Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 28, 2005

Tereza Cruvinel - A CPI decola



Panorama Político
O Globo
28/6/2005

Hoje mesmo a CPI dos Correios deve quebrar o sigilo bancário, fiscal e telefônico de Marcos Valério, dando curso à investigação sobre o mensalão. A decisão deve ser tomada antes mesmo do depoimento do publicitário, em função das revelações sobre sua alta movimentação bancária em dinheiro vivo. A própria oposição avalia que está superado, por ora, o risco de uma CPI "chapa branca" ou controlada pelo governo.

Este, ainda que insistindo na instalação de uma CPI exclusiva para investigar o suposto pagamento de mesada a deputados, no âmbito da Câmara, sabe que os freios foram rompidos e que agora não há mais volta. O caso dos Correios e o mensalão se encontraram na CPI mista e ali mesmo serão investigados conjuntamente.

Os líderes Alberto Goldman (PSDB), seu primeiro vice, Eduardo Paes, e Rodrigo Maia (PFL) avaliavam positivamente ontem a conduta do presidente da CPI, o senador petista Delcídio Amaral, e do relator, o peemedebista Osmar Serraglio.

— A seguirmos nesta linha, com as investigações avançando e a CPI funcionando em julho, poderemos até fazer um acordo com o governo para aprovar a LDO até o dia 30 — diz Eduardo Paes.

Com isso, o Congresso entrará em recesso reduzindo a toxicidade do ambiente político.

CPIs são assim, como já dizíamos aqui no auge da histeria por conta da escolha do relator e do presidente: ganham dinâmica própria, impulsionadas pelos fatos, pelas revelações que vão se encaixando, pelos depoimentos e, na última fase, pela quebra de sigilos. O de Marcos Valério, segundo Eduardo Paes, poderá ser quebrado hoje porque sua movimentação financeira anormal, R$ 20,8 milhões em dinheiro vivo no espaço de dois anos, foi atestada por documentos do Coaf, o órgão federal que acompanha movimentações financeiras suspeitas. Valério tornou-se a partir desta revelação o suspeito mais importante de atuar numa dupla conexão, relacionada tanto com o financiamento de campanhas como a um suposto pagamento de mesada a deputados. Como mostrou no domingo a reportagem de Regina Alvarez no GLOBO, tornou-se também personagem importante de uma rede de favorecimentos a agências de publicidade.

Estão marcados para hoje os depoimentos dos produtores da fita que mostrou o ex-funcionário dos Correios Maurício Marinho embolsando propina e confessando manipulação de licitações. Eles devem esclarecer melhor o que se passava na estatal.

Ao presidente Lula, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, informou ontem o andamento dos inquéritos sobre irregularidades no IRB (na delegacia da Polícia Federal do Rio de Janeiro) e nos Correios (conduzido pela delegacia de Brasília). Agora foi aberto um terceiro, em Belo Horizonte, para investigar a conexão Marcos Valério. A ordem do presidente, diz o ministro, é avançar e colaborar com a CPI. De sua parte, continua dizendo que nada teme e a ninguém tentará proteger. Que corra, portanto, toda a água suja represada.

Sobre o que vai na alma de Lula

Depois do desabafo de Luziânia, na terça-feira passada, o presidente Lula vem falando e agindo com visível esforço para manter a racionalidade e controlar as emoções. Muito se tem dito sobre seu estado de alma, inclusive sobre queixas e decepções que estaria manifestando em relação a uns e outros. É certo que ele achava recomendável o afastamento temporário do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e do secretário-geral, Silvio Pereira, até a conclusão das investigações. O diretório nacional optou por mantê-los nos cargos, com apoio de Dirceu e José Genoino. Uma decisão que contraria a severidade do PT em questões de disciplina. Um deslize ético seria a maior das indisciplinas, pois teria atentado contra o patrimônio mais valioso do partido.

Quem conhece Lula sabe o quanto ele é reservado ao falar de amigos. Dificilmente verbalizaria queixas contra Dirceu e outros, embora tenha, por exemplo, evitado comparecer à transmissão de cargo para a ministra Dilma Rousseff, último ato de Dirceu como ministro. Foi convencido por Dilma e Jaques Wagner a descer mas não discursou.

É razoável supor que lamente (ou se arrependa de) não ter acompanhado melhor as relações com os aliados. Ele mesmo, no discurso de avaliação de seu primeiro ano de governo, no final de 2003, afirmou não conhecer todos os acordos que Dirceu fazia no Congresso, reiterando sua plena confiança nele. É certo que agora tem procurado ampliar o número de conselheiros e oxigenar a coordenação de governo com outras presenças, mas sem lhe dar o caráter de gabinete de crise. Está mais empenhado em demonstrar que o governo mantém sua dinâmica enquanto as investigações transcorrem.

Ontem ele teve um dissabor com as afirmações peremptórias do senador ACM, de que "sabia de tudo". E uma satisfação na conversa com o governador de Minas, Aécio Neves, que se mantém na linha adotada desde o início: defesa da figura do presidente, de rigor nas investigações mas de mãos estendidas para garantir a governabilidade. Tudo que Lula queria ouvir.

SE A MAIORIA dos governadores do PMDB é contra mas a maioria dos deputados e senadores é a favor de um acordo com Lula, ficará tudo como antes no quartel de Abrantes: o governo contando com o apoio parcial do partido e dando-lhe também participação proporcional no Ministério. Lula recebe hoje o governador gaúcho, Germano Rigotto, que vai tratar das queixas dos arrozeiros contra a concorrência uruguaia. Mas começará com ele seu esforço verbal para convencer os governadores.

A MINISTRA Dilma Rousseff escolheu outra mulher para o segundo posto de comando na Casa Civil. É Erenice Alves Guerra, que coordenava a área jurídica no Ministério das Minas e Energia.

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