Enquanto a oposição berra para dentro, Lula posa de administrador para fora
Não é necessário recorrer aos catedráticos no tema, o presidente Luiz Inácio da Silva mesmo se encarregou de explicar os resultados das últimas pesquisas. "Quem quiser brigar que brigue, mas me deixem trabalhar", disse Lula, durante o lançamento da pedra fundamental da Universidade do Vale do São Francisco, mais um evento de sua sensacional, não obstante temporã, obra de governo.
Resumiu naquela frase as razões da subida de suas intenções de voto e da queda nos índices de preferência da oposição: enquanto o PSDB se comportava como o PT velho de guerra, berrando para dentro, ele foi à luta para entrar em entendimento direto com o eleitor, tratando de mostrar serviço para fora, fazendo pose de gerente, com a energia dos estreantes no emprego.
Se a qualidade da construção é questionável e a edificação é oca, é outro problema a ser discutido mais à frente, quando o contraditório da campanha eleitoral entrar em cena. No tocante à pesquisa, no momento o que conta é - com perdão do lugar-comum - ganhar lance a lance a batalha da comunicação.
E nesta, francamente, o PSDB está perdendo. Durante o período em que as pesquisas foram feitas, o partido só fez falar de si. É ser posta esta obviedade à mesa para surgir logo alguém para argumentar que o interesse nas chamadas "futricas" é alimentado pela imprensa, pois aos jornalistas pouco importam as questões de fundo, os debates de conteúdo, a discussão sobre o essencial.
É daquelas meias-verdades que, ditas com a convicção e um certo pesar estudado, parecem desvendar o enigma da criação do universo. Mas traduzem, no máximo, a incapacidade do reclamante de fazer-se atraente na difusão de suas idéias e inapto para o jogo das boas aparências ao qual Lula se dedica com afinco e solta desenvoltura à prova de qualquer contestação.
A elevação dos índices de desempenho pessoal sem a correspondente subida na avaliação governamental evidencia a reação do eleitorado a uma atuação de um personagem. Agradável, claro, aos olhos de quem espera dos governantes trabalho e providência.
A oposição largou o eleitor à matroca e foi cuidar da própria vida, esquecendo-se do antigo lema segundo o qual na política não há vácuo nem cena vazia. A ocupação dos espaços funciona em sistema de substituição automática.
No auge da crise, a população fez a sua parte, manifestou decepção e insatisfação. Os representantes de outras correntes de expressão política, no lugar de se apresentarem como capazes de herdar o patrimônio, naquela altura de ninguém, preferiram acreditar que a desqualificação do outro cairia no colo deles na forma de qualificação. E por gravidade, sem esforço.
Resultado: não seguraram a vantagem. Dizer que a pesquisa é o retrato do momento não significa coisa alguma. Só que a imagem oposicionista captada no instantâneo é péssima.
Ao PT conviria também uma certa contenção na retirada do salto alto do armário porque agora o eleitor está dizendo que, na falta de opção, poderá ficar com Lula mesmo, pois o PSDB não consegue nem administrar a escolha do candidato, que dirá o País.
Mas, a depender do comportamento do presidente na campanha e do grau de exacerbação que a recuperação da popularidade produzirá numa alma vocacionada para a falta de autocrítica, os votos podem correr para qualquer lado: voltar ao PSDB, encontrar um porto alternativo ou até mesmo seguir o rumo do protesto à deriva, o voto nulo.
Este será o pior dos mundos, a ser evitado a todo custo, pois representa um retrocesso de 30 anos nas relações entre a política e a sociedade. Em termos de atraso proporcionado pelo atual governo, já basta a consolidada aceitação do uso de caixa 2, da prevaricação em nome da causa travestida de equívoco inerente à natureza humana, do salvo-conduto à fisiologia sob a égide do "todo mundo faz" e do emprego de falsários no departamento de produção de documentos oficiais do partido.
Adaptação
Lula a cada dia adapta suas declarações antigas às circunstâncias novas.
Agora que recuperou a esperança de reconquistar a classe média, lamenta não ter feito universidade, a fim de simular apreço pela qualificação educacional.
Deixa sem discurso os expoentes da cultura nacional que, na campanha passada, o defenderam classificando como preconceito qualquer referência ao assunto.
Tranco
Não é coincidência. Geraldo Alckmin reuniu-se com a cúpula do PSDB e, ato contínuo, parou de defender a realização de prévias para escolher o candidato do partido, deixou de atacar o adversário interno e voltou suas críticas para Lula.
Há nisso duas evidências: foi avisado para ir devagar com o andor, mas também recebeu sinal de que ainda há esperança. Tênue, mas há.
Agora, se resolver explodir todas as pontes e José Serra porventura desistir em virtude da falta de unidade no partido, pode retornar à cena a opção Aécio Neves.