A vitória sobre a inflação
Folha de S. Paulo (24/06/05)
Se não ocorrer algum desastre político, devemos iniciar o próximo ano com uma inflação anual da ordem de 5%. Os índices no ano civil de 2005 devem apresentar um número um pouco maior, algo como 5,9%, nas previsões do economista Fabio Ramos, que trabalha comigo na Quest. Menino inteligente e competente técnico na tarefa de acompanhar o vai e vem dos preços, aprendi em poucos meses a confiar em seu trabalho. Por isso, assumo aqui suas conclusões e faço esta minha reflexão a partir de suas previsões.
Um primeiro ponto a ser ressaltado é o reconhecimento de que o Banco Central realizou, com êxito, sua missão de estabilizar os preços, depois de anos de combate a uma inflação que, em vários momentos, parecia fugir ao controle. Basta olhar para o resultado dos últimos três anos, para ficar nítida essa observação: a inflação ao consumidor brasileiro foi de 7,6%, em 2004, cerca de 5,9%, este ano, e será algo como 5% em 2006. Ao fixar a meta de inflação para 2007 – 4,5%, com intervalo de mais ou menos 2% – o governo sinaliza que chegamos a um estágio de equilíbrio.
Deixando de lado o imponderável, como citei no início desta coluna, o próximo Presidente da República deve assumir o comando do país com uma inflação estabilizada em níveis ditos civilizados. Uma consolidação definitiva do caminho iniciado em 1994, com o Plano Real. Foi um longo período, com custos extraordinários para a sociedade brasileira, mas esse verdadeiro corredor polonês, que se iniciou, em 1975, enfim terminou.
Não podemos agora cair na tentação da euforia da vitória, devemos ser capazes de aprender com as dificuldades que passamos e com os erros que cometemos para enfrentar os enormes desafios que precisamos encarar. Uma primeira observação se impõe ao analista cuidadoso. Chegamos a essa nova situação com os juros mais elevados do mundo e uma conta financeira em nosso orçamento federal que inviabilizam o crescimento econômico sustentado.
A necessidade de se gerar superávit primário, da ordem de 5% do PIB, acabou por nos levar a ter uma carga tributária incompatível com uma economia de mercado como a brasileira. Outro aleijão criado – juros altos por um prazo tão longo – levou à redução dos gastos de investimentos do governo a níveis insustentáveis.
Outra conseqüência importante dessa dependência a juros elevadíssimos, principalmente a partir do aumento da credibilidade de nossa política econômica, foi a valorização de nossa moeda. O valor do real hoje não é estável, pois reflete apenas o diferencial de juros que existe entre nosso país e outras economias de mercado.Como explicar que o real tenha se valorizado, nos últimos doze meses, 22% em relação ao dólar de Cingapura, 13% em relação ao won coreano, e 26% em relação ao franco suíço, se não pelo diferencial de juros?
Reduzir os juros brasileiros, para níveis também civilizados, é o grande desafio que o governo Lula vai deixar a seu sucessor. Será uma batalha tão difícil como foi a luta contra a inflação. Para vencê-la, será preciso uma leitura profunda das distorções institucionais e do comportamento dos principais agentes envolvidos na dinâmica financeira de nossa economia. Até agora, o que temos visto são avaliações parciais e superficiais, mas de muito Ibope. Uma delas, associa nossos juros elevados à questão dos impostos cobrados no sistema financeiro; outra, à questão contratual e do funcionamento de nossa Justiça.
Ambos são problemas a serem enfrentados, mas não representam a questão central desse enorme desafio. Meu irmão José Roberto, analista cuidadoso e profundo de nossas questões econômicas, costuma desqualificar a escola que associa a questões de contrato e justiça os juros elevados no Brasil, com uma pergunta muito simples: por acaso, o Equador, a Colômbia e o Peru não têm o mesmo problema de insegurança jurídica? E os juros nesses países são normais.
Proponho um minuto de nosso tempo para parabenizar o BC e o restante do ano para refletir sobre a questão dos juros no Brasil.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 62, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Um primeiro ponto a ser ressaltado é o reconhecimento de que o Banco Central realizou, com êxito, sua missão de estabilizar os preços, depois de anos de combate a uma inflação que, em vários momentos, parecia fugir ao controle. Basta olhar para o resultado dos últimos três anos, para ficar nítida essa observação: a inflação ao consumidor brasileiro foi de 7,6%, em 2004, cerca de 5,9%, este ano, e será algo como 5% em 2006. Ao fixar a meta de inflação para 2007 – 4,5%, com intervalo de mais ou menos 2% – o governo sinaliza que chegamos a um estágio de equilíbrio.
Deixando de lado o imponderável, como citei no início desta coluna, o próximo Presidente da República deve assumir o comando do país com uma inflação estabilizada em níveis ditos civilizados. Uma consolidação definitiva do caminho iniciado em 1994, com o Plano Real. Foi um longo período, com custos extraordinários para a sociedade brasileira, mas esse verdadeiro corredor polonês, que se iniciou, em 1975, enfim terminou.
Não podemos agora cair na tentação da euforia da vitória, devemos ser capazes de aprender com as dificuldades que passamos e com os erros que cometemos para enfrentar os enormes desafios que precisamos encarar. Uma primeira observação se impõe ao analista cuidadoso. Chegamos a essa nova situação com os juros mais elevados do mundo e uma conta financeira em nosso orçamento federal que inviabilizam o crescimento econômico sustentado.
A necessidade de se gerar superávit primário, da ordem de 5% do PIB, acabou por nos levar a ter uma carga tributária incompatível com uma economia de mercado como a brasileira. Outro aleijão criado – juros altos por um prazo tão longo – levou à redução dos gastos de investimentos do governo a níveis insustentáveis.
Outra conseqüência importante dessa dependência a juros elevadíssimos, principalmente a partir do aumento da credibilidade de nossa política econômica, foi a valorização de nossa moeda. O valor do real hoje não é estável, pois reflete apenas o diferencial de juros que existe entre nosso país e outras economias de mercado.Como explicar que o real tenha se valorizado, nos últimos doze meses, 22% em relação ao dólar de Cingapura, 13% em relação ao won coreano, e 26% em relação ao franco suíço, se não pelo diferencial de juros?
Reduzir os juros brasileiros, para níveis também civilizados, é o grande desafio que o governo Lula vai deixar a seu sucessor. Será uma batalha tão difícil como foi a luta contra a inflação. Para vencê-la, será preciso uma leitura profunda das distorções institucionais e do comportamento dos principais agentes envolvidos na dinâmica financeira de nossa economia. Até agora, o que temos visto são avaliações parciais e superficiais, mas de muito Ibope. Uma delas, associa nossos juros elevados à questão dos impostos cobrados no sistema financeiro; outra, à questão contratual e do funcionamento de nossa Justiça.
Ambos são problemas a serem enfrentados, mas não representam a questão central desse enorme desafio. Meu irmão José Roberto, analista cuidadoso e profundo de nossas questões econômicas, costuma desqualificar a escola que associa a questões de contrato e justiça os juros elevados no Brasil, com uma pergunta muito simples: por acaso, o Equador, a Colômbia e o Peru não têm o mesmo problema de insegurança jurídica? E os juros nesses países são normais.
Proponho um minuto de nosso tempo para parabenizar o BC e o restante do ano para refletir sobre a questão dos juros no Brasil.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 62, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
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