Lula está diante de uma bela decisão de política pública, daquelas que só os presidentes podem tomar. Trata-se de definir a ossatura do programa PC Conectado, que pretende colocar 1 (ou 2) milhões de computadores nas mãos dos brasileiros de baixa renda.
As primeiras máquinas deveriam estar na rua desde dezembro passado. Depois falou-se em março. Felizmente, junho chegou e o governo não tomou uma decisão que, por megalomaníaca, pode virar um mico.
O programa prevê a fabricação e a venda de modelos de mesa por até R$ 1.400 (US$ 580). Seriam fabricados no Brasil. O preço camarada seria resultado de uma convergência do velho e bom dinheiro do BNDES com renúncia fiscal e subsídios da Viúva.
Toda vez que o governo fala em comprar 1 milhão de qualquer coisa, a patuléia deve botar a mão na carteira.
Essa cautela justifica-se porque o Media Lab do Massachusetts Institute of Technology avisa que está desenvolvendo um laptop de US$ 100. Por enquanto, não existe sequer um protótipo dessa máquina. É possível que o primeiro PC esteja montado dentro de um ano. Esse projeto revolucionário é obra de Nicholas Negroponte, um dos maiores teóricos do mundo da computação. Ele sustenta que as populações de baixa renda devem ter laptops, para que as crianças possam ir para a escola com eles. Em dois anos de uso, o computador custará menos que os livros didáticos que substituirá.
A máquina de US$ 100 depende de encomendas maciças para ficar em pé. O Media Lab conseguiu um processador de US$ 10, uma bateria de US$ 5 e acha que barateia o custo do monitor de US$ 150 para US$ 30. Rodará softwares livres. Estima-se que o governo chinês entre no negócio comprando (e fabricando) 3 milhões de computadores.
Soltar um megaprograma de financiamento de PCs que custarão R$ 1.400, quando a máquina de R$ 240 talvez esteja logo adiante pode ser uma leviandade. Travar o PC Conectado à espera do laptop do MIT pode ser uma imprudência. Um modelo de R$ 530, desenvolvido por cientistas indianos, vai mal das pernas.
Quem sabe, seja o caso de baixar a bola do espalhafato publicitário, usando-se o tamanho do mercado (e das encomendas) brasileiras, como uma alavanca para experimentar diversas possibilidades. Afinal, em matéria de informática, toda vez que o governo brasileiro pensou grande, pensou errado, torrou o dinheiro do povo, engordou donos de cartórios industriais e atrasou a vida do país.
O modo de "checar" do tucano
O PSDB está protegido pela mesma tolerância que beneficiou o PT e Lula quando estavam na oposição. No caso dos companheiros, a complacência, para não dizer cumplicidade, deu no que deu.
Faz algum tempo que o governador paulista Geraldo Alckmin apresenta-se como um crítico equilibrado e racional do governo. Teve até uma boa sacada: o tal "Custo PT". O doutor é generoso quando fala mal do governo petista e avarento quando cala a respeito do seu. Ao fato:
Graças ao repórter Alexandre Hisayasu soube-se que na noite de 14 de maio o secretário de Segurança de Alckmin, Saulo de Castro, foi jantar num restaurante e achou "inusitado" que um manobrista uniformizado manipulasse cavaletes da Companhia de Engenharia de Trânsito que obstruíam o caminho para a casa de pasto. Diante de tamanha ameaça à ordem pública, doutor Saulo telefonou para o delegado-geral e pediu para "checar aquela situação". O modo tucano de checagem resultou na ida ao restaurante da tropa de elite do Grupo de Operações Especiais.
Algemaram e prenderam o proprietário e o manobrista. (Na delegacia, verificou-se que nenhum dos dois fizera coisa errada ou inusitada.)
Imagine-se a gritaria tucana se o comissário Luiz Gushiken fizesse uma dessas. Alckmin diria (como diz) que o governo federal tem "um problema de gestão".
Juros baixos
De um sábio, talvez uma das pessoas que mais ganharam dinheiro com a taxa de juros nos últimos 30 anos: "Sabe o que aconteceria se o Banco Central baixasse os juros para 15%? Nada".
Linha Kennedy
Para quem acredita que a espécie dos presidentes (leia-se Lula) leva dívidas sentimentais para o poder (leia-se José Dirceu). Com poucas semanas de Casa Branca, John Kennedy chamou uma secretária e pediu-lhe que tomasse providências para impedir que o procurador-geral continuasse a entrar no Salão Oval sem se fazer anunciar. O procurador-geral era Robert Kennedy, seu irmão, amigo de fé, chefe de sua campanha.
Fim de governo
Se ninguém reanimar a administração, o governo fechará para balanço e só cuidará da campanha pela reeleição de Lula. A agenda do companheiro tornou-se uma operação cenográfica a serviço do mundo maravilhoso de Duda Mendonça.
Velhos tempos
Um veterano das lutas operárias dos anos 70 achou nos seus alfarrábios um exemplar dos estatutos da União Metalúrgica de Luta, a UML, organização clandestina que, em 1971, chegou a ter algo como 70 militantes nas fábricas de São Paulo. Vai mandá-la a Lula que, como ele, é aposentado da ditadura. O estatuto da UML determinava que nenhuma reunião deveria durar mais de dez minutos nem juntar mais de três pessoas. Se Lula entrar para a UML, seu governo melhora.
Por acaso
Sai em janeiro nos EUA o livro de memórias de FFHH. Chama-se "The accidental president of Brazil" (algo como "Presidente do Brasil por acaso").
Garganta fechada
O "Garganta Profunda" Michael Felt começou a vazar denúncias para o jornalista Bob Woodward em junho de 1972, um mês depois da morte, aos 87 anos, de J. Edgar Hoover, o diretor do FBI desde 1924. Felt aborreceu-se por não ter ganho o lugar do chefe e pela operação abafa dos comissários da Casa Branca. Curiosidade: se Hoover tivesse vivido mais uns meses, Felt não ousaria abrir a boca, o caso Watergate poderia ter acabado em pizza e o presidente Richard Nixon entraria na lista dos americanos famosos emparedados pelo grão-tira. John Kennedy foi fisgado pela cama. Lyndon Johnson pelo cofre de campanha. Hoover morou com a mãe até os 43 anos e, por quase quatro décadas, passou as férias com o mesmo amigo.
Adesivo
O PSDB cearense pode se transformar numa fação petista, das moderadas. Seria o Campo Tucano. Do jeito que vai, pedirá a expulsão do senador Eduardo Suplicy do PT.
Claro registro
A operadora de celulares Claro tabelou em cinco minutos o tempo que os funcionários de uma de suas centrais de chamadas podiam passar no banheiro. A juíza Divina Oliveira Jardim, da 1º Vara do Trabalho de Goiás, suspendeu a truculência e condenou a Claro a indenizar seus empregados. Poderia ter pedido aos diretores da empresa que apresentassem as planilhas com a cronometragem de suas idas ao lugar solitário.
folha de s paulo
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