Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 21, 2006

MERVAL PEREIRA Pólo de poder

O GLOBO

À medida que uma definição consensual parece mais difícil, a discussão no PSDB vai necessariamente mudando de enfoque, do imediatista para um panorama mais de longo prazo, no qual o objetivo não seja apenas decidir por Serra ou Alckmin como candidato à Presidência, mas escolher a melhor estratégia para que o partido não deixe de ser um pólo de poder na política nacional.

Desse ponto de vista, a vitória para o governo de São Paulo seria estrategicamente tão importante quanto a da Presidência. O que dificulta os entendimentos no momento é que a grande vitória de Alckmin é ser indicado candidato: ele não perde nada se for derrotado, tem essa vantagem natural, e ainda ganha uma dimensão nacional.

Mas em compensação, se, com a indicação à Presidência, Alckmin, que tem mais de 60% de apoio no estado, garantir a eleição do governador de São Paulo para os tucanos, o partido estará em 2010 na mesma posição de hoje, com Lula fora do páreo e o PT sem candidato à Presidência. Nessa análise, o PT vai sair da posição de pólo de poder no momento em que terminar um eventual segundo mandato de Lula, pois o verdadeiro pólo de poder é Lula, não é o PT.

A avaliação da cúpula tucana é que a vitória contra Lula nas eleições de outubro está ao alcance do partido, mas no momento é apenas uma possibilidade, não uma probabilidade. O prefeito José Serra está com muito prestígio em São Paulo, e a previsão partidária é que esse prestígio só tende a crescer. Desse ponto de vista, sua situação é boa politicamente, o que não recomendaria uma desgastante luta interna para sair candidato à Presidência. Mas se desistir agora, que parece ser seu melhor momento, Serra pode estar limitando sua carreira ao governo de São Paulo, embora em política nada seja tão definitivo assim.

O cavalo parece que está passando na sua frente encilhado, mas nem tanto, os arreios estão soltos, na metáfora de um dirigente tucano. A contrapartida de uma derrota tucana este ano, na avaliação partidária, é que o Brasil não terá nunca uma situação tão má quanto com a reeleição de Lula. A eleição de 2010 se transformaria em uma probabilidade forte para o candidato do PSDB, e existiriam dois candidatos no páreo: Serra, reeleito em 2008 na Prefeitura de São Paulo, e Aécio Neves, no final de seu segundo mandato à frente do governo de Minas.

Uma alternativa que parece menos viável, mas que pode evoluir dependendo das negociações, é Serra cortar caminho e se candidatar ao governo de São Paulo nas próximas eleições, o que, se vitorioso, o colocaria em condições políticas de pleitear a Presidência em 2010. A dúvida é que, se não conseguirem fazer acordo entre Serra e Alckmin agora, mais difícil ainda será um acordo entre Aécio e Serra, dois líderes de peso do partido disputando a mesma vaga.

Essa alternativa poderia pacificar os tucanos paulistas, mas pode também prejudicar a carreira de Serra, que já encontra dificuldades para justificar a saída da Prefeitura para concorrer à Presidência. Nesse caso, no entanto, tem o apelo partidário como explicação, e um projeto maior de país pela frente, o que, as pesquisas mostram, é aceito pela maioria do eleitorado da capital. Sair da prefeitura para tentar o governo de São Paulo poderia ser mal interpretado, como um gesto egoístico.

Todos esses aspectos serão debatidos no jantar que a “Santíssima Trindade” tucana — o ex-presidente Fernando Henrique, o presidente do partido, senador Tasso Jereissati, e o governador de Minas, Aécio Neves — terá hoje com o governador Geraldo Alckmin. Eles entendem que o governador tem como única alternativa criar constrangimentos para que Serra não se decida a deixar a prefeitura, mas entendem também que toda essa estratégia tem o limite dos interesses do partido. O governador deve saber, raciocinam alguns líderes, que se os dirigentes resolverem bancar a candidatura de José Serra, Alckmin perde na convenção em junho.

Mas o PSDB perde também, e pode ficar sem boa parte da votação de São Paulo, o que só facilitaria a vida de Lula. E como a recíproca é verdadeira, cada um sabe que só ganha com o apoio do outro. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso define o papel dos integrantes da “Santíssima Trindade” como de “facilitadores do entendimento”, e não de “decisores de uma divergência”.

A solução que dá condições ao partido de ser competitivo de cara é Serra candidato a presidente, com o apoio do Alckmin, que sairia para o Senado, ou ficaria no governo até o final para ajudar a eleição do governador. Essa armação de candidaturas foi feita depois de análises de pesquisas quantitativas, e de diversos cruzamentos que, segundo o cientista político Antonio Lavareda, respondem quase que por uma pesquisa qualitativa e mostraram que 60% dos eleitores do partido preferem Serra como candidato.

Mas essa estratégia representa um “tudo ou nada”, isto é, o PSDB poderia, no fim das contas, perder as posições que tem hoje em São Paulo e ainda perder a Presidência para o PT. “Pode ser um desastre amanhã”, resume um dirigente tucano. A ampliação das consultas, reivindicada por setores do partido que o governador Marconi Perillo, de Goiás, vocaliza, já está sendo feita. O governador Aécio Neves foi o encarregado de ouvir os governadores, e o senador Tasso Jereissati está ouvindo as bancadas.

A irritação do governador de Goiás, que apóia Alckmin, tem por base o resultado da votação para a liderança do PSDB na Câmara. O vencedor, deputado Jutahy Junior, ligado a Serra, teria oferecido lugar em comissões a tucanos de Goiás e Pará. Seriam sete deputados que trocaram de lado, contra a orientação de Perilo e do governador Jatene, do Pará, no que teria sido um jogo bruto do grupo de Serra.

Antes que esses desentendimentos impeçam uma solução de consenso, e que se repita a situação de 2002, quando Serra já saiu derrotado pela divisão da base governista, a cúpula do partido espera nessa conversa de hoje com Alckmin encontrar caminhos para superar o impasse.

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