Memórias de Hélio Bicudo são
retrato do Brasil do século XX
Fernando Donasci/Folha Imagem |
Bicudo: luta pelos direitos humanos |
O jurista Hélio Bicudo nasceu em 1922 e cresceu num Brasil que passava por profundas transformações. Testemunhou os acontecimentos cruciais do século XX e, aos 84 anos, tem uma certeza inabalável. A injustiça social e o desrespeito aos direitos humanos continuam a ser uma chaga vergonhosa no país. Seu engajamento por um Brasil mais justo é o fio condutor de um saboroso painel do século passado, que resultou no livro Minhas Memórias (Martins Fontes; 272 páginas; 34,80 reais), lançado na semana passada. Bicudo acompanhou com interesse, apesar da pouca idade, a agitação dos anos 20, a Revolução de 1930 e, já adolescente, a instauração do Estado Novo. Na faculdade, meteu-se nas manifestações contra a ditadura Vargas. E não parou mais.
Sua trajetória é feita de grandes momentos, como o enfrentamento do Esquadrão da Morte, nos anos 70, e a defesa de dom Paulo Evaristo Arns, arcebispo de São Paulo, acusado de calúnia pelas denúncias de prisões e torturas durante o regime militar publicadas no livro Brasil: Nunca Mais. Mas é feita também de uma militância sem alarde e eficiente em prol dos direitos humanos. Nos anos 40 e 50, no interior de São Paulo, dedicou-se à defesa dos trabalhadores, contra o regime de exploração semi-escravo em que viviam. Em um episódio pitoresco, o jurista – católico fervoroso – ficou ao lado das prostitutas contra um grupo que queria desalojá-las em nome dos bons costumes. Sua alegação: aqueles senhores eram os primeiros a se utilizar dos serviços das moças, inclusive na iniciação sexual dos filhos.
Bicudo participou da resistência à ditadura militar e dos movimentos pela volta da democracia no Brasil. Engajou-se na campanha das diretas e foi um dos primeiros a se filiar ao PT. Foi também uma das primeiras vozes a se levantar contra os desvios que resultaram nos descalabros do governo Lula. Sua indignação diante da injustiça e da corrupção não tem limites. A leitura de seu livro, além de agradável, pode ser útil a quem acredita em dias melhores para o Brasil.