A oposição aprova novo benefício
do Bolsa Família só para jogar casca
de banana no caminho do governo
Alexandre Oltramari
No exercício da admirável arte de jogar casca de banana no caminho do adversário, o Partido dos Trabalhadores tornou-se um virtuose. Em seus 22 anos de oposição, o PT especializou-se em jogar casca dos mais variados tipos de banana. Quando propunham um aumento estratosférico no valor do salário mínimo, os petistas, na prática, estavam jogando no caminho do governo algumas cascas de banana-do-brejo – um tipo de banana que identifica o local onde iriam parar as contas públicas caso o aumento fosse concedido. Em certa ocasião, durante o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, os petistas propuseram a criação de um abono natalino de 200 reais, a ser concedido a todos os trabalhadores que ganhassem até cinco salários mínimos. Era casca de banana-pedra. Na semana passada, a oposição deu uma demonstração de que também é capaz de jogar cascas de banana: aprovou a concessão de uma espécie de décimo terceiro salário aos 44 milhões de brasileiros beneficiados pelo Bolsa Família. A proposta, claro, é uma banana de dinamite.
O projeto aprovado no Senado – por unanimidade! – brotou do ideário bananeiro do senador Efraim Morais, do PFL da Paraíba. "A aprovação do projeto não teve o sentido de constranger o governo, porque o apresentei antes das eleições, para que o presidente, qualquer que fosse ele, pudesse cumpri-lo. Se o senhor Geraldo Alckmin tivesse vencido as eleições, eu seria governo e, mesmo assim, não retiraria o projeto da pauta", disse Efraim, na última semana. O projeto, de fato, foi apresentado ao Senado em setembro passado, dias antes das eleições. O interessante é que a oposição – com destaque para o PFL de Efraim Morais – sempre achou o Bolsa Família um programa assistencialista e eleitoreiro. Seus próceres já o classificaram como uma "esmola eleitoreira". Ninguém sabe exatamente o que levou o pefelista a sugerir um melhoramento tão substancial de renda no bojo de um programa que seu partido condena radicalmente. A questão que intriga o Senado, neste momento, é a seguinte: do ideário bananeiro do senador Efraim Morais só saem idéias do tamanho de uma banana-nanica?
A oposição já havia jogado cascas de outras bananas no caminho do governo, como costuma acontecer em qualquer democracia, em qualquer país, até mesmo nos que não podem ser chamados de repúblicas de bananas. Macaqueando a oposição petista, os pefelistas jogaram algumas cascas de banana-de-macaco. No ano passado, a oposição elevou seu próprio nível bananeiro quando o Senado aprovou a proposta do senador Antonio Carlos Magalhães, do PFL da Bahia, de aumento do salário mínimo para 385 reais. Era casca de banana-ouro. A proposta explodiria as contas públicas ao produzir um rombo de 16,4 bilhões de reais nos cofres do governo. Seu preço seria forçar o presidente Lula a vetar um aumento substancial do salário mínimo. Mas a Câmara dos Deputados, empenhada em recolher as cascas de banana do caminho, não aprovou o aumento, e livrou o presidente do constrangimento do veto. A diferença agora é que, com um benefício dado pela oposição num programa do qual é crítica, a casca de banana vai na contramão do que pensa a própria oposição. É o que se pode chamar de casca de banana-anã.
Como foi aprovada por unanimidade, a casca de banana de agora ajuda a mostrar que a demagogia é algo realmente ilimitado – afeta indistintamente governistas e oposicionistas. Onde estavam os senadores aliados do governo para rejeitar a bananada? Escondidos, à sombra de alguma bananeira. E não apareceu ninguém, do governo ou da oposição, para dizer que um programa assistencial tem necessariamente um caráter de emergência, de socorro, e não deve portanto ser confundido com salário. Para os beneficiados, seria como fazer um negócio da bananeira-da-china, mas isso não é sustentável nem desejável. As contas públicas virariam um bananal.
É certo que o governo não gostou de perder a votação no Senado, mas também não ficou muito preocupado. O Palácio do Planalto confia que a Câmara voltará a exercer seu papel de recolhedora de cascas de banana, rejeitando a concessão do benefício extra do Bolsa Família. Se isso não acontecer, a medida será contestada nos tribunais, já que prevê a concessão de uma ajuda cujo custo chegará a cerca de 700 milhões de reais – e, pela lei, o Congresso não pode criar despesas sem apontar a fonte de receita, coisa que não aconteceu nesse caso. "A função da oposição, em qualquer lugar, é dificultar a vida do governo. Mas isso pode ser feito com maior ou menor civilidade. O caso do décimo terceiro para o Bolsa Família parece se encaixar na segunda opção", diz o cientista político Rogério Schmitt, da Tendências Consultoria. Se se mantiver a brincadeirinha, o risco é a oposição acabar colhendo cascas de bananeirinha-zebra.
Em tempo: todos os tipos de banana e de bananeira mencionados no texto desta reportagem são reais, assim como as excelentes idéias dos políticos brasileiros.