Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, novembro 09, 2006

Assim não vai crescer Carlos Alberto Sardenberg

Assim não vai crescer

Artigo -
O Globo
9/11/2006

A China está crescendo no ritmo 10% ao ano com inflação de 1,5%, também anual. A Coréia do Sul cresce 4,6% com inflação de 2%. Chile, 4,5% com 2,8%. Polônia, 5,5% com 1,6%.

Portanto, não é preciso ser tolerante com a inflação para acelerar o crescimento. Aí estão exemplos de países emergentes, de diferentes regiões, que crescem mais do que o Brasil, com inflação menor que a nossa.

Se a oposição entre desenvolvimentistas e monetaristas significa que os primeiros privilegiam o crescimento, enquanto os segundos priorizam a estabilidade da moeda, então aqueles quatro países são as duas coisas ao mesmo tempo.

Mas há uma combinação diferente entre os principais emergentes, o grupo de 27 nações, Brasil incluído, cujo desempenho é acompanhado pela revista "The Economist". Todos os outros 26, sem exceção, crescem mais que o Brasil, mas 13 deles com inflação maior que a brasileira. É o caso da Índia, com Produto Interno Bruto crescendo na faixa de 9%, com inflação de 6,8%. Ou da Rússia, expansão de 7,4% com preços a 9,6%.

Essas seriam as economias mais desenvolvimentistas. Mas a divisão fica meio a meio. Cem por cento crescendo mais que o Brasil, metade com inflação menor, a outra metade, maior.

E daí?

Daí que muita gente pode ser tentada a concluir que o debate empatou. Pode-se crescer mais (acima de 4% ao ano) com inflação maior ou menor. Como não é fácil nem indolor combater a inflação, vem a tentação dita desenvolvimentista: vamos jogar os juros lá embaixo, já, aumentar o investimento público e tocar pau no crescimento, deixando que a inflação suba alguns pontos.

Conhecendo o histórico brasileiro, é mais provável que essa política resulte em inflação alta com crescimento baixo, combinação que já se praticou por aqui em muitas ocasiões. Por outro lado, as economias mais saudáveis são reconhecidamente aquelas que combinam desenvolvimento e estabilidade monetária. Os emergentes com inflação mais alta estão lutando para derrubá-la.

Ou seja, no momento em que o Brasil conseguiu a façanha de matar a inflação, parece razoável imaginar que o passo seguinte seja acelerar o crescimento sem sacrificar o êxito obtido.

Convém, portanto, observar outras diferenças entre o Brasil e os demais 26 emergentes, além do quesito inflação. Dívida pública, por exemplo. A do Brasil equivale a 50% do PIB. Nos demais, não passa de 30%.

No Brasil, a carga tributária se aproxima dos 38% do PIB, muita alta, para custear gastos públicos também elevados. Nos outros, a carga de impostos não passa dos 25%. A despesa brasileira com Previdência é de 12% do PIB. Entre os demais emergentes, o que gasta mais nesse quesito é o México, com 6%.

Não estaria aí a variável-chave?

Na verdade, todos os emergentes resolveram ou estão resolvendo bem a questão da estabilidade da moeda. Dos 27, apenas oito ainda têm inflação acima de 6% ao ano, a maioria em processo de redução.

Praticamente todos os países, beneficiados pela extraordinária expansão da economia mundial, aumentaram suas exportações, acumularam reservas e pagaram boa parte de suas dívidas externas.

No que o Brasil é bem diferente? No tamanho do setor público, incluídos impostos, gastos e dívida.

Além disso, no nível microeconômico, o Brasil apresenta um ambiente de negócios quase hostil ao empreendimento privado. No estudo do Banco Mundial que avalia isso - Fazendo Negócios -, o Brasil ficou no 121º lugar. Entre os principais emergentes, apenas a Índia está atrás (134º).

Não seria isso, o tamanho desproporcional do setor público e o ambiente desfavorável que explicariam o baixo nível de investimento e, pois, de crescimento?

O presidente Lula está empenhado, para seu segundo mandato, em encontrar o dinheiro necessário para turbinar o crescimento. Segundo um amplo entendimento entre os economistas, para crescer na faixa de 5% ao ano, por um período longo, o Brasil precisaria ter investimentos equivalentes a 25% do PIB. Faz hoje 20%, sendo, aproximadamente, 18% do setor privado e apenas 2% do público. Faltam, portanto, cinco pontos percentuais.

Claramente, é preciso aumentar o investimento público. Mas sabe quanto representam, em dinheiro, aqueles 5 pontos? Nada menos que R$100 bilhões. Para comparar: é mais ou menos o tamanho da folha de salários do governo federal; e só um pouco menos de tudo o que já gasta com custeio e capital.

Ou seja, não tem esse dinheiro no governo. Só haverá esse investimento com abertura ao setor privado e redução do gasto público em custeio, pessoal e previdência.

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