O Globo |
24/6/2005 |
No tempo antigo, era fácil distinguir heróis de vilões. Pelo menos nos filmes em série e nos westerns clássicos de diretores como Ray Nazarro (crianças da platéia, mais detalhes com seus avós), bandidos usavam coletes escuros e negros bigodes, enquanto mocinhos tinham a cara raspada, sorriso brilhante e pontaria certeira. No presente tiroteio, como saber? Dirceu tem o olhar decidido e agressivo do defensor de órfãos e frágeis donzelas, Genoino ostenta o semblante franco do amigo do mocinho, Lula oferece o olhar sincero — meio atarantado às vezes, mas sempre sincero — do ingênuo que todos desejam proteger. Do outro lado da cerca, o untuoso Jefferson é o clássico vilão que expulsa de casa a heroína no meio da nevasca. Só falta em cena alguém com a fragilidade da mocinha: lamentavelmente o diretor de elenco certamente rejeitaria a candidatura da Rousseff — só, claro, por não ser lourinha e frágil. Melhor assim, talvez. Parece mais seguro nada decidir com base no tipo físico — ou, para começar a falar sério, apenas no discurso. Principalmente no discurso. Em tempo de guerra, sempre se soube, mentira é como terra. Parece mais prudente, para quem busca o meio caminho entre o comodismo da ingenuidade absoluta e a tentação do catastrofismo, aceitar algumas premissas. Não cegamente, apenas como hipóteses de trabalho. Por exemplo: 1. O governo Lula assumiu o poder com um balaio de boas intenções e frágil, ou inexistente, projeto de governo. Belos comerciais do Duda Mendonça relacionando promessas podem refletir sinceras aspirações, mas não programas de trabalho. Só por curiosidade, quem menos aparecia nos comerciais era o discreto Palocci — que tinha um projeto e se lançou a cumpri-lo. 2. O governo Lula não achou necessário imunizar-se contra as sereias de Brasília, talvez por não perceber que a diferença entre administrações regionais e o poder nacional não é apenas de tamanho, mas — e principalmente — de qualidade. Ou de massa. 3. O governo Lula não entendeu que toda aliança tem um preço — e nenhum é mais perigoso do que acabar parecido com o aliado. Considerar-se acima de contágio é talvez uma das formas mais perigosas de vaidade. Isso a que estamos assistindo hoje parece ser precisamente o resultado dessa falta de cuidados. Dirceu usou Valdomiro, e descartou Valdomiro quando este foi detonado — mas se esqueceu de providenciar punição do delito, sem perceber que simplesmente descartar não era suficiente processo de purificação. O PT comprou o PTB — aceitando-se, por generosidade, que o fez para melhor governar, visando ao bem do país etc., etc. — e jamais entendeu que no processo estava sendo comprado pelo PTB. Ou comprando a cara do PTB, o que dá no mesmo. Assim por diante. Esta tosca tentativa de explicação para a camisa de onze varas em que se meteram as onze mil virgens que hoje nos governam é deliberadamente otimista: ninguém está falando em contas no Caribe nem em grana para o bolso dos principais atores em cena. Nada até agora sequer sugere tal ilação. E sempre resta a esperança de que o país saia dessa. Afinal, sempre me pareceu que, fora o Delúbio, nenhum dos protagonistas — nem Lula, nem Dirceu, nem Genoino — tem bigodes virtuais muito parecidos com os dos bandidos daqueles antigos bangue-bangues. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, junho 24, 2005
Luiz Garcia - Onze varas para onze mil virgens
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