O Globo |
29/5/2006 |
Em sua coluna no GLOBO de ontem, o comentarista político Merval Pereira relata idéias do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, sobre os efeitos da possível radicalização política nas próximas eleições. Apontando os obstáculos à governabilidade que se seguiriam a uma campanha truculenta, na opinião do ministro, "se a oposição conseguir virar o jogo eleitoral pregando em Lula a pecha de corrupto, não conseguirá governar tanto pela reação dos movimentos sociais quanto pela obstrução política no Congresso. Pela avaliação de Tarso Genro, se Lula vencer a eleição desgastado, também não conseguirá governar por faltar base política". Merval acena com duas interpretações. Como um pedido de trégua, a teoria do ministro pode ser interessante, por indicar a possível aproximação de duas correntes da social-democracia brasileira. Mas, interpretadas como uma ameaça, as palavras de Tarso Genro são inaceitáveis, pela admissão de que o resultado eleitoral possa ser questionado pela atuação de "movimentos sociais". O ministro entra em um terreno perigoso. A social-democracia hegemônica no país provocou o envenenamento gradual de nossa linguagem, ao recorrer ao uso do adjetivo "social" para distorcer os conceitos fundamentais do estado de direito e da justiça. O uso demagógico da palavra "social", marca registrada da social-democracia, destrói completamente o significado dos pilares de uma Sociedade Aberta. O estado de direito é o império das leis, das normas de conduta justa aplicáveis a todos os indivíduos em uma sociedade. A justiça é a exigência do cumprimento dessas leis. E, por conseqüência, a punição a seu descumprimento. Mas "justiça social" e "direitos sociais" tornaram-se exatamente a inversão da justiça e do direito, pretextos para sua violação. São fraudes semânticas da mesma estirpe que o uso da expressão "popular" para destruir o significado de democracia, como nas "democracias populares" dos antigos países comunistas. É uma legítima expressão do desejo de solidariedade dos cidadãos quando os eleitores reelegem um governo que preconiza aumentos de impostos para promover a igualdade de oportunidades e a assistência social por meio de políticas públicas de transferência de renda. Mas é inteiramente diferente e intolerável que organizações criminosas como o PCC ou equivocadas como o MST possam ameaçar vidas ou propriedades em nome dos "direitos humanos" ou da "justiça social". Ao admitir o descumprimento de leis sem punição, deformando os conceitos de direito e justiça, o próprio Estado brasileiro abriu mão de suas funções clássicas. Um Estado que gasta 40% do PIB, mas é incapaz de garantir as vidas e as propriedades dos cidadãos brasileiros. Seria uma inadmissível deformação do regime democrático que a ausência de ordem pela própria omissão do Estado permitisse aos denominados "movimentos sociais" o papel de instrumentos de chantagem e intimidação política. Uma seqüência de equívocos. A pretexto da busca de "justiça social", "movimentos sociais" violam o direito e a justiça. E agora, em nome dos "movimentos sociais", uma ameaça à liberdade de escolha eleitoral em pleno regime democrático. |
Entrevista:O Estado inteligente
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