% no caso do Brasil. Assim, o combate à informalidade ajuda indiretamente a reduzir o crime. Em terceiro, o crime não pode compensar. Isso requer elevar as probabilidades de descobrir atos criminosos, capturar os responsáveis e puni-los com rigor. A pena ótima não é necessariamente a mínima ou a máxima. Deve variar de acordo com o objetivo de tornar o crime uma aposta inequivocamente perdedora. Infelizmente, no Brasil, os incentivos estão errados. A probabilidade de um crime não ser descoberto ou de o responsável não ser capturado ou, se condenado, não cumprir a devida pena é assustadoramente alta. Em quarto, é preciso recuperar ao menos uma parcela das pessoas que cometeram crimes. Nesse ponto, é fundamental diferenciar aqueles que devem ser completamente isolados em prisões de segurança máxima daqueles que poderiam cumprir penas alternativas em benefício da sociedade. Além disso, é necessária uma estratégia de absorção do ex-criminoso no mercado de trabalho. Como seria esperável, as pesquisas sugerem enorme diferencial de salário em desfavor de trabalhadores que já foram condenados no passado. O ataque ao crime deve ocorrer nas quatro áreas simultaneamente. Não faz sentido dizer que a violência só será controlada quando houver emprego e educação para todos. Se o Brasil não consertar logo seu sistema de incentivos, o crime continuará a compensar. E isso, por si só, comprometerá qualquer esforço sério de crescer e dar oportunidades de renda e educação para o conjunto da população.
Entrevista:O Estado inteligente
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sábado, maio 27, 2006
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