Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 11, 2006

A FESTA DO ORÇAMENTO

A FESTA DO ORÇAMENTO
Editorial em O Estado de São Paulo

A política de muita gastança e pouco investimento deverá nortear mais um Orçamento-Geral da União, o de 2007, atualmente em exame no Congresso Nacional. O governo resolveu abandonar a proposta de um redutor de gastos correntes para o próximo ano, segundo informaram o relator do projeto orçamentário, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), e o presidente da Comissão Mista de Orçamento, deputado Gilmar Machado (PT-MG). Depois de comprometer muitos bilhões com bondades eleitorais, o governo teria dificuldade para executar em 2007 uma programação financeira mais austera. Mantida essa orientação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá um começo de segundo mandato pouco promissor, criando obstáculos para uma redução segura da taxa de juros.
A proposta de redutor está inscrita no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), enviada ao Congresso no primeiro semestre e ainda não aprovada. A idéia era, a partir de 2007, cortar todo ano do gasto corrente - a despesa total menos o investimento e o serviço da dívida - uma soma equivalente a 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB) de 2006. Para isso, segundo estimativa do relator Valdir Raupp, seria preciso podar da proposta orçamentária despesas no valor de R$ 5,2 bilhões.
Ao incluir esse dispositivo no projeto da LDO, o Executivo assumiu um compromisso incompatível com a distribuição eleitoral de benefícios. Enquanto o projeto ficava empacado no Congresso, o presidente-candidato ia concedendo benesses variadas a funcionários, aposentados e a outros grupos com interesses corporativos. O mais ostensivo desses benefícios, uma coleção de revisões salariais para os servidores, custará no próximo ano R$ 13,2 bilhões.
A solução mais simples para o governo será a eliminação daquele dispositivo da LDO. Rompido esse efêmero compromisso de austeridade, os parlamentares poderão rapidamente votar o projeto do orçamento.
Também o aumento do salário mínimo será mais generoso que aquele indicado na LDO. A proposta previa um reajuste correspondente à inflação de abril de 2006 a março de 2007, acrescido da variação real do PIB per capita - uma forma de incorporar na remuneração o ganho médio de produtividade. Pelas avaliações atuais do desempenho econômico, isso resultaria num valor de até R$ 368. Mas o salário-base previsto na proposta orçamentária corresponde a R$ 375. A diferença poderá resultar num gasto previdenciário adicional de R$ 1,2 bilhão, na melhor hipótese. Isso sem falar nas pressões das centrais sindicais por um mínimo de R$ 420,00.
Mas não foi só o Executivo que decidiu afrouxar a programação financeira de 2007. A proposta orçamentária já foi aliviada, por pressão de líderes partidários, de outra restrição a bondades com dinheiro público. O projeto original proibia a destinação de dinheiro a entidades privadas, se do seu quadro de controladores, dirigentes ou empregados constarem, ou tiverem constado nos últimos cinco anos, membros de Poderes da União ou seus cônjuges, companheiros ou parentes até terceiro grau. Com a modificação, a lista fica reduzida a membros dos Poderes, cônjuges e filhos. Segundo a justificativa apresentada, a restrição original prejudicaria Santas Casas e entidades filantrópicas ligadas à rede hospitalar.
Se essa fosse a única preocupação, não bastaria acrescentar, simplesmente, uma ressalva com a enumeração desses casos?
Com essas e outras mudanças, parlamentares e governo preparam uma festa orçamentária pautada pelo discurso presidencial de mais crescimento e menos austeridade - como se a expansão econômica, a longo prazo, não dependesse de uma política fiscal mais sustentável.
Esse discurso foi retomado na quarta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Em vez de discutir onde vamos cortar, temos de discutir onde crescer, como crescer e como fazer justiça social neste país.”
Reeleito, o presidente parece disposto a continuar no palanque. A irresponsabilidade fiscal pode até proporcionar algum crescimento, a curto prazo, mas ao custo de maior pressão inflacionária e de novos desajustes na economia. Esse filme é conhecido e não tem final feliz. É preciso mudar o roteiro, e com urgência.

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