Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Celso Ming - Doença braba



O Estado de S. Paulo
13/2/2007

O que era só uma cisma, começa a ganhar foros de certeza. Cada vez mais analistas percebem que a economia brasileira vai mergulhando na doença holandesa.

O primeiro a chamar a atenção para o problema foi o economista Yoshiaki Nakano, em meados de 2005, então mais como pergunta do que como afirmação. Agora, aumenta diariamente a manifestação dos sintomas.

A doença holandesa surgiu nos anos 70, quando descobriram-se vastas jazidas de gás natural no Mar do Norte, produto que a Holanda passou a exportar. Foi tamanha a receita em dólares que o florim (moeda do país na época) se valorizou e tirou competitividade da indústria.

Há ao menos três anos economistas e analistas no Brasil atribuem a atual valorização do real aos juros internos, altos demais, que estariam atraindo capitais especulativos. Mas, aos poucos, rendem-se às evidências de que o principal responsável é a exuberância das exportações, alavancadas pela alta das commodities agrícolas, que cruzam mares para matar a fome por matérias-primas dos emergentes asiáticos.

Neste ano, outro fator tende a aprofundar a doença e a queda do dólar: a onda dos biocombustíveis. O governo Bush, que fez o jogo das multinacionais do petróleo contrárias aos combustíveis alternativos, descobriu que os americanos estão viciados (oil addicted) e que a redenção exige investimentos em etanol, que eles produzem a partir do milho.

A decisão inicial calcou-se sobre fundamentos geopolíticos: reduzir a dependência americana de suprimentos de países hostis. Agora é exigida também por questões ambientais: reduzir as emissões de CO2, responsáveis pelo aquecimento do Planeta.

De setembro para cá, o desvio de milho para a produção de etanol nos Estados Unidos provocou alta de 61% nos preços em Chicago e arrastaram em 32% os preços da soja, que substituiu o milho nas rações animais. O etanol estará nas negociações previstas para março, quando Bush e Lula se encontrarão em São Paulo.

Ainda são enormes os entraves à exportação de álcool, mas a nova demanda tenderá a reduzi-los. No ano passado, o complexo sucroalcooleiro exportou 66,7% a mais do que em 2005, como está na tabela. Mas as vendas devem dar novo salto, como ontem advertiu à Agência Estado o professor José Roberto Mendonça de Barros, da consultoria MB Associados. As exportações deverão ser reforçadas pela alta do milho, do complexo soja e das carnes.

Hoje há mais elementos do que há dois anos para entender que a doença holandesa está tomando corpo. E, conforme os juros seguirem caindo, ficará reforçada a idéia de que será cada vez mais difícil reverter a valorização do real, que tira competitividade da indústria nacional.

Há dois tratamentos para doença holandesa, ambos capazes de produzir estrago. O primeiro é aumentar as importações, o que implica redução de tarifas alfandegárias. O outro é impor confisco (Imposto de Exportação) sobre as vendas externas de produtos agrícolas. É também uma saída ruim, que desestimularia investimentos no agronegócio.

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