Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, novembro 09, 2006

Villas-Bôas Corrêa A novidade dura pouco



Da curta e reconfortante temporada de férias no litoral baiano, com a família e a corriola dos amigos de fé e a facilidade do transporte em plena crise do setor, graças ao Aerolula e à prioridade de fura-fila, o presidente reeleito retornou com a pose e o programa de estadista.

Assessores palacianos, petistas e satélites espantam-se com o novo estilo anunciado por Lula de assumir pessoalmente, sem delegação ou intermediários, os entendimentos para a remontagem do ministério pelo critério político da distribuição de fatias do bolo entre os aliados que se comprometam a assegurar o apoio no Congresso para a aprovação das reformas que dormem o sono letárgico dos quatro anos do primeiro mandato. E passando do palavrório à ação - o que já é uma novidade e tanto - o presidente passou horas trancado no seu gabinete no terceiro andar do Palácio do Planalto, em reunião com o chamado núcleo duro (porque verga, mas não quebra), transmitindo as novas ordens e estratégias para o show de obras, de avanços sociais no salto acrobático do desenvolvimento com a inflação sob controle e o PIB em disparada de foguete interplanetário.

Convém esperar e ver para crer. Não que se questione as louváveis intenções presidenciais. Mas a experiência adverte que não se muda o temperamento como quem troca as meias e, com a agravante dos 61 anos que misturam a infância sofrida à juventude bafejada pela ascensão vertiginosa do líder sindical, fundador e presidente do PT, deputado federal, quatro vezes candidato à Presidência da República, eleito e reeleito.

Lula procura fazer o dever de casa, mesmo com todos os dissabores. Ainda agora, na euforia dos 58 milhões de votos, colhe as amofinações de advertências azedas. Em série: o penúltimo lugar, à frente apenas do Haiti, no campeonato anual da ONG Transparência Internacional, entre os 166 países mais corruptos do mundo; a bagunça do sistema de controle dos aeroportos e, para fechar o soneto com chave de latão, a denúncia, com a autoridade do levantamento do Instituto Sócio-Ambiental (ISA) da disparada do desmatamento na Amazônia, que aumentou nos quatro anos do governo Lula, mesmo com a queda de 30% badalados pelos sinos oficiais. O recorde lulista registra 84,4 mil km² de florestas derrubadas. No patamar deste ano, o desmatamento alucinado abateu 13.137 km² da mata amazônica, o que equivale a 1,5 km² por hora ou cinco campos de futebol por minuto. No total a Amazônia perdeu uma área maior que Bahia, Pernambuco e Alagoas juntos e é responsável pela emissão de mais de 60% de carbono.

Mas a hora é de esperança, de alma leve com as promessas e os sinais de mudanças de hábitos e costumes do grande vitorioso. De plantão no gabinete, mexe as peças no xadrez de 32 casas do superministério. Em marcha batida, a tropa do PMDB unido oferece o que tem de melhor nos seus quadros para compor a seleção do segundo mandato: Jader Barbalho, Newton Cardoso, Orestes Quércia e outros de biografias comparáveis.

Quanto às otimistas mudanças no estilo Lula de tocar o governo não se deve cultivar o canteiro do otimismo com as sementes de boas intenções. Não se muda o modo de ser forjado ao longo da vida de muitas lutas. Lula prisioneiro do Planalto em intermináveis serões em seu gabinete, horas emendadas de discussão sobre projetos, lendo, estudando calhamaços de processos, é inimaginável.

O presidente deve ter sabido que o ditador e presidente Getúlio Vargas, como registrou nas 2 mil páginas de seu diário, foi um burocrata exemplar que despachava na solidão de seu gabinete, em serões que entravam pela madrugada, pilhas de processos.

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