O Estado de S. Paulo |
24/2/2006 |
A sensação de sucesso e onipotência tem sido sempre má conselheira do presidente O presidente Luiz Inácio da Silva não precisa de pesquisas favoráveis nem do entusiasmo que vem de fora para se sentir o mais bem-aventurado dos mortais por ter conseguido "furar o cerco" das elites e chegar à Presidência. Isso demonstrou à exaustão (da paciência alheia) quando, no auge da crise e imerso no vexame, continuava dando sinais de onipotência, confiança na festejada intuição que supostamente o levou da fábrica ao palácio e apresentava arremedos de escusas por dever de ofício sem a mais pálida convicção. Se isso é verdade, é fato comprovado também que ao menor sinal de melhora da maré Lula se sente de novo na companhia da boa sorte, se deixa inebriar pelo sucesso, perde de vez o pé da realidade, entra numa espiral de delírios, torna-se arrogante e faz bobagem. Parte para a briga de peito aberto e guarda baixa, sem medir a força disponível em seu capital, fazendo pouco da capacidade de reação do outro, seja ele adversário político ou mero espectador não-engajado. Parece não ter entendido o que o fez ganhar a eleição. Não assimilou a fundo a lição de Duda Mendonça sobre a utilidade de fazer cara de santo, falar o menos possível, pregar a paz, distribuir amor e, sobretudo, não tripudiar, muito menos fazer pose de valente. Enquanto não fez isso, perdeu. Quando ouviu o marqueteiro, passou uma campanha só assistindo aos oponentes se digladiarem, aguardando a hora de entrar em cena, o que o fez praticamente mudo, dando muito pouca margem ao contra-ataque. Ou seus novos conselheiros não lhe renovaram a receita, ou Lula resolveu ignorar - em nome da "intuição" - os avisos óbvios à simples observação de que seu grande patrimônio é a vitimização. No figurino de nordestino pobre, ignorante - porém sagaz -, combatido pelos "ricos" malvados e ressentidos, ávidos por espezinhá-lo com sua superioridade educacional, Luiz Inácio foi imbatível. Intimidava as consciências pesadas de um lado e, de outro, impregnava nos desvalidos a ilusão de que eram iguais e, nesse diapasão de fraternidade, seriam levados junto com ele ao paraíso. A realidade mostrou-se mais dura, no máximo ficamos todos no mesmo lugar ouvindo o PT exaltar o fato de não ter levado o País barranco abaixo, graças à continuidade de diretrizes criadas no governo anterior e apontadas então como nefastas. Além de perseguir os acertos (sem dar o devido crédito nem lembrar que os qualificava como erros), acentuou os malfeitos ancestrais da política nacional sob o argumento de que estavam aí há muito. Assim: roubava-se, prevaricava-se, loteava-se, mentia-se e como o PT não veio para abalar as estruturas, manteve a tradição e por isso deve ser plenamente aceito, talvez até saudado, por não ter a ousadia de mudar. Neste sentido, um conservador. Mas falávamos da percepção presidencial a respeito daquilo que lhe é mais ou menos conveniente como trunfo pessoal e eleitoral. Lula contrariou o modelo adotado na campanha assim que assumiu a Presidência. Do quase mutismo passou para a loquacidade exuberante, sem freios, embalado na recepção calorosa do pós-eleição. Foi amealhando antipatias e, quando chegou a crise, já perdera muito terreno por conta dos excessos: verbais, pessoais, políticos, mentais e espirituais. Exibiu-se uma pessoa estranha, destituída de valores ou referências que não fossem as relativas à sustentação do próprio mito. Para isso valeu tudo, até afastar-se do PT e aproximar-se de novo dele ao sabor do interesse da ocasião. Durante algum tempo aceitou refrear as extravagâncias, não sem relutância. Mas, agora, senhor de si diante do que acredita ser a prova incontestável de que "estava certo" ao adotar a velha tática de vencer acusações por meio da negativa acima das evidências, volta aos braços da onipotência, imaginando-se sem paradeiro e, com isso, criando armadilhas para si. A mais recente foi admitir-se em campanha "365 dias por ano", confiante na displicência do adversário, da Justiça e - por que não dizer - da opinião pública, que ainda hesitam em dizer um alto lá a um chefe de governo confrontador da legislação vigente no País.
Ao estabelecer a data entre 12 e 15 de março para o anúncio do nome de seu candidato à Presidência, o PSDB antecipou em uma semana o calendário inicialmente previsto. Pesaram o resultado da ofensiva de Lula registrado nas pesquisas e a necessidade de dar um fim na briga interna do partido, mas pesou também o alto índice de rejeição de Anthony Garotinho (37%, seguido por Lula, com 30%). Com isso, os tucanos dispensaram-se de esperar as prévias do PMDB, marcadas para 19 de março, pois avaliam que não precisam decidir na dependência do nome pemedebista. Seja qual for, raciocinam, não representará perigo algum, pois, se ameaça à vaga do PSDB no segundo turno houver, não virá de Garotinho nem de Germano Rigotto. Na visão do partido, por enquanto e ressalvado o imponderável, a polarização com o PT está garantida. |
Entrevista:O Estado inteligente
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