o globo
A perigosa escalada da radicalização política que teve ontem, no plenário da Câmara, sua explicitação nas agressões morais e físicas entre deputados, estava sendo plantada desde que o hoje deputado federal José Dirceu se despediu da Casa Civil da Presidência ressaltando seu passado de guerrilheiro e dizendo que voltava à Câmara para defender o mandato do presidente Lula de uma campanha de desestabilização institucional. Dirceu lançou ali o chamamento aos "movimentos sociais", para que saíssem às ruas em defesa do governo popular, contra uma suposta conspiração das elites.
Ganhava corpo naquele momento a fantasiosa denúncia de que está em marcha uma tentativa antidemocrática de interromper o governo do presidente Lula, uma manobra defensiva para unir os militantes do partido contra as denúncias de corrupção que atingem o governo e que têm em Dirceu o principal alvo político.
Acontece que, para isso, é preciso voltar aos velhos tempos do PT e imaginar um complô das elites contra um governo de esquerda. Como já escreveu Veríssimo, falta o governo de esquerda. E falta também a elite opositora, já que as denúncias nasceram de um presidente de partido aliado, o deputado Roberto Jefferson, do PTB, e o que as elites políticas e econômicas estão fazendo claramente é tentar separar a figura do presidente da República do escândalo, com a intenção de blindar a economia, única parte do governo que está dando certo, do ponto de vista das elites.
Mais uma vez, na transmissão de cargo para a ministra Dilma Rousseff, Dirceu chamou-a de "companheira de armas" — a ministra foi guerrilheira da Colina e tem entre seus feitos o roubo do cofre do ex-governador paulista Adhemar de Barros — ressaltando o passado guerrilheiro de ambos, como se ele fosse mérito suficiente para assumir qualquer cargo no governo.
Ontem, o discurso de retorno à Câmara do deputado José Dirceu foi ameno, não teve o tom das últimas provocações. Mas o clima em que ele transcorreu foi de tensão. O ex-chefe da Casa Civil chegou à Câmara cercado por um grupo barulhento de militantes, com bandeiras vermelhas do PT e palavras de ordem agressivas, logo comparados às brigadas "chavistas" pela oposição.
Os militantes ocuparam parte das galerias e passaram a interferir na sessão da Câmara, recebendo apoio de alguns deputados, que também levavam bandeiras do PT e também gritavam palavras de ordem, a ponto de o presidente Thomaz Nonô ter ameaçado evacuar as galerias ainda no início dos trabalhos.
Nos jardins do Congresso, um movimento de militares exigindo aumento de salário pedia o "impeachment" do presidente Lula. Lá dentro, a provocação do deputado Jair Bolsonaro, conhecido radical ligado a setores militares da linha dura, interrompendo aos berros o discurso de Dirceu chamando-o de terrorista, foi o que bastou para transformar o plenário da Câmara num ringue, jogando por terra o que restava da credibilidade dos políticos.
O radicalismo petista, adormecido desde a campanha eleitoral, está de volta nos últimos dias como tática de luta contra as denúncias de corrupção que atingem o governo, e encontra como contrapartida o radicalismo da direita. Até mesmo o presidente Lula, no discurso de terça-feira em Luiziânia, adotou um tom messiânico, afirmando que ninguém mais do que ele tem "autoridade moral e ética" para combater a corrupção e jogando para o Congresso a culpa pela existência do mensalão, como se os votos dos deputados eventualmente comprados não tivessem a finalidade de dar apoio ao seu governo.
Lula retomou por instantes, diante de sindicalistas, o tom populista com que falava quando era líder operário. Todo esse ritual de guerra que o PT está montando para sua defesa, no entanto, tem contradições básicas com a figura do Lula "paz e amor" que apareceu na campanha presidencial sob a batuta do publicitário Duda Mendonça, responsável pela nova imagem política que ganhou as eleições graças à classe média nacional.
Foi esse Lula, o da conciliação e da negociação, que venceu a eleição, não o líder radical derrotado três vezes, rejeitado pelo eleitorado. A base partidária heterogênea que o governo montou no Congresso, e da qual o ex-ministro José Dirceu disse ontem que não se arrependia, é a mesma que está sendo acusada de ter sido formada por meio do mensalão, gerando a maior crise política deste governo.
Ao mesmo tempo em que os chamados "movimentos sociais" dão apoio ao governo, exigem em troca mudanças na política econômica. Mas o governo sabe que não há espaço na sociedade para mudanças desse tipo. Seu apoio inviabilizou, também, o enxugamento da máquina estatal, pois o presidente já desistiu de extinguir as diversas secretarias que representam minorias com status de ministério.
Enquanto a claque de Dirceu fazia algazarra nas galerias da Câmara, ele citava como méritos do governo Lula justamente os êxitos da política econômica. E, por cúmulo, o radical da direita Bolsonaro, que, com suas provocações conseguiu tumultuar a sessão de volta de Dirceu à Câmara, é o mesmo que recebeu recentemente do Ministério da Defesa do governo Lula a "Medalha do Pacificador", uma das maiores condecorações brasileiras.
Mais do que nunca, as contradições do governo Lula estão sendo responsáveis pelos desdobramentos da crise política que se instalou no país.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
junho
(405)
- Governo de coalizão ou monopólio político?
- Augusto Nunes - Especialista em retiradas
- Miriam Leitão :Melhor em 50
- Merval Pereira :Radicalizações
- Sai daí, Henrique, rápido!-PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
- LUÍS NASSIF:O ajuste fiscal da Fiesp
- Lula lança pacote anticorrupção "velho"
- JANIO DE FREITAS :Um escândalo no escândalo
- ELIANE CANTANHÊDE:ELIANE CANTANHÊDE
- CLÓVIS ROSSI:O Pinóquio da estrela vermelha
- A CADA DIA MAIS GRAVE editorial da folha
- Caixa dois de Furnas engorda propinas do PT, diz J...
- Lucia Hippolitto: Quem manda na República
- Cunhado de Gushiken fatura mais com estatais
- Guilherme Fiuza:Dilma, uma miragem
- Lucia Hippolitto:PMDB nada tem a ganhar se unindo ...
- Villas Boas Lula está sempre atrasado
- DESASTRE POLÍTICO editorial da folha de s paulo
- Fernando Rodrigues - Descontrole quase total
- Merval Pereira - Quadro instável
- Míriam Leitão - Déficit zero
- Tereza Cruvinel - Reforma, apesar da recusa do PMDB
- Luís Nassif - O Grupo "Máquinas e Planilhas"
- Dora Kramer - Publicidade na Câmara
- CLÓVIS ROSSI: O velho morreu, viva quem?
- Tereza Cruvinel - A CPI decola
- Dora Kramer - Casa, comida e roupa lavada
- Lucia Hippolito:"O mistério é pai e mãe da corrupção"
- Um original criador de bois
- LUÍS NASSIF: O tsunami e a economia
- O despertar da militância
- ELIANE CANTANHÊDE:Cadê a mentira?
- CLÓVIS ROSSI: Desânimo continental
- QUEBRA DE PATENTE editorial da folha de s paulo
- AUGUSTO NUNES :Governar é decidir, presidente
- O Congresso não enxerga o abismo -AUGUSTO NUNES
- Luiz Garcia :Falemos mal dos outros
- Arnaldo Jabor :Houve mais uma revolução fracassada
- Miriam Leitão :No descompasso
- Merval Pereira:Normas para a Polícia Federal
- Crise pode afetar a governabilidade
- O dicionário da crise
- A aula magna da corrupção
- O assalto ao Estado
- O homem do dinheiro vivo
- Muito barulho por nada
- Os cofrões do "Freddy Krueger" A ex-mulher de Vald...
- Irresponsabilidade aprovada
- Diogo Mainardi:Dois conselhos ao leitor
- André Petry:Os cafajefferson
- GESNER OLIVEIRA:Agenda mínima para 2005/06
- SERGIO TORRES :Quem sabe?
- FERNANDO RODRIGUES:Gasto inútil
- CLÓVIS ROSSI :A culpa que Genoino não tem
- LULA NA TV editorial da folha de s paulo
- JOÃO UBALDO RIBEIRO :Já não está mais aqui quem falou
- ELIO GASPARI:Circo
- Miriam Leitão :Cenário pior
- O PT e o deslumbramento do poder
- Luiz Carlos Mendonça de Barros : vitória sobre a i...
- Merval Pereira :Controles frouxos
- Ricardo Kotscho:Navegar é preciso
- Villas-Bôas Corrêa:Com CPI não se brinca
- Merval Pereira - Traição e ingratidão
- Míriam Leitão - Diagnósticos
- Luiz Garcia - Onze varas para onze mil virgens
- Celso Ming - Você é rendeiro?
- Tereza Cruvinel - Uma brisa
- Luís Nassif - Te direi quem és!
- Clóvis Rossi - Vergonha
- Eliane Cantanhede - Ao rei, quase tudo
- Dora Kramer - O sabor do prato servido a frio
- entrevista Marcos Coimbra - blg noblat
- Lucia Hippolito :Crise? Que crise?
- augusto nunes Palavrório na estratosfera
- Lucia Hippolito : A face mais bonita da esquerda
- JANIO DE FREITAS: Palavras em falta
- DEMÉTRIO MAGNOLI:Fim de jogo
- CLÓVIS ROSSI :Bravata ontem, bravata hoje
- Miriam Leitão :Estilo direto
- Merval Pereira :Contradições
- Dora Kramer - Aposta no país partido
- Lucia Hippolito : O risco da marcha da insensatez
- Fim de mandato?-PAULO RABELLO DE CASTRO
- ANTONIO DELFIM NETTO:Coragem política
- PLÍNIO FRAGA :O super-homem e a mulher-macho
- FERNANDO RODRIGUES:A utilidade de Roberto Jefferson
- CLÓVIS ROSSI :O torturador venceu
- ABUSOS DA PF folha editorial
- zuenir ventura Haja conselhos
- ELIO GASPARI:Ser direito dá cadeia
- Merval Pereira :Em busca de saídas
- Miriam Leitão : Reações do governo
- Zuenir Ventura:Choque de decência
- Lula:"Os que torciam pelo desastre do governo teme...
- Dora Kramer - A repetição do erro na crise
- LUÍS NASSIF:Os conselhos fatais
- JANIO DE FREITAS :Cortina de fumaça
- ELIANE CANTANHÊDE:Direto de Marte
- CLÓVIS ROSSI:Olhando além do pântano
-
▼
junho
(405)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA
Nenhum comentário:
Postar um comentário