Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

TCU cobra Presidência por gasto com bebida no cartão



folha

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em auditoria sobre o uso de cartões da Presidência, aprovada em sessão sigilosa, o TCU (Tribunal de Contas da União) decidiu cobrar explicações para a compra de bebidas alcoólicas e alimentos "refinados" para a Granja do Torto e o Palácio da Alvorada -residências oficiais do presidente.
Reunidos na denominação "gêneros de alimentação", esses itens consumiram pouco mais de R$ 608 mil no período de um ano e meio (2004 e primeiro semestre de 2005) e chamaram a atenção dos auditores do tribunal que analisaram os gastos -e sobretudo os saques em dinheiro- com os cartões, protegidos por sigilo.
No relatório, os auditores alegam que os gastos "seriam questionáveis", e que faltam limites claros para despesas com eventos sociais nas residências oficiais: "Uma análise exaustiva ficou prejudicada em decorrência do prazo e da extensão dos trabalhos, da subjetividade dos critérios envolvidos (que tipo de bebida é apropriada para cada tipo de evento e em que quantidade, por exemplo), e da ausência, nos autos, de informações detalhadas sobre a finalidade das aquisições".
A auditoria encontrou irregularidades, como o pagamento por serviços não prestados com aluguel de carros e a compra supostamente urgente de uniformes para funcionários da Granja do Torto por R$ 62 mil. Mas o trabalho não apresentou conclusões sobre a existência de notas frias entre os documentos apresentados para justificar os gastos e saques com cartões da Presidência.
O relatório aprovado pelo tribunal determina a abertura de nova auditoria para analisar as notas fiscais e rastrear um volume superior a R$ 3 milhões de despesas feitas no primeiro semestre de mandato de Lula, que ficaram de fora da análise iniciada em agosto do ano passado.
Entre a posse de Lula e o início da investigação do TCU, quase R$ 20 milhões haviam sido gastos com cartões da Presidência, sobretudo por meio de saques. Em um único mês, um dos portadores de cartões da Presidência sacou R$ 78 mil em dinheiro vivo. Em 2004, os saques representaram 60% dos gastos com cartões. À época, o tribunal já criticava a falta de transparência nos gastos.
No Planalto, um número restrito de funcionários, menos de 50, chamados de "ecônomos", usam os cartões em nome do presidente e demais autoridades.
Uma regra baixada em dezembro de 2003 pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência cercou de sigilo detalhes dos gastos com cartões, a pretexto de zelo com a segurança do presidente Lula e de sua família.
No ano passado, o envio das informações ao TCU foi precedido por uma visita da ministra Dilma Rousseff ao tribunal e um pedido formal para que tivessem tratamento sigiloso os documentos referentes às despesas com as chamadas "peculiaridades" da Presidência, que corresponderam a 93% do gasto total com os cartões.
Em conseqüência do pedido, a maior parte do relatório aprovado anteontem continua em sigilo, como os nomes dos fornecedores e o detalhamento das despesas. A parte liberada do texto mostra que, no conjunto, a maior parte dos gastos está associada a viagens do presidente e à segurança de seus familiares - o correspondente a R$ 6 milhões em 2004.
Como parte da segurança dos filhos de Lula, os cartões pagaram o aluguel de carros em Florianópolis (SC) e São Bernardo do Campo (SP). Ao analisar as contas, o TCU constatou, por exemplo, que o valor pago entre janeiro de 2004 e março de 2005 pela locação seria suficiente para comprar um automóvel similar ao locado. Embora os carros fossem alugados por períodos sucessivos de 24 horas, o pagamento era feito por dia, com custo mais elevado.
"As análises feitas deixam evidente que o regime e o valor das locações contratados até o mês de outubro de 2004 eram desvantajosos para o erário", escreveram os auditores, que notaram a redução desse custo a partir do final de 2004, mediante a compra de mais 40 automóveis para a segurança.
O TCU estranhou as justificativas do Planalto para compra de uniformes, por R$ 62.294, em janeiro de 2004. A pressa em "atender a eventos em março" foi o argumento para dispensar a licitação e usar o cartão. Nesse mês, Lula se mudou com a família para a Granja do Torto, liberando o Palácio da Alvorada para reforma, ainda não concluída.



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