A divulgação, anteontem, do resultado do Tesouro Nacional já permitia prever forte deterioração das contas públicas, com a queda no resultado primário de 5,51% para 2,56% do produto interno bruto (PIB), na comparação entre janeiro deste ano e o de 2005. Os dados da política fiscal publicados ontem pelo Banco Central confirmaram essa deterioração: o superávit primário, que havia sido de 4,34% do PIB em dezembro de 2005, recuou para 1,84% do PIB em janeiro, caindo, em números absolutos, dos R$ 5,1 bilhões de dezembro e dos R$ 11,3 bilhões de janeiro do ano passado para apenas R$ 3 bilhões no primeiro mês deste exercício.
O resultado poderia ser pior, não fossem os governos regionais (Estados e municípios) terem passado de um déficit de R$ 1,3 bilhão em dezembro para um superávit primário, no mês seguinte, de R$ 2,6 bilhões. . A responsabilidade do governo federal fica mais nítida quando se verifica que as empresas estatais federais passaram de um superávit de R$ 919 milhões em dezembro para um déficit de R$ 3,6 bilhões em janeiro.
O déficit do INSS caiu 30% em relação a dezembro, embora seja 97,6% maior do que o de janeiro de 2005.
O superávit primário, em relação ao PIB, foi o menor dos três últimos anos, enquanto o déficit nominal de 8,91% do PIB registrado nesse mesmo período ficou bem longe da sugestão do professor Antonio Delfim Netto de que era necessário zerar esse déficit.
As contas fiscais do governo central (calculadas pela variação da dívida mobiliária, isto é, "abaixo da linha", segundo a terminologia dos economistas, ao contrário da execução financeira do Tesouro, que inclui apenas o governo central e as operações contábeis) refletem a "cunha eleitoral" do governo. Em janeiro, segundo os resultados do Tesouro Nacional, os gastos do governo central foram superiores em 28,1% aos de um ano atrás (os de custeio e capital foram 40,6% maiores!).
Tudo indica o abandono da política de austeridade em prol da reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Podemos entender que, no quadro de uma inflação sob controle e de uma política monetária mais realista, era viável amenizar a austeridade nas despesas públicas. Mas seria preferível reduzir a carga tributária, preparando o terreno para um aumento do poder aquisitivo das famílias e para uma maior capacidade de investimentos das empresas. O risco de uma política irresponsável de gastos é o retorno de pressões inflacionárias, anulando-se, deste modo, os benefícios da sua contenção.
Os gastos públicos não devem ser instrumento eleitoral, pois podem produzir efeito altamente negativo, especialmente quando não acompanhados de melhora na sua qualidade.