Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

VEJA Carta ao leitor

A arte da cegueira

Dado um problema real de grandes proporções, o que faz o Brasil? Corre a se aferrar a alguma solução simplista, mágica, doutrinária – e inútil. Há duas semanas, o menino João Hélio, de 6 anos, foi supliciado por bandidos em plena via pública no Rio de Janeiro. Ele teve seu corpo, preso pelo cinto de segurança, ainda com vida nos primeiros 100 metros, arrastado por um carro. Ele foi desmembrado aos poucos. Quando o cortejo monstruoso parou, o que restou do pequeno João Hélio era um monte de carne disforme. A cabeça se esfarinhou no trajeto, muito provavelmente esmagada pela roda do carro, pelo choque com as lombadas e pelo atrito com o asfalto. Qual a reação oficial predominante? Ah... é preciso diminuir a maioridade penal.

O quê? Isso mesmo. O país passou a semana inteira discutindo a idéia de permitir que menores possam ser condenados, talvez aos 16 anos... Isso porque um dos cinco responsáveis pelo martírio medieval de João Hélio era menor de idade. Os luminares da República se engalfinharam diante das câmeras de televisão debatendo a solução simplista, mágica e doutrinária – e ineficaz – de baixar a idade com que os brasileiros podem ser mandados para um presídio. Ora, o que está em questão não é isso. É a impunidade, seja qual for a idade do criminoso. O problema é a impunidade e tudo o que ela significa, da corrupção policial à sobrecarga de trabalho da Justiça.

Impunidade não acaba por mágica.

É vital escapar da armadilha do pensamento mágico no Brasil. Ele paralisa o progresso social, institucional e econômico. Outros exemplos? Basta baixar os juros que o país cresce. Os escândalos e a roubalheira dominam Brasília? Basta uma reforma política e tudo se resolve. Países com leis suíças e realidades africanas existem às pencas. Países onde as leis são cumpridas são raros e felizes. O Brasil precisa é de políticos honestos, policiais que cumpram seu dever, juízes que prendam bandidos e não os soltem, de presídios que, como mostra uma reportagem desta edição, não sejam "centrais de apoio" ao crime organizado – e de uma constante mobilização pública para que isso tudo possa se realizar.

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