Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 13, 2007

As agências na Constituição


editorial
O Estado de S. Paulo
13/2/2007

O Congresso poderá oferecer, em breve, uma boa notícia para empresários dispostos a investir em obras e serviços de infra-estrutura, como rodovias, telecomunicações e energia elétrica. Senadores do governo e da oposição entraram em acordo para votar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) destinada a garantir a autonomia operacional e financeira das agências reguladoras. O projeto, de autoria do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), tramita desde 2003 e só não foi votado em 2005 por causa de emendas apresentadas por senadores governistas. Foi preciso recomeçar o percurso e, amanhã, finalmente, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deverá votá-lo. Se a combinação for mantida, o assunto será submetido em pouco tempo ao plenário. Serão necessárias duas votações em cada Casa do Congresso e o caminho ainda pode ser acidentado, mas, neste momento, algum otimismo parece justificar-se.

O governo tucano optou pela criação de agências, nos anos 90, para dar segurança aos investidores e aos consumidores quanto à regulamentação e à fiscalização de serviços de utilidade pública prestados pelo setor privado em regime de autorização, permissão ou concessão. As agências seriam órgãos de Estado, não de governo. Seus diretores, indicados essencialmente com base em critérios técnicos, teriam mandatos, de preferência não coincidentes com os do presidente da República, e disporiam de condições funcionais e financeiras para trabalhar com autonomia administrativa e decisória.

O sistema havia sido testado com êxito noutros países. Não era novidade, portanto, e os motivos para adotá-lo eram particularmente relevantes no caso do Brasil. Seria vantajoso tanto para os investidores quanto para os consumidores e para todo o setor produtivo a criação de um ambiente de regras estáveis, contratos dignos de confiança e programas de infra-estrutura imunes, tanto quanto possível, às mudanças de humores e de interesses político-partidários de ministros e até do presidente da República.

Antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, políticos do PT já se empenharam em bombardear o sistema. Instalado o governo, intensificou-se o combate à autonomia das agências. Em novembro de 2003, antes de completado o primeiro ano de mandato do presidente Lula, o senador Tasso Jereissati apresentou a PEC 81, para definir com clareza o status e as funções das agências reguladoras.

Nessa proposta, as agências são apresentadas como 'órgãos de Estado sujeitos ao regime autárquico especial'. Teriam quadro próprio de pessoal e independência funcional, decisória, administrativa e financeira. Seus diretores teriam mandato estável e seriam indicados com base em 'notória capacidade técnica e reputação ilibada'.

Nos anos seguintes, enquanto o projeto tramitava, o governo esmerou-se em fazer o contrário de todas as suas prescrições. Enfraqueceu financeiramente as agências. Contestou suas decisões. Politizou a nomeação de diretores. Indicou pessoas notoriamente despreparadas. Deixou vagas, por longo tempo, muitas diretorias, impedindo o trabalho deliberativo das agências.

O acordo entre governistas e oposicionistas, no Senado, para a votação da PEC 81 é uma surpresa em princípio animadora. Se o projeto for aprovado com a redação atual, Congresso e Executivo darão um passo importante para modernizar a gestão pública no Brasil. O avanço será especialmente notável, depois da experiência dos últimos quatro anos. Nesse período, houve intenso aparelhamento do governo federal, tanto nos ministérios quanto nos organismos da administração indireta. Em diversas áreas a gestão foi ideologizada, com indisfarçáveis prejuízos para a economia brasileira.

O acordo sobre a tramitação da PEC no Senado não garante a aprovação do projeto em seu estado atual. Mas permite desemperrar o processo e justifica certo otimismo quanto ao resultado final. Inscrever na Constituição o status e o papel das agências pode aumentar consideravelmente a segurança de investimentos muito importantes para o País. Mas não será nenhuma surpresa se o projeto encalhar na Câmara ou acabar desfigurado por emendas de caráter ideológico. É cedo para comemorar.

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