As denúncias que envolvem os Correios, o IRB (Instituto de Resseguros do Brasil) e o "mensalão" causaram inicialmente um aumento da volatilidade nos mercados de ações, títulos do governo e câmbio. Investidores estavam preocupados com a paralisação da agenda econômica do governo ou mesmo com a implementação de um plano B, de caráter populista, desenhado para melhorar a imagem do governo no eleitorado.
Pode parecer então que o melhor seria se esses fatos não tivessem sido expostos, conturbando a tranqüilidade relativa dos mercados. Um corolário desse raciocínio é que é desejável que a apuração não seja muito profunda, para evitar que apareçam novos fatos perturbadores. A manobra do governo garantindo a presidência e a relatoria da CPI dos Correios seria então bem-vinda.
Na verdade, as revelações de uma investigação rigorosa poderiam servir de impulso para uma mudança na cultura política do país, tornando a corrupção menos aceitável. E tal transformação teria também um efeito positivo no nosso desempenho econômico. Embora seja difícil comparar o grau de corrupção entre os países, há evidências de que a corrupção afeta negativamente o desempenho econômico. Um estudo dos anos 90 documentou que países com um maior nível de corrupção tem menor taxa de investimento em relação ao PIB e crescem menos. Essa correlação é natural. A presença de funcionários corruptos aumenta o custo de um investimento, quando uma propina é necessária e diminui a sua atratividade, porque o empresário sabe que no futuro ele pode ser "taxado" de parte dos seus lucros. Além disso, quando um governo é corrupto, é ainda mais vantajoso dedicar energias a obter favores do Estado, em prejuízo de atividades que realmente criam riqueza.
Uma investigação exemplar e a punição dos envolvidos nos escândalos recentes são cruciais para a saúde política e econômica do país no longo prazo, mas não serão suficientes. Como disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a corrupção no Brasil "não é uma coisa nova". É preciso atacar também as fontes que geram oportunidades para episódios como esses. Precisamos de uma reforma política que aumente a fidelidade partidária, diminuindo a possibilidade de um deputado leiloar a sua entrada para um outro partido pouco depois de ter sido eleito, e que restrinja as legendas de aluguel. É necessário também diminuir a proporção de cargos públicos sujeitos à nomeação política. Mas muitas das oportunidades de corrupção, no Brasil como em outros países, estão ligadas a intervenções do Estado na economia.
O político que controla preços, subsídios, empréstimos a taxas de juros favorecidas, licenças de importação ou que comanda uma empresa estatal tem inúmeras oportunidades de ganhar dinheiro para si mesmo, para a sua futura campanha eleitoral ou para o seu partido. Há muitos exemplos de políticos e funcionários honestos que não se aproveitam dessas ocasiões. Mas a possibilidade de corrupção é mais uma razão para que as intervenções do Estado na economia só ocorram para corrigir falhas relevantes do mercado ou quando tenham uma verdadeira função social.
O monopólio estatal de resseguros exercido pelo IRB é um dos muitos exemplos no nosso país em que nenhuma dessas condições é preenchida. Por isso, o projeto do governo de acabar com o monopólio estatal no setor de resseguros e de vender a carteira de operações do IRB é uma boa nova, mas precisa ser seguido por muitas outras iniciativas no mesmo sentido, se quisermos diminuir a prevalência da corrupção.
José Alexandre Scheinkman, 57, professor de economia na Universidade Princeton (EUA), escreve quinzenalmente aos domingos nesta coluna.
E-mail -
Nenhum comentário:
Postar um comentário